De menino pobre a dono de um império
A história de vida de Pedro Choy, o rosto da acupunctura em Portugal
Veio do nada. Dormia numa casa onde chovia como na rua. Começou a trabalhar na vindima aos 13 anos. Pedro Choy, o menino que teve uma infância de pobreza em Almeirim, tem hoje um império na área da medicina alternativa.
Até há pouco tempo os pais desconheciam que tinha arriscado a vida a proteger individualidades em várias partes do mundo. Uma actividade que manteve secreta e que foi a bóia que o salvou de se atolar num pântano de pobreza. Pedro Choy foi servente de pedreiro, trabalhou no campo, passou dificuldades e hoje é o maior empresário nacional na área da medicina tradicional chinesa. A actividade de guarda-costas é uma coisa de que não gosta de falar. “Não é uma profissão de que me orgulhe”, diz o médico de olhar triste. Não esconde que, na altura, foi a melhor alternativa para ganhar dinheiro e fazer o curso de medicina tradicional chinesa na universidade de Marselha (França), na década de 80. “Orgulho-me sim de ter trabalhado no campo e nas obras, onde aprendi muito”, confessa.Os olhos amendoados brilham quando fala da sua infância em Almeirim, onde viveu até aos 17 anos. Altura em que foi para Coimbra estudar medicina. No segundo ano percebeu que não era aquilo que queria: tratar as pessoas como máquinas que tinham peças avariadas. Ainda chegou ao quarto ano da licenciatura. Ainda tem esperança de a acabar um dia. Filho de pai português, de Santarém, e mãe chinesa, da província de Cantão, Pedro Choy foi o segundo rapaz que nasceu de uma relação de amor que começou em Macau. Foi para Almeirim, onde nasceram mais dois irmãos (uma rapaz e uma rapariga) com poucos meses. Lembra-se que ia para a saída da cidade pedir boleia com 33 centavos dentro do bolso, que era o preço do bilhete de autocarro para Santarém. Ia poupando esse dinheiro que usava para comprar livros. Começou a trabalhar com 13 anos. Nas férias fazia a vindima, apanhava tomate. Fazia tudo o que podia para arranjar dinheiro porque o pai tinha um modesto ordenado de militar e a mãe não trabalhava porque não conseguia falar português. E tinha que tomar conta de quatro filhos. Não passava fome, mas, revela, a qualidade alimentar não era a melhor. “Das famílias pobres de Almeirim, estávamos entre as mais pobres”, lembra. Recorda que partilhava com um dos irmãos um espaço da cozinha que servia de quarto e onde chovia como na rua. Para não ficarem ensopados tinham que dormir debaixo de plásticos. Mais tarde a família construiu com as próprias mãos uma outra residência, que, apesar de acanhada, já tinha casa de banho e melhores condições sanitárias. O irmão mais velho, José João, esteve um ano sem ir estudar para ajudar nas obras. No tempo em que estudou em Coimbra deu serventia na construção civil. Mas os horários não eram compatíveis com as aulas. Foi porteiro de discotecas. Não que a sua estatura metesse medo. Mas na altura estavam na moda os filmes de artes marciais de Bruce Lee e como tinha cara achinesada “metia respeito”. Depois foi professor de artes marciais, que aprendia com a comunidade oriental que residia em Portugal. No seu gabinete na clínica de Salvaterra de Magos, onde reside actualmente, senta-se humildemente para nos contar a sua vida. Sem poses de gente importante. Usa uma gravata azul com caracteres chineses. É a sua ligação ao Oriente. Sente-se um homem de duas pátrias. “A infância só foi pobre em recursos económicos, porque houve muita afectividade. Éramos felizes e tínhamos a esperança de um dia atingir um estatuto social mais alto”. Pedro Choy, nascido em 1960, é hoje o rosto da acupunctura em Portugal. Tem lutado pela legalização das medicinas tradicionais. A sua ascensão começou em 1986, quando abriu a primeira clínica de acupunctura em Coimbra. Hoje tem 20 clínicas espalhadas pelo país e 200 colaboradores, dos quais 56 são médicos de medicina tradicional chinesa. É vice-presidente da Federação Mundial de Medicina Tradicional Chinesa, o cargo mais elevado a que pode chegar um não chinês. A presidência só pode ser ocupada por membros do governo chinês. É também presidente da Associação Portuguesa de Acupunctura. Mas “não me considero uma pessoa extraordinária”, sublinha, acrescentando: “Não quis ter este império da medicina tradicional chinesa em Portugal. O resultados excederam tudo o que imaginava”. António Palmeiro
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