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António Oliveira quer morrer montado num cavalo

Dá aulas de equitação na Chamusca a treze alunos

Em jovem correu algumas das mais famosas casas agrícolas, onde fez de tudo: desbastou potros, fechou vacas, lidou toiros.

Aos sete anos roubava os cavalos aos campinos para montar. Fugia da escola e ia ter com o pai, campino da casa Norberto Pedroso, na Chamusca. O pai ralhava-lhe, dizia que tinha que estudar mas António José Oliveira fingia apenas que o ouvia. Os equídeos são a sua primeira paixão, à frente dos toiros e das ovelhas. Mesmo quando era novo, as raparigas vinham sempre em segundo lugar, apesar de ser por causa delas que toda a gente o conhece por Madrugada. A alcunha, colocada por “vingança” de quem certamente não podia fazer o mesmo, deve-se ao facto de quando era jovem chegar a casa sempre de madrugada, quando os bailaricos acabavam e as moçoilas recolhiam aos progenitores.Não passou da antiga quarta classe porque a professora não ensinava a arte que ele queria aprender – a campinagem. Como o pai, correu algumas das mais famosas casas agrícolas, onde fez de tudo: desbastou potros, fechou vacas, lidou toiros. Aprendeu muito mas ambicionava mais. “Sentia que tinha uma missão a cumprir que era a de ensinar miúdos a montar”, diz o homem simples, que no próximo mês comemora meio século de existência.Em 1995 decide realizar o seu sonho e começar a trabalhar cavalos por conta própria. Compra um equídeo, aluga um casal junto à vila da Chamusca e funda a escola “Os amigos do cavalo”. A notícia espalha-se e os clientes começam a aparecer. “Cheguei a ter 33 cavalos e mais de 40 pessoas aqui a aprender, principalmente crianças das escolas da Chamusca e de outros concelhos”, diz “Madrugada”. E também gente da capital e até estrangeiros, principalmente ingleses. Ensinou miúdos que hoje são mestres, dando exemplo de uma equitadora francesa que obteve o segundo lugar no campeonato daquele país.Naquela altura a profissão principal de António Oliveira “Madrugada” era ser camionista. Conduzia um camião de uma empresa de pesticidas e rações. Mas assim que o dia estava ganho corria para o seu casal e quando percebeu que não dava para ter as duas actividades deixou de ser motorista.A tragédia deu-se a 25 de Fevereiro do ano passado. “Madrugada” caiu do cavalo, fracturou o crânio, partiu o braço e a omoplata. Esteve 12 dias em coma e na terra já toda a gente dizia que ele não ia sobreviver. Mas quando acordou e se viu numa cama de hospital não esteve com meias medidas e fugiu. Para perto dos seus cavalos. “Vieram-me buscar e tive de para lá voltar mas sem grande vontade”, diz a sorrir, enquanto desculpabiliza Romero, o seu primeiro cavalo. “Ele não teve culpa nenhuma, esbarraram-lhe as quatro patas ao mesmo tempo…”.Os meses de incapacidade ressentiram-se no negócio, a que não é também alheia a crise em que vivem os portugueses. “Aprender a montar a cavalo é um luxo a que muitos portugueses não se podem dar”, diz quem no entanto está confiante de que irá voltar aos tempos áureos da actividade. Neste momento tem seis cavalos e continua a ensinar a montar e a dar aulas de equitação a 13 alunos. A mais pequena tem quatro anos e a mais velha é uma professora que já ultrapassou os 40. “A vida não está fácil mas pelo menos continuo a fazer o que sempre quis”, considera Madrugada, que também toma conta de um rebanho de ovelhas do proprietário do casal.Trabalha quase por amor à camisola. Que é como quem diz, aos cavalos. Leva 10 euros por hora e muitas vezes os passeios acabam em petisco. “Há muitas pessoas que vêm aqui aprender e acabam por ficar amigos, são da casa”. É por isso que nunca diz que não a quem o procura para aprender. Já chegou a sair com cliente de braço ao peito mas as dores são sempre suplantadas pelo sorriso de uma criança.Abre a porta de uma dependência e mostra as dezenas de arreios, montadas e selas que possui. Num armário estão os chapéus – “não deixo sair daqui ninguém sem o chapéu colocado e a montada verificada” – e num outro a farmácia. É ali que gasta a maior parte do dinheiro. Na veterinária e na alimentação. “Comprar um cavalo não é caro, caro é mantê-lo”, considera quem antes quer morrer em cima de um cavalo ou a lidar com um toiro que ao volante de um carro. “Morria satisfeito”.

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