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Fotografia é que não!

Fotografia é que não!

É muito ténue a fronteira que delimita o direito à imagem e o direito à informação. Como jornalista, quando tiro a máquina fotográfica da mochila confronto-me muitas vezes com esse dilema. Quando numa reportagem se denuncia os buracos na estrada à porta de casa, os esgotos a céu aberto ou quando o cidadão comum é alvo das arbitrariedades das instituições da administração pública, a fotografia é vista como uma preciosa ajuda a dar força ao que é escrito. Noutros casos “sacar” da máquina fotográfica é quase como estar num aeroporto com os seguranças a olharem-nos com ar desconfiado à espera de uma arma. Como acontece para tirar uma “chapa” num recreio de escola para dar exemplo do recinto em mau estado ou falar de qualquer matéria que envolva a comunidade escolar. Os pais olham desconfiados. Professores e funcionários perguntam logo o que se está a fazer e “sentenciam” que não se pode. O que é compreensível dado que o tema envolve crianças, mas como retratar melhor uma escola ou parte dela, senão com quem a frequenta?O mesmo acontece junto à fachada da sede de uma empresa ou de uma loja. Como sucedeu comigo no Cartaxo. Bastou apontar a objectiva a tentar enquadrar clientes a entrarem numa loja chinesa para o proprietário ter sido avisado e, sem falar qualquer palavra perceptível, me dar a entender que queria que apagasse as fotos. Só com uma conversa telefónica com um representante português do lojista se conseguiu explicar o objectivo da reportagem e da fotografia. Muitas vezes em obras públicas alguém nos vem dizer que não se pode fotografar, “porque não!”, como me aconteceu numa rotunda em Coruche. Mas há mais “estratégias de fuga”, mas essas mais compreensíveis. Na rua há quem flicta rapidamente noutra direcção se nota que uma objectiva apontada na sua direcção. Os mais discretos olham para a montra mais próxima ou viram a cara para baixo. A pessoa tem o direito de não ser exposta publicamente mas o jornalista também não pode pensar que a melhor solução para o seu trabalho é tirar uma foto de um local ermo e vazio. Trata-se de uma questão de sensibilidade do profissional, de não apostar nos grandes planos e de respeitar a pessoa que nos pede para não ser fotografada.Como sucede nos acidentes em que o bom senso recomenda que não se opte por mostrar através da imagem o sofrimento de quem é vítima de infortúnio. Mesmo assim alguns episódios acabam em tribunal e, nesses casos, manda a palavra do juiz. Os jovens são mais abertos. Quando vêem que são alvos da objectiva gostam de mandar “bocas”, levantam os braços, fazem pose e perguntam em que jornal vai sair. Mesmo assim, a experiência diz que reina a timidez e a desconfiança.Quantas vezes acontece em simples inquéritos de rua as pessoas respondem às questões mas quando toca a tirar uma fotografia da ordem é que a porca torce o rabo. “Desculpe, mas já estou atrasada/o para o emprego”, “fotos é que não”, “não sou fotogénica/o” são argumentos muito ouvidos. Às vezes sinto-me como o vendedor de pensos rápidos de rua ou como um marroquino pegajoso a impingir tapetes das arábias aos transeuntes. A frase “uma imagem vale por mil palavras” não é um chavão. Nem todas são esclarecedoras mas grande parte das fotografias complementa a informação do texto e dá mais qualquer coisa ao leitor. Vá lá, colabore, não custa nada…Ricardo Carreira
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