A Propósito de catástrofe ambiental em Riachos
A propósito da vossa notícia intitulada “Presidente da Junta de Riachos fala em catástrofe ambiental” de 19 de Abril, gostaria de partilhar algumas ideias com os leitores conterrâneos e até com os autarcas responsáveis e preocupados com as questões ambientais.Porque habito em Riachos, desde há alguns anos que venho estudando alguns parâmetros da qualidade da água da Vala das Cordas, na tentativa de enriquecer e dar sentido real a algumas aulas práticas dos alunos do 2º ano dos cursos de Engenharia Química e Engenharia do Ambiente do Instituto Politécnico de Tomar, onde lecciono desde 1989.Assim, tenho podido observar a evolução positiva de alguns indicadores de poluição daquela água, como sejam a carência química de oxigénio (CQO), a carência bioquímica de oxigénio (CBO5) e os sólidos suspensos totais (SST). Tais determinações dão, respectivamente, uma ideia da quantidade de matéria orgânica quimicamente oxidável, da quantidade de substâncias capazes de serem degradadas por via biológica e do teor de matérias em suspensão. A matéria orgânica causa carência de oxigénio e os sólidos provocam turbidez, impedindo a dissolução e transferência de oxigénio e a entrada de luz na água. Estes efeitos diminuem o teor de oxigénio do sistema e a actuação dos microrganismos fotossintéticos. Sem oxigénio dissolvido compromete-se a vida aquática e a oxidação biológica dos compostos orgânicos poluentes. Tudo isto se traduz na redução ou aniquilamento da capacidade de auto-purificação do meio.Pelas análises esporádicas que venho fazendo desde 1995, apraz-me verificar um decréscimo da poluição naquele local, situando-se, no momento em que fiz a recolha e realizei as análises com os alunos (início de Maio), num valor de CQO cerca de 18 vezes inferior ao valor limite de emissão (VLE) para águas residuais, que é de 150 mg O2/L (Dec.-lei nº 236/98, anexo XVIII).Daí que tenha estranhado o título, pois parece-me que não é agora que devemos falar em catástrofe ambiental. A situação está longe de ser ideal, mas na Vala das Cordas a situação é muitíssimo melhor do que a verificada há alguns anos, em que análises similares realizadas mostravam valores 50 vezes superiores aos permitidos para uma descarga de águas residuais, em termos de CBO5. Isto, para não falar das descargas térmicas, que nessa altura ainda eram efectuadas, e que constatei serem realizadas no ponto de descarga com temperaturas superiores a 50ºC, e que não sendo fáceis de detectar (já que a temperatura se não vê!), contribuíam para a poluição tremenda que se fazia sentir, impossibilitando a generalidade da vida naquele sistema aquático. Nessa altura, o termo catástrofe ambiental parecia-me mais apropriado! De qualquer modo é de louvar todo o trabalho que os vários presidentes da junta de freguesia têm vindo a desenvolver no sentido de melhorar a situação ambiental de Riachos, dos seus cursos de água e dos ecossistemas envolventes. Todos temos de incentivar o esforço do presidente actual, porque ainda estamos longe da perfeição! Parece-me, contudo, que talvez seja possível recuperar o fundo da Vala das Cordas (fig. 1), onde urge limpar os imensos detritos acumulados que causam zonas de anaerobiose forçada desencadeando cheiros pestilentos francamente notórios. Estes maus cheiros impedem, por exemplo, que a população desfrute de passeios pedestres ou de bicicleta junto às zonas de campo cultivado que seriam certamente agradáveis e repousantes. Já no que respeita à ribeira da Boa Água (fig. 2), o termo catástrofe é mais consentâneo com a realidade actual. Servindo-nos do parâmetro CQO, determinado na mesma altura, verifica-se que ele é quase 3 vezes superior ao VLE já citado para a descarga de águas residuais, não para a qualidade de água de um ribeiro ou rio! É impossível aceitar hoje que um ribeiro apresente níveis de poluição tão exagerados, subjacentes a colorações variadas e por vezes, repugnantes, por se assemelharem a vermelhos-sangue! As colorações que ali se podem observar estão, por certo, muito longe da legislação, que só permite cor nas descargas se ela não for detectável numa diluição de 1:20. Como a melhoria da qualidade ambiental passa sempre pelo comportamento do indivíduo, todos temos de nos esforçar para que se mudem as mentalidades no que diz respeito às descargas efectuadas directamente para cursos de água, entre muitos outros aspectos. Cabe a todos nós preservar o ambiente e legar aos nossos filhos um local saudável e aprazível para se usufruir dos inegáveis avanços tecnológicos e da melhoria da qualidade de vida alcançada e que pretendemos que continue a ocorrer. Cecília BaptistaProfessora Adjunta – Instituto Politécnico de TomarEscola Superior de Tecnologia de Tomar Departamento de Engenharia Química e do AmbienteResponsável pela Área de Química Orgânica e Biotecnologia
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