uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante

O homem do talho

Jorge Galão corta carne há mais de duas décadas

Aos 16 anos Jorge Galão deixou o banco da escola para procurar uma profissão. Em vez de aprender o ofício de electricista ou carpinteiro escolheu especializar-se na arte de cortar carne.

Um homem de bata impecavelmente branca debruça-se sobre a bancada de pedra. Coloca uma luva de malha de aço, empunha uma faca de lâmina larga e corta com precisão dois quilos de costeletas. É no corte das peças de carne que está toda a arte do ofício de talhante, garante Jorge Galão, 38 anos. O proprietário do talho “O Gaiato”, no Largo das Caravelas, em Almeirim, domina com rigor os cortes do pojadouro e da alcatra.“O novilho, por exemplo, é constituído por várias partes. A arte está em saber tirar cada uma das peças sem ferir as restantes. Mas estamos constantemente a aprender”, elucida o especialista.Jorge Galão chega ao talho por volta das 09h00. A decoração da vitrine é a primeira tarefa do dia. Seguem-se as encomendas dos restaurantes. Os clientes ocupam o resto das horas. Ao final da tarde, por volta das 19h00, é preciso voltar a colocar a carne nas arcas frigoríficas. No talho de Jorge Galão corta-se todo o tipo de carne. Desde a vaca, ao porco, passando pelo borrego e pelas aves. A gripe fez afastar alguns compradores, mas poucos. O preço da carne de aves é acessível e por questões económicas é um produto que será sempre procurado. O talhante sentiu mais na pele a crise das vacas loucas. O consumidor ainda não readquiriu totalmente a confiança.“O porco continua a ser rei. Está mais enraizado e já faz parte da tradição”, garante o talhante. Sobretudo às quintas-feiras, sextas e sábado - os dias de maior movimento.As carnes mais exóticas, como a avestruz ou até as costeletas de crocodilo, só mesmo por encomenda para garantir o produto mais fresco. Este é um ponto de honra do talhante que leva mais de vinte anos de profissão.Aos 16 anos Jorge Galão decidiu deixar o banco da escola. Em vez de aprender o ofício de electricista ou carpinteiro preferiu iniciar-se na arte de talhante, no estabelecimento que o pai explorava no mercado de Almeirim. O avô, chefe no matadouro, esteve sempre ligado à actividade. Jorge Galão desce cedo se deixou fascinar pelo ritual da matança do porco.O aprendiz de talhante começou por tirar febras e limpar toucinhos. Um talhante não demora menos de dois e três anos a aprender a cortar com desembaraço e por isso é preciso começar pelas tarefas mais simples. Os seus mestres foram os funcionários do talho, propriedade da sua família.Aos poucos começou a aprender a desmanchar porcos e a cortar bifes de vaca. Ainda hoje é este tipo de trabalho que Jorge Galão prefere. Mais do que fazer o atendimento ao balcão, no estabelecimento que entretanto abriu por sua conta.A tarefa menos agradável é arranjar as cabeças de porco. “Nestas alturas é impossível manter a bata branca”, garante Jorge Galão. O pagamento continua a ser o principal problema do negócio. Os talhos, à semelhança do pequeno comércio, também não escapam ao incontornável sistema de crédito. “Nas grandes superfícies chega-se à caixa e paga-se”, resume Jorge Galão.O negócio já foi mais rentável do que é hoje. Os preços da carne subiram, mas os pequenos comerciantes têm vindo a aguentar a crise sem mexer na tabela. É a única forma de não perder ainda mais clientes.No talho “O Gaiato” os clientes são tratados pelos nomes e vive-se um ambiente quase familiar. A cabeça de toiro embalsada sobre a parede chama a atenção a quem entra. Tal como o carneiro, de cigarro na boca e brinco na orelha, que faz as delícias de quem já conhece a casa. “Não é só vender. Também é preciso divertir um pouco as pessoas”, confidencia o talhante.Ana Santiago

Mais Notícias

    A carregar...