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Lerda Justiça

O que é mais revoltante nisto tudo, é que sendo, a Justiça, um sistema que existe para servir os cidadãos, se comporte como se os cidadãos constituíssem meros instrumentos de um qualquer desígnio perverso de sustentação da máquina judicial.

Os elevados custos judiciais, associados à exasperante lentidão da justiça, assente em sucessivos adiamentos, que o repetir crónico de julgamentos eterniza e a prescrição temporal esvazia, tornam a imagem da Justiça Portuguesa, um exemplo gritante de inoperância.Contactado, aliás, sobre a questão dos sucessivos adiamentos das audiências, o Presidente da Associação Forense de Santarém afirmará esta coisa extraordinária: “marcam-se várias (audiências) para o mesmo dia, porque sempre temos a possibilidade de, pelo menos, fazermos uma em que ninguém tenha faltado à chamada!”Aceita-se assim, como natural, que se marquem diversas sessões para tempos contíguos, esperando que a “deusa Fortuna” (leia-se que, afortunadamente) se tenha conseguido, pelo menos num, reunir as condições (que deveriam constituir uma norma, assinale-se) necessárias à persecução da tal acção processual!Mesmo sabendo que, assim, dezenas (senão centenas) de pessoas, por juiz e por dia, são inevitavelmente prejudicadas! Prejudicadas sistematicamente, sem apelo nem agravo (afinal, a quem é que poderiam apelar?) e sem qualquer compensação!Por uma acção de que muitas vezes não tiveram qualquer responsabilidade e em que participam coercivamente ou por imperativos de consciência. E que, frequentemente, se repete, uma, duas, três, quatro vezes,... parecendo prolongar-se até ao infinito!E de fazer perder a paciência ao mais pachola!O que é mais revoltante nisto tudo, é que sendo, a Justiça, um sistema que existe para servir os cidadãos, se comporte como se os cidadãos constituíssem meros instrumentos de um qualquer desígnio perverso de sustentação da máquina judicial.Não sei se a solução está em aumentar o controle sobre as pseudo-justificações das faltas e em penalizar o compadrio institucional que em grande parte as permite, se em flexizar a metodologia processual de forma a torná-la mais pragmática sem prejuízo, já se vê, do rigor jurídico. Provavelmente, as duas coisas!As fugas ao segredo de justiça e as prescrições de alguns processos mediáticos têm abalado a credibilidade da Justiça Portuguesa, numa altura em que a mesma parece, finalmente, ter começado a afrontar os poderes estabelecidos, tradicionalmente intocáveis. Parece!!Mas, talvez o motivo mais importante, entre nós, para a imagem negativa da Justiça, continue a ser esta percepção da infinita morosidade dos processos, que conduz à ideia subliminar de eternização: logo de perfeita ineficácia!A justiça deve ser célere! Deve decidir em tempo útil! Até porque, em muitos casos, se não o for, nunca poderá ser justa!Se calhar, deverá ter menos e melhores leis! Mais adaptadas aos tempos modernos! E de preferência, passar a cumpri-las!Senão, tenderá a reduzir-se nalguns casos, funcionalmente, a um mero vício institucional. A tornar-se, assim, uma espécie de faz de conta; a que estrategicamente recorremos (quando nos dá jeito) de forma a realçar, conjuntural e convenientemente, a nossa pretensa determinação ou indignação!Somos um país saído, à pouco, de uma ruralidade que sempre desconfiou do Estado! Logo, que sempre desconfiou dos tribunais. E não é que lhe faltassem razões para isso, diga-se de passagem!Compete, assim, ao sistema judicial do Estado de Direito, que nos gabamos de ser, criar as condições para ultrapassar esta ancestral desconfiança. Até agora, pelos vistos, sem grandes resultados!Somos ainda, judicialmente, uma república das bananas!Bem dizia o meu vizinho Calhordas (na sua roda de amigos da “tasca do Careca”), apelando à sua experiência de emigrante “encartado”, revestida (como sempre) de laivos, algo enfáticos, de filósofo amador: um país do terceiro mundo é assim como um lugar em que os alemães são a polícia, os russos tratam da comédia, os italianos estão encarregues da defesa, os turcos, da cozinha e os portugueses,... da justiça! Ele lá sabia porquê!*aurelio.rosa.lopes@sapo.pt

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