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Eucaliptos invadiram ilegalmente zona de sobreiros

A lei proíbe mas proprietário tem licença passada pela Câmara da Chamusca

Um produtor florestal de Ulme, Chamusca, decidiu plantar eucaliptos num terreno onde, antes dos incêndios de 2003, existia montado de sobro. Uma reflorestação ilegal à luz da lei mas para a qual a câmara passou licença.

A lei 169/2001 é bem explícita: em povoamentos de sobreiro ou azinheira não são permitidas conversões. E o artigo 4 do mesmo decreto-lei diz ainda que ficam vedadas por um período de 25 anos quaisquer alterações do uso do solo em áreas ocupadas por povoamentos de sobreiro ou azinheira, nomeadamente as que tenham sido atingidas por incêndio.Apesar do imperativo legal há, na charneca ribatejana, junto à vila da Chamusca, quase nove hectares de eucaliptos plantados num terreno que antes dos incêndios de 2003 era composto por sobreiros e azinheiras.O referido terreno, denominado Casal dos Coelhos, pertence à empresa agrícola Luís Filipe M. F. G. Coutinho, Herdeiros, sediada em Ulme. Joaquim Coutinho, um dos representantes da sociedade agrícola, confirmou a O MIRANTE a plantação de eucalipto mas escudou-se na Câmara da Chamusca. “Plantei eucaliptos porque tive autorização da câmara para o fazer. Tenho licença passada pela autarquia”, refere o empresário agrícola, escusando-se a fazer qualquer comentário sobre o facto de ter passado por cima da legislação actualmente em vigor.A licença a que se refere Joaquim Coutinho foi efectivamente passada pela câmara em 27 de Outubro do ano passado, depois de ter sido apreciada e aprovada por unanimidade – “tendo em conta a importância da acção para a reposição da capacidade produtiva do concelho, grandemente afectada pelos fogos de 2003” -, na reunião do executivo de 19 do mesmo mês.O presidente da Câmara da Chamusca, Sérgio Carrinho (CDU), confirmou ao nosso jornal a emissão da licença, referindo que o terreno em causa não tem condicionantes em termos de reserva agrícola nacional (RAN) e reserva ecológica nacional (REN), sendo considerado como terreno indiferenciado. “Não era o que chamamos de terreno organizado, já que antes dos incêndios de 2003 havia ali sobreiros e azinheiras mas também alguns eucaliptos”, refere Sérgio Carrinho, adiantando que a licença foi passada depois de um parecer favorável da Comissão Regional de Reflorestação. Uma entidade da qual não foi possível obter qualquer comentário sobre este assunto.De qualquer modo, como refere o decreto-lei 169/2001 no seu artigo 7, as disposições contidas no diploma de protecção do sobro e azinho “prevalecem sobre os regulamentos ou quaisquer normas constantes de instrumentos de gestão territorial”.Isso mesmo confirma o responsável pelo Núcleo Regional de Santarém da Direcção Geral dos Recursos Florestais. Em declarações ao nosso jornal, Jorge Gonçalves confirma não ter havido nenhum pedido de reconversão de espécie florestal no núcleo. “E isso teria de acontecer, já que só o director geral dos recursos florestais pode aprovar ou não qualquer reconversão”.Jorge Gonçalves refere ainda ter conhecimento de que algumas câmaras passam licenças com base em deliberações das respectivas assembleias municipais, que votaram taxas de arborização locais. “Essas licenças e taxas municipais não têm base legal, sendo apenas fonte de receita para os municípios”.“A plantação em causa está ilegal e é passível de processo de contra-ordenação”, refere o engenheiro, adiantando que ainda não terá sido fiscalizada pelos serviços florestais competentes. Uma multa que, de acordo com a legislação em vigor, pode ir de 50 euros a 150 mil euros.O presidente da Câmara da Chamusca refere que a sua autarquia tudo tem feito, dentro da legalidade, para que o tecido empresarial do concelho consiga repor a mancha florestal existente antes dos incêndios que devastaram milhares e milhares de hectares no Verão quente de 2003.Sérgio Carrinho refere que o executivo camarário tem agido de boa fé mas admite que possa haver quem se aproveite desse facto. “Se se provar que a câmara errou, irá com certeza rectificar o seu erro”.O maior problema, que, segundo uma fonte ligada ao processo poderá degenerar em fortes batalhas jurídicas, deve-se à forma como está redigido o artigo 4 da lei 169/2001.O referido artigo fala na proibição de quaisquer alterações do uso do solo em áreas de coberto de sobro e azinho, mas a utilização da denominação “uso do solo” e não “ocupação do solo”, faz com que possa haver interpretação diferente àquela que o legislador quis dar.“Em termos de planos directores municipais (PDM), alteração de uso de solos tem a ver com a passagem de terrenos agrícolas a florestais, por exemplo. Tem a ver com a característica do solo e não no que ali está plantado”.De acordo com a mesma fonte, alguns produtores poderão aproveitar-se desta situação, “interpretando” a lei conforme o seu interesse e conveniência.Margarida Cabeleira

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