Dos campos de Pontével para o Terreiro do Paço
Entrevista a Conde Rodrigues, secretário de Estado da Justiça e ex-presidente da Câmara do Cartaxo
Nasceu em Pontével numa família de produtores de vinho, mas não seguiu as pisadas do pai e do avô. Aplicou-se nos estudos, ligou-se à política e chegou a presidente da Câmara do Cartaxo aos 30 anos já com o curso de Direito e uma experiência no ensino universitário. Hoje, José Conde Rodrigues, 41 anos, é secretário de Estado adjunto e da Justiça. Um trajecto em ascensão de um homem viciado na leitura e fã de rock and roll que não considera a política um emprego e afasta a hipótese de regressar às lides autárquicas.
Foi secretário de Estado da Cultura, agora é secretário de Estado adjunto e da Justiça. É um governante todo o terreno?A Secretaria de Estado da Cultura foi um desafio que aceitei em 2001. E quando o Partido Socialista ganhou novamente as eleições e foi convidado a constituir Governo foi-me lançado esse desafio na área da justiça. É a área da minha formação base mas penso que a defesa do interesse público e a gestão da causa pública é o mais importante independentemente da área onde estejamos.A pressão deve ser menor agora do que quando era presidente de câmara. Aqui não tem munícipes a baterem-lhe à porta.É diferente. Gostei muito de exercer as funções de presidente de câmara, pela proximidade e também pela forma como podíamos contactar com os munícipes. Um autarca faz de confessor, de psicólogo, às vezes até de mediador na resolução de pequenos conflitos. Aqui a distância é maior. Às vezes sentimos alguma frustração por não conseguirmos ver logo o resultado das nossas decisões.O fantasma das remodelações governamentais não o apoquenta?Essa é uma matéria que diz respeito exclusivamente ao senhor primeiro-ministro. Ele é que tem de avaliar em cada circunstância quais as pessoas mais adequadas a desempenhar as funções em cada momento. Devemos estar disponíveis para fazer o melhor, mas temos a sensação que estas funções são naturalmente efémeras e não constituem um emprego.Quando lê uma notícia desagradável sobre o seu desempenho fica aborrecido?Quem exerce funções públicas está sempre sujeito a esse escrutínio natural. É normal gostar mais das coisas positivas do que das negativas. Contudo, desde que exista verdade naquilo que é dito temos de aceitar que há posições diferentes sobre aquilo que fazemos.Já meteu algum jornalista em tribunal?Não. Quer dizer que nunca fugiram muito à verdade.(risos) Nem sempre. O que acontece por vezes é que o tempo acaba por nos dar razão. Nalgumas circunstâncias até pode acontecer que aquilo que escrevam a nosso respeito não seja verdade. Mas também entrar em excessivo conflito só pelo conflito acho que não é o mais salutar.Os governantes trabalham muito para a imagem?Cada vez mais a quantidade de informação que existe a propósito das decisões obriga a um empenho maior para fazer chegar a mensagem daquilo que se decide. E em política todos sabemos que tão importante como o que se faz é mostrar o que se faz. Daí ser natural que a maioria dos políticos se preocupe não digo tanto com a sua imagem pessoal mas sobretudo com a imagem que é transmitida do trabalho feito na sua área. Quando faz um anúncio público, por exemplo de um investimento, e depois não o consegue cumprir não sente que andou a vender gato por lebre?O nosso dever é conseguir concretizar aquilo que anunciamos. Agora, temos de ter uma noção muito clara que tanto na política como na gestão em geral, e até na nossa vida pessoal, nem sempre realizamos aquilo que queríamos. É muito difícil saber alguma coisa sobre o futuro. Portanto o anúncio de determinada medida deve ter por detrás um trabalho, um projecto e uma calendarização. Não se devem anunciar coisas sobre as quais possamos ter muitas dúvidas. O que é que tem sido feito para acabar com a droga nas prisões?Foram dados passos significativos. Hoje o controlo que se faz nos estabelecimentos prisionais, sobretudo no que diz respeito às visitas, é muito maior que há uns anos. Existem equipamentos de detecção, operações que são feitas de forma activa para evitar que a droga entre nas prisões. Queremos que as prisões sirvam como meio para cumprimento das penas e também como veículo para a reinserção social.Como responsável político, como analisa as sucessivas violações do segredo de justiça?Quando há situações em que eventualmente é violado o segredo de justiça, deve ser investigado e os responsáveis devem ser punidos. Agora se há mais ou menos resultados relativamente a isso, depende do funcionamento do sistema. O Governo apresentou à Assembleia da República alterações quer ao Código Penal quer ao Código do Processo Penal. Como?Muitos processos deixarão de estar em segredo de justiça, porque não faz sentido. Passará a existir o princípio da publicidade. Só alguns processos estarão sob segredo de justiça. Por outro lado, o segredo de justiça é restringido na sua dimensão máxima apenas à fase de inquérito - embora possa passar para a instrução em determinadas circunstâncias.O arrastar de processos como os casos Apito Dourado e Casa Pia não contribuem para a descredibilização da justiça?Não me posso pronunciar sobre casos em concreto. O que estamos a pôr em prática é fazer com que o sistema seja mais eficaz na investigação e nas condenações. Porque não basta abrir muitos inquéritos e depois não ter resultados, quer condenando quer absolvendo. O que o Governo prevê fazer nesse campo?Na alteração que propusemos ao regime de Código de Processo Penal o inquérito passa a ter um prazo vinculativo. O que é uma grande novidade, porque hoje pode arrastar-se por muito tempo. O prazo varia em função do tipo de crime. A diferença substantiva é que enquanto no passado o prazo era ultrapassado e isso não tinha consequências - o Ministério Público podia dizer que precisava de mais tempo para investigar -, no novo regime logo que o prazo termine o procurador responsável deve comunicar isso ao seu superior hierárquico e pode haver avocação do processo.
Mais Notícias
A carregar...