Mas que linda Primavera
Na Primavera há sempre aquelas árvores a largar mil e um pedacinhos de um quase algodão que me faz alergias e há o raio do polen que me agudiza a rinite crónica. O meu nariz fica vermelho e inchado de tanto me assoar e não ganho para os lenços de papel. Na Primavera descubro que engordei toneladas durante o inverno e que não há roupa que me sirva, nem em casa nem no pronto-a-vestir. Sob a inclemência do meu penoso destino arrasto-me pelos passeios cheios de merda de cão sem conseguir disfarçar a infelicidade que me atormenta nem a execrável barrigona que teima em espreitar por entre os botões da camisa.Na Primavera os sorrisos das teen-agers, que passam a mastigar pastilha elástica e a escrever mensagens nos telemóveis, são cruéis como punhais e rasgam-me a demasiada idade que não quero ter como cimitarras mouriscas no Álcácer-Quibir do meu desalento.Na Primavera assaltam-me ideias suicidas de cada vez que penso que ainda faltam longos meses para me poder barricar de novo nas pesadas roupas de inverno a quem atribuo virtudes igualitárias inultrapassáveis uma vez que são capazes de fazer parecer gordos os seres mais magros da minha cidade.Na Primavera há sempre uma andorinha incontinente que me caga em cima da t-shirt branca logo pela manhã arruinando por completo o meu antecipadamente arruinado dia. Rodrigo Salvador
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