
Lampreia criada em cativeiro
Projecto pioneiro a nível internacional no Centro Aquícola de Azambuja
O Centro Aquícola de Azambuja está a desenvolver um projecto inovador de reprodução de lampreia em cativeiro. A espécie sobrevive até à elevada degradação a que chegou o espaço.
São três da manhã. O ruído da migração nocturna das lampreias emana do fundo do tanque de laboratório no Centro Aquícola de Azambuja. O guarda-florestal que vive no espaço, de lanterna na mão, ainda espreita os tanques de cimento, mas não detecta a paragem do sistema de oxigenação originado por uma falha de energia.Parte das lampreias morreram há duas semanas, mesmo antes de serem transferidas para os tanques principais do centro aquícola. Nem isso desmotiva a responsável pelo projecto de ensaios de reprodução em cativeiro da lampreia marinha, Inês Portugal, técnica superior da Estação Florestal Nacional - o organismo que está a desenvolver um projecto inovador a nível internacional num espaço quase votado ao abandono (ver caixa).Para Inês Portugal parte da batalha a que se propunha está ganha. As lampreias adaptam-se à vida em cativeiro, mantêm o ritual de acasalamento e reproduzem-se. Já se vislumbram alguns ovos no fundo do tanque, de 85 metros cúbicos.Os resultados foram conseguidos durante o último mês a partir de lampreias trazidas por um pescador da Figueira da Foz que ficou entusiasmado com o projecto, financiado pelo PIDDAC (Plano de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central). Para quem apanha os peixes directamente no rio é difícil acreditar que a espécie se reproduz num tanque estreito que imita um pequeno troço de rio. Os resultados já começaram a aparecer. A constante oxigenação e limpeza da água são dois dos truques utilizados pela investigadora. Os estudos sobre a espécie são limitados e por isso para a composição do fundo do tanque, coberto por um substrato de seixo rolado e calhau, Inês Portugal recorreu ao conhecimento científico e empírico. É ao substrato de pedras que as lampreias se agarram para o ritual sexual, que se cumpre tal como no rio. “Transportam pedras na boca para fazer o ninho. É impressionante a noção de territorialidade. Fazem um esforço brutal até à fase da desova. Chamo-lhe o suicídio final porque acabam por morrer depois da postura”, explica a especialista, que muitas vezes paga a deslocação até ao centro do seu bolso. O apoio ao projecto não chega para custear todas as despesas.Para implementar o projecto no centro aquícola Inês Portugal baseou-se em algumas referências de estudos europeus e norte-americanos, que curiosamente não apreciam a lampreia e ensaiam algumas formas de acabar com a espécie.A lampreia marinha ou Petromyzon marinus Linnaeus, é uma espécie de grande tradição gastronómica e procura no país, onde atinge elevado valor comercial e social, que ameaça desaparecer caso não sejam tomadas medidas de gestão adequadas à preservação.A esperança da especialista é que a reprodução em cativeiro venha trazer a possibilidade de repovoar os rios com larvas da espécie e, num prazo mais alargado, criar todo o ciclo de vida da lampreia sob condições controladas. Ana Santiago

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