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A arte do embolador de toiros

A arte do embolador de toiros

Luís Campino trabalha nos bastidores das corridas

O embolador de toiros do Cartaxo, Luís Campino, trabalha nos bastidores da festa brava. À audácia de colocar a armação nas hastes do toiro, junta a arte de decorar as bandarilhas que brilham na praça.

Numa tarde de corrida de toiros em Almeirim, em 1966, Luís Campino preparava-se para cumprir mais uma vez o papel de embolador. Aproximava-se do animal, para colocar a armação de couro nas hastes, quando foi surpreendido por uma investida.O animal precipitou-se pelo postigo por onde o embolador de toiros costumava trabalhar e libertou-se do curro. Luís Campino só teve tempo de mandar fugir o filho, ainda pequeno, enquanto aguentava o animal por alguns segundos. “Depois restou-me fugir à frente do toiro”, remata. Foi o momento mais aflitivo que alguma vez viveu em 40 anos de trabalho como embolador de toiros com carteira profissional passada pelo Sindicato Nacional dos Toureiros Portugueses.Colocar a protecção de cabedal nos cornos do toiro, de forma a evitar ferimentos ao toureiro, é uma das tarefas mais difíceis e perigosas do embolador, que passa quase despercebido nos bastidores da festa brava.“Alguns emboladores já partiram braços quando colocavam o laço no toiro”, garante o especialista de Valada, Cartaxo. A protecção do animal é confeccionada em couro pelos correeiros e é reforçada com uma estrutura de ferro no interior. Às vezes, enquanto o animal roça nas paredes do curro antes da corrida, o reforço cede. E o embolador tem que estar apto para remendar a armação.Além de “arranjar os toiros para serem corridos” o embolador também fornece a ferragem à corrida. É Luís Campino, 68 anos, quem continua a criar as coloridas bandarilhas que fazem brilhar nas praças os toureiros.Luís Campino enfeitou a primeira bandarilha quase por acaso na praça de Vista Alegre, em Madrid. Foi em 1968. Depois de três corridas em Espanha surgiu um quarto convite e faltou a ferragem. Luís Campino foi incumbido pelo empresário de restaurar as bandarilhas danificadas.O resultado foi desastroso. Luís Campino foi criticado pelos espanhóis. O orgulho levou-o a aplicar-se na arte. Deu nas vistas de tal maneira que nuestros hermanos acabaram mesmo por tornar-se nos seus melhores clientes.O gosto pela arte das bandarilhas entranhou-se profundamente em Luís Campino. O embolador de toiros é há quase 20 anos o único artesão de bandarilhas em miniatura, símbolo da festa brava. Luís Campino orgulha-se de ter revolucionado a confecção de bandarilhas. Usa o tradicional papel de seda, mas costuma decorar os ferros com salofane e papel metalizado. Não se importa de gastar mais algum dinheiro para dar nas vistas.“A festa dos toiros é a festa da cor, luz e alegria. É isso que tento passar também para as bandarilhas”, garante. Sempre que é elogiado, Luís Campino sente a responsabilidade de melhorar.O embolador fornece às corridas os ferros de palmo, curtos, compridos e as tradicionais bandarilhas. A estrutura da bandarilha é feita em madeira. Luís Campino compra-a já torneada e é o embolador que arredonda as pontas e coloca as lâminas.A estrutura em madeira é depois enfeitada com pedaços de papel cortados com uma tesoura de recortes. Os pedaços de papel colorido concentram horas de trabalho ao serão. Depois são precisas outras tantas horas de paciência para fixar à madeira os recortes de papel com fita cola. O artesão tem o cuidado de não abusar no amarelo. Respeita as superstições de quem enfrenta o toiro na arena.Há dias Luís Campino cumpriu o seu papel em Monforte, no Alentejo. Sete cavaleiros e sete toiros entraram na arena. A festa foi abrilhantada por mais de 63 ferros decorados pelo embolador. Nas noites e dias que antecederam a corrida a tesoura de Luís campino não parou. O embolador, que durante 40 anos calcorreou as praças europeias ao volante dos camiões de transporte de cavalos e toiros, não se atreve a contabilizar o número de horas que despende na criação das bandarilhas. Hoje só aceita algumas corridas e sabe que ganha menos que um moço de recados. O trabalho não é rentável. É só a paixão que o mantém preso à arte.Ana Santiago
A arte do embolador de toiros

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