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O mecânico de máquinas agrícolas

António Lobo é o “bombeiro” dos agricultores nas alturas críticas de campanha

António Lobo é mecânico de máquinas agrícolas. Em época de campanha deixa a oficina da Azeitada, em Benfica do Ribatejo, e vai para o campo. Dar assistência às máquinas que fazem as vezes de centenas de braços.

Uma máquina de colher tomate avaria em plena lezíria de Vila Franca de Xira. Já passa da meia-noite, mas nem a hora tardia impede António Lobo, mecânico de máquinas agrícolas, de cumprir o seu trabalho.Surgiu um problema no nivelamento automático. A máquina ameaça tombar, mas o mecânico consegue estabilizá-la recorrendo à arte e engenho de mais de 32 anos de experiência. Foi em Agosto de 2005, mas poderia ter sido em qualquer dia de Verão, plena época da campanha de tomate no Ribatejo. É nestes dias críticos que António Lobo abandona a oficina Apolinários (Irmãos), na Azeitada, freguesia de Benfica do Ribatejo (Almeirim), e parte em direcção ao campo. Para dar assistência às máquinas que fazem as vezes de centenas de braços de homens.O mais difícil é gerir o tempo e as necessidades dos clientes. Para acorrer a uma máquina tem que deixar-se outra de lado. “E estas máquinas são sempre precisas no campo”, lembra António Lobo, 48 anos, residente em Salvaterra de Magos. Na carrinha de serviço, António Lobo tem uma autêntica oficina ambulante. É lá que transporta as máquinas de soldar e o gerador que lhe garante energia para fazer os arranjos. António Lobo já foi chamado ao campo por causa de avarias nas máquinas causadas pela mão humana. Dedos e braços de quem acompanha a colheita já têm ficado presos nas complexas máquinas de apanhar tomate do campo. A tecnologia garante alta qualidade na apanha e permite seleccionar apenas os produtos de qualidade. O vermelho do tomate maduro é reconhecido em leitura óptica que “atira” para o chão os frutos ainda verdes, ramas e torrões e tudo o que não é matéria orgânica.Acompanhar a evolução tecnológica, que avança a um ritmo estonteante, é uma das dificuldades do mecânico. Para descobrir onde está a avaria num simples tractor já não basta soltar meia dúzia de parafusos. É preciso consultar o manual de instruções. Verificar qual o código de avaria para detectar a origem da falha.“Antigamente, quando havia uma avaria no tractor, levava-se a caixa de ferramentas. Hoje fechamo-nos com dois livros na cabine. É lá que se tomam todas as decisões”, garante o especialista.Há muito que o digital chegou em força às máquinas agrícolas. O papel do mecânico é adaptar-se à evolução. “As pessoas hoje em dia querem entrar no tractor ligar o ar condicionado e carregar em botões”, diz o mecânico que garante que as velhas máquinas manuais estão quase todas destinadas à sucata. Porque há peças que já não se encontram. Ou porque fica simplesmente mais barato comprar novo.A máquina que tem em mãos para arranjo é um desses engenhos modernos de painel digital, com 130 cavalos de potência. Usado para lavrar e gradar grandes superfícies de terreno.Quando o mecânico consegue ultrapassar as barreiras do digital e a língua castelhana, que abunda nos manuais que lhes servem de guia, sente sensação de missão cumprida.As caixas de velocidades e os sistemas hidráulicos são as suas paixões. Os motores não lhe dizem tanto. O arranjo de uma máquina depende sempre da complexidade do engenho. Pode ir de dois a cinco ou seis dias de trabalho.O dia do mecânico começa por volta das 09h00. Em alturas de campanha chega a prolongar-se até às duas da manhã. Sejam sábados, domingos ou dias santos. O especialista só lamenta que a remuneração da classe não seja mais compatível com a exigência da profissão.Aos 20 anos António Lobo tinha a certeza de que conseguiria ser uma pessoa rica. Foi percebendo que só com o trabalho isso não seria possível. Tem três filhos, mas nenhum faz tenções de seguir as pisadas do pai, que se iniciou no ofício aos 16 anos. Só completou o 6º ano. Deixou para trás um curso de radiotécnica na Raret, em Glória do Ribatejo (Salvaterra de Magos), para aprender a profissão que ainda hoje exerce.Os primeiros dois anos foram passados a auxiliar os mestres das oficinas. Enfarruscou-se durante as lavagens dos motores e chegou até a tentar apagar um incêndio debaixo de uma viatura até perceber que a chama não era mais que o reflexo laranja de uma peça.Bebeu ensinamentos dos velhos mestres das oficinas com quem aprendeu o ofício. Hoje ensina aos mais novos os truques da arte. Respeitando sempre o espírito da sua velha escola: a universidade da vida. Ana Santiago

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