Um inalador de vapor em metal, uma alheta que servia para limpar e observar os ouvidos dos doentes e uma lamparina para fazer o banho-Maria são apenas três das memórias do médico Sousa Martins que encontramos no primeiro andar da casa-museu com o seu nome em Alhandra. Clínico, cientista, investigador, professor e um cidadão de mérito invulgar, Sousa Martins é o patrono do espaço que reparte com várias figuras da vila onde nasceu.O busto do médico está à entrada do museu. Junto da recepção encontramos vários livros e artigos religiosos que nos remetem para outro lado do cientista. Muitos visitantes acreditam nos milagres do “médico-santo” e há até quem ofereça donativos e objectos como acção de graças pelo apoio que receberam em momentos dramáticos.“O museu vale pelo seu acervo, pelos conteúdos, e não pela crença em Sousa Martins”, explica o presidente da Junta de Freguesia de Alhandra que nos acompanha nesta visita. Jorge Ferreira valoriza a componente cultural e considera que o museu não deve ser um espaço de culto onde se pagam promessas, mas “um espaço de referência com as várias memórias e uma vila com oito séculos de história”. Nos dois pisos e no sótão do velho edifício junto ao Cais, encontramos memórias de várias vidas. Está lá o nadador Baptista Pereira, o escritor Soeiro Pereira Gomes ou o dramaturgo Salvador Marques com uma sala dedicada ao teatro e onde está instalada a biblioteca do museu. Ao centro há uma mesa e quatro cadeiras recuperadas nas ruínas do teatro de Alhandra. Os móveis centenários não passam despercebidos aos visitantes. A família Antunes, residente numa aldeia de Tomar, confessa o encanto das peças. Luís Antunes, ferroviário aposentado, observa atentamente cada pormenor, enquanto a netinha ao colo da avó reage às cores e às imagens que encontra. “Este é um museu vivo. Aqui estão anos de vida, de muitas vidas, que devem ser preservados e mostrados aos mais novos”, explica, depois de visitar a sala dedicada à indústria onde está a primeira maqueta da fábrica de cimento da Cimpor. Curioso, é que uma das maiores cimenteiras nacionais, começou por ser uma fábrica de ferro, como nos explica Ana Paula Mota, responsável pela realização do inventário do museu.A enorme lista do acervo com centenas de peças está sempre a ser actualizada. Continuam a chegar ofertas de crentes nos “milagres” do patrono do museu. Numa arca colocada perto das cadeiras usadas por Sousa Martins, estão fatos de noiva e de baptizados, colchas e outros adereços pessoais oferecidos por devotos ao médico que investigou a cura para a Tuberculose e morreu tuberculoso depois de ajudar a curar milhares de doentes.Na exiguidade do museu, cabem ainda outros heróis de Alhandra como Afonso de Albuquerque, que não nasceu na vila, mas foi lá que cresceu e constitui família. Há toureiros, forcados, campinos, bombeiros e músicos que contribuíram para a valorização da terra e das suas tradições. A falta de espaço obrigou a junta de freguesia a procurar um lugar onde pudesse instalar algumas das peças que o actual museu já não comporta. O núcleo dois do museu, está instalado num edifício recuperado no Largo Moisés do Carmo. Os responsáveis da Casa Museu Dr. Sousa Martins elegem como prioridades: intervir na preservação e recuperação do espaço e renovar as exposições existentes. Por agora, a rotatividade só passa pela galeria Augusto Bértholo, um espaço repartido pela Câmara Municipal de Vila Franca de Xira e pela Junta de Freguesia de Alhandra e onde têm passado artistas consagrados e alguma revelações da terra. Em Dezembro, a galeria abre as portas para receber uma exposição de presépios construídos por artistas de Alhandra.