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De servente a industrial da construção civil

João Pimenta aprendeu em jovem a arte no Souto e praticou-a por todo o país, Angola e Brasil
Viveu no Souto até que idade?Vivi lá até aos dezasseis anos. E aos dezoito já estava a fazer empreitadas.Começou como?Comecei como servente e ainda aprendi a pedreiro no Souto. Ganhava nesse tempo três escudos e metade era para o meu mestre.Nasceu no seio de uma família humilde?Humilde mas com umas terras para cultivar. Tinha um irmão. Na minha família é habitual haver poucos filhos. Andei na escola até à quarta classe e comecei logo a trabalhar.Nunca pensou em estudar mais?Pensei estudar numa determinada fase. Mas nessa altura alguém me disse não, porque havia umas empreitadas para concluir. E assim foi…De onde herdou a veia para o negócio?Nasceu no meio do trabalho. Porque só trabalhando muito é que se consegue fazer alguma coisa.Veio do Souto directamente para Lisboa?Sim, mais propriamente para a Amadora. Foi aí que comecei, depois fui para a Praia das Maçãs e Colares durante muito tempo. Construí a primeira moradia nas Mercês com 19 anos, à sociedade com o meu irmão. Teve de ficar em nome do meu irmão porque eu era menor de idade. Naquela altura era só aos 21 anos. Essa moradia ainda lá está.Quando é que nasceu a empresa J. Pimenta.Foi em 1956 e até 1974 manteve-se. Nessa altura estava a construir um edifício em Luanda. Tinha lá diversos empreendimentos…Nunca pensou regressar e tentar recuperar aquilo que era seu?Tem piada que já depois das intervenções do Estado nas minhas empresas ainda fornecemos para lá algum material, como caixilhos de alumínio, móveis. E quando lá quisemos ir, apresentamos o passaporte a pedir autorização para ir a Luanda e disseram-nos que tínhamos lá um bom representante e não nos deixaram viajar. Aí acabou!E quem era o vosso representante?Era um empregado nosso que tinha ido para lá para fazer a montagem e a venda das coisas.Ainda tem alguma ligação ao Souto? Tem lá património? Família?Ainda lá tenho família. Mas quanto ao património que lá tenho praticamente não vale nada. É tudo mato e algum ardido. É raro ir lá. Ficou sensibilizado com a homenagem que lhe fizeram recentemente na sua terra natal?Confesso que não a esperava agora. Penso que por aquilo que fiz lá a partir da década de sessenta era merecido na altura ter havido uma distinção. Ofereci o terreno e ajudei a construir a sociedade recreativa do Souto. Construí a sede da junta de freguesia, que nunca tinha tido um espaço de que fosse proprietária. Ajudei a construir a estrada entre Souto e Carvalhal, entre outras obras de benfeitoria que ajudei a fazer.Sempre gostou de ajudar as instituições e colectividades?Ajudei muitas neste país e também em Angola, no Brasil.Tinha prazer em partilhar?Gosto que as pessoas vivam bem. Ajudei a construir o pavilhão desportivo de Paço de Arcos, da Amadora, o campo do Estrela…Esteve ligado ao Estrela da Amadora?Fui eu quem deu vida ao Estrela. E era o presidente da direcção no 25 de Abril. Estava a construir bancadas, tinha feito projectos para aquilo, mais o dinheiro que ia por lá deixando… Numa reunião a seguir ao 25 de Abril a direcção começou a discutir política em vez de discutir os interesses do clube. Fiquei calado e quando cheguei ao fim disse que era a última vez que lá ia, porque no dia seguinte ia apresentar a demissão.Acabou-se aí o dirigismo desportivo?Exactamente.É uma pessoa alérgica à política?Sim, sem dúvida.Nunca deu a cara por nenhuma campanha eleitoral?Não. Porque é que hei-de fazer isso? Há muita gente que faz isso, que hoje dá o rosto por um, amanhã dá por outro. Eu não me meto nisso. Apoiei apenas nesta última campanha em Abrantes o João Pico (candidato do CDS à câmara como independente). Foi o apoio a um amigo, mais nada...Tem consciência que ajudou a mudar a paisagem em muitos pontos do país?Eu tenho a consciência que fiz muita coisa boa por este país. Posso ter feito uma ou outra não tão boa, mas se o fiz foi involuntariamente. Mas que neste país se fizeram muitas coisas conscientemente para me prejudicar, isso é verdade.Quando apontam as suas urbanizações como mau exemplo de urbanismo e de construção desbragada como reage?Penso nas urbanizações que se fazem agora. Olhe-se para o Cacém, por exemplo. Na Reboleira, a parte central onde eu construí, junto da zona desportiva, é ainda hoje das melhores urbanizações da Amadora. O resto que se fez depois disso é outra coisa completamente diferente. Construíram-se prédios em terrenos para jardins, etc…O poder político também deu alguma margem…Claro. A principal responsabilidade é de quem aprova e não de quem executa. Porque a muita coisa que construí foi em terrenos que já estavam aprovados. A sua empresa teve um anúncio publicitário célebre que fez andar o seu nome na boca do povo. Tem bairros e edifícios com o seu nome. Gosta de deixar marca por onde passa?Não é o gostar de deixar marca. Aqui por exemplo onde estamos, em Cascais, quando regressei do Brasil, em 1979, vi uma placa com um anúncio de venda de materiais de construção no bairro J. Pimenta. Fiquei a saber que o bairro que tinha construído era conhecido pelo nome da minha empresa. Foi o povo quem lhe deu o nome, não fui eu.

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