Morreu Manuel Bento ex-guarda-redes do Benfica e da Selecção Nacional de futebol
Futebolista para fugir à vida dura de pedreiro
O antigo futebolista do Benfica Manuel Galrinho Bento, natural da Golegã e guarda-redes da selecção portuguesa que conquistou o terceiro lugar no Europeu de França'84, morreu na quinta-feira, aos 58 anos. O MIRANTE foi recuperar memórias de quem com ele partilhou a juventude.
No Largo da Machada, no Bairro da Baralha, na Golegã, não são muitas as recordações do “Manel” como era mais conhecido o guarda-redes que para o mundo ficou conhecido como Bento. “Recordo-me do rapaz franzino que corria e pulava aqui na zona. A sua família, como quase todas as outras que aqui viviam, era muito modesta. Os pais eram trabalhadores do campo, a vida dele era livre mas difícil e não era tratado por menino como os filhos dos grandes senhores”, recordou ao nosso jornal Manuel Moreira, o único idoso que acedeu falar da infância daquele que viria a ser um dos melhores guarda-redes portugueses de todos os tempos.Manuel Galrinho Bento foi guarda-redes do Sport Lisboa e Benfica e da Selecção Nacional nas décadas de setenta e oitenta. Faleceu no dia 1 de Março, vítima de paragem cardíaca. O jogador fez as primeiras defesas no Riachense porque não havia escalão de principiantes na terra natal, a Golegã, mas foi aí que se notabilizou, quando se formou uma equipa de juniores. De tal forma que acabou por ingressar no Barreirense, então na primeira divisão nacional.Era um rapaz franzino, irrequieto, mas já muito elástico e também muito corajoso. Quando terminou a quarta classe, os pais puseram-no a aprender a pedreiro. “Uma vida dura que nunca agradou ao Manel que dizia sempre que tinha que arranjar maneira de sair disto e tinha que ser guarda-redes”, recorda Carlos Pitada, colega de equipa nos juniores e nos seniores.E talvez por isso não demorou muito a dar nas vistas e a ser chamado para treinar em alguns clubes do distrito. No entanto o resultado era sempre o mesmo e como recorda António José Martins Lopes, que foi seu colega no lugar de guarda-redes e treinador no Goleganense, diziam que era muito “baixote” para o lugar de guarda-redes. “Curiosamente foi meu suplente durante uma época”, recorda o agora provedor da Santa Casa da Misericórdia da Golegã.Manuel Bento também gostava de bicicletas, bailaricos e picarias. “Um dia numa picaria para angariação de fundos para o Goleganense, foi desafiar o toiro e, quando pensava que ia levar uma tareia, em aflição, saltou um muro com quase dois metros de altura. Se fosse outro tinha mesmo levado a tareia!”, recordou Martins Lopes.Mas o sonho mantinha-se e a grande ansiedade de Manuel Bento era dar o salto da sua vida e sair da vida dura de pedreiro. “Quando surgiu a primeira hipótese de sair para um clube maior ficou completamente apanhado”, lembra Carlos Pitada.Essa primeira oportunidade de Bento “dar o salto” é recordada por Martins Lopes, que o viu desperdiçar a ocasião em Almeirim. "Um dia foi jogar a Almeirim e estava a ser visto por alguns clubes e também pelo seleccionador distrital, mas, como andou toda a noite num baile na Golegã, teve de sair a meio do jogo, depois de já ter sofrido cinco golos”.Carlos Pitada também recorda esse dia “Foi muito mau. No dia anterior ao jogo houve um baile aqui na Golegã, e nós todos andámos na folia e nos copos até ao raiar do sol, depois fomos jogar para Almeirim, e foi um desastre. O Manel ficou completamente destroçado mas reagiu e a partir de então treinava ainda com mais vontade”.Era ele que pedia ao treinador, na altura o torrejano Joaquim Gomes, para puxar por ele. O antigo campo da Golegã ganhava ervas nos cantos e, quando esta era amontoada depois de roçada, Bento pedia para se treinar junto desse monte, utilizando-o como obstáculo e voando por cima dele para agarrar as bolas.Entretanto subiu aos seniores e um dia o também goleganense António Madaleno decidiu levá-lo para treinar no Sporting. “Regressou ao fim de uma semana a dizer que um representante do Barreirense viria à Golegã para levar a sua carta de desvinculação, e perante a nossa admiração disse-nos que no Sporting lhe tinham dito que era muito baixo para guarda-redes e um colega o tinha levado para treinar no Barreiro e o treinador Vieirinha tinha gostado dele”, recorda Martins Lopes.Foi a partir de então que a vida de Manuel Bento mudou. O presidente do Barreirense apareceu, e a direcção do Goleganense pediu 20 contos (cem euros) pela carta de desvinculação. “Vocês estão convencidos de que o Barreirense está a nadar em dinheiro ou quê, respondeu o dirigente. Damos 10 contos e trazemos cá a nossa equipa principal para fazer um jogo com o Goleganense”, disse na altura o dirigente do Barreirense.Os seus homólogos da Golegã aceitaram lá foi “o Manel” para o Barreiro, onde viveu o resto da sua vida, mesmo depois de ter alcançado os êxitos que alcançou e se ter transformado um dos melhores guarda-redes de sempre do futebol português.Manuel Bento, que acabou por ser guarda-redes do Goleganense durante duas ou três épocas, nunca renegou as suas origens mas também não era um assíduo visitante da sua terra natal. A Câmara Municipal da Golegã entende que lhe deve prestar uma homenagem institucional e o presidente do Futebol Clube Goleganense que seja dado o seu nome ao actual Campo das Ademas, porque foi naquele pelado, que agora vai levar relva sintética, que Manuel Bento fez as suas primeiras grandes defesas.
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