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O segredo das caralhotas

O segredo das caralhotas

Uma tradição que população de Almeirim não deixa desaparecer

É inevitável falar de Almeirim quando se fala de gastronomia regional. Há a sopa da pedra, o melão, o bom vinho e… as caralhotas. Um pão caseiro assim baptizado por causa do nome pelo qual são conhecidos os borbotos das camisolas.

Um alguidar de barro e força de braços são essenciais para o fabrico das caralhotas, um pão tradicional de Almeirim que suscita a curiosidade geral, quanto mais não seja pelo nome. Uma designação que embaraça alguns ouvidos mais sensíveis mas que nasce por causa de pequenos pedaços de massa, parecidos com os borbotos das camisolas, que o povo designava por caralhotas, que ficavam nos alguidares. Emília Caldeira sabe de cor os passos a dar para conseguir tirar do forno uma caralhota bem cozida. Era ainda uma menina e já lhe despertava a atenção a perícia da avó a amassar a massa para o pão que deveria alimentar a família durante toda a semana. Mais tarde, foi a sogra que lhe ensinou os segredos das caralhotas. E hoje, aos 57 anos, não tem dúvidas quando afirma que é “uma artista do pão”. Já passaram três décadas desde que começou a cozer caralhotas. Primeiro por necessidade, agora por paixão.Á entrada da rua Moçambique, em Almeirim, vê-se uma placa a fazer publicidade às caralhotas. A seta aponta na direcção da casa de Emília Caldeira mas a sua presença nem era necessária. O cheiro a pão cozido que se sente assim que se chega à entrada da rua é suficiente para se chegar ao destino sem enganos. E são muitos os que lhe batem à porta, mesmo sem saber ao que vão.“Há muitas pessoas que entram para saber o que são as caralhotas. Nem imaginam do que se trata. Depois ficam muito admiradas porque imaginavam outra coisa qualquer. Algumas ficam envergonhadas com o nome, mas a maioria começa logo a fazer brincadeiras e trocadilhos”, conta Emília Caldeira.A saga começa antes das seis horas da manhã e não tem hora para acabar. “A porta está aberta até haver clientes”, e o forno a lenha funciona durante todo o dia. “É uma arte que já vem dos avós e bisavós de Almeirim. A caralhota é feita com farinha, água, sal e fermento. Mas o segredo está na forma como se bate a massa. Tem de ser num alguidar de barro, sempre a bater até pingar o suor. Até a massa fazer bolhas”, diz Emília Caldeira.As caralhotas são bolas de pão caseiro, cozidas em fornos a lenha e vendidas em casas particulares. O povo abre as portas aos turistas e apresenta-lhes as caralhotas de Almeirim: “É um pão pesado que deixa as pessoas satisfeitas. Não é como os papessecos de agora, que são muito fraquinhos. As caralhotas alimentam e são muito saborosas. São boas para dar força a quem trabalha”, defende Emília Caldeira.Em Almeirim, a tradição das caralhotas vem de longe. E surge ligada às necessidades do povo. Com poucos recursos, era em casa que se cozia o pão para dar de comer à família. Desde então, são muitos aqueles que em Almeirim se esforçam por manter viva a chama do forno a lenha. E garantir que as caralhotas continuam a ser imagem de marca da terra. Mas, porquê chamar caralhotas àquele pão? Diz Emília Caldeira que a história é tão velha que poucos se lembram. Mas, ao que tudo indica, a culpa é dos borbotos das camisolas: “Quando se limpa o alguidar com a farinha, nas bordas ficam presos restos de massa que parecem borbotos de camisolas que aqui em Almeirim nós chamamos caralhotas. Como esses restos são usados para dar força ao pão no dia seguinte, começou a chamar-se caralhotas àquele pão”. Que antigamente era feito exactamente com as sobras da massa do dia anterior e oferecido às crianças da casa.Carla Paixão
O segredo das caralhotas

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