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“O nosso país está cheio de burocracia e sistemas anti-evolução”

“O nosso país está cheio de burocracia e sistemas anti-evolução”

António Marques Varela esteve na falência e hoje é líder de um grande grupo de construção e investimentos imobiliários

À hora a que o Conselho de Ministros estava reunido para decidir a localização do novo aeroporto, o empresário com mais interesses na Ota, uma das localizações apontadas para o equipamento, estava a dar esta entrevista a O MIRANTE. António Marques Varela, 58 anos, tem 650 hectares de terrenos na zona da Ota e ainda não acreditava que fosse na quinta-feira, dia 10, que houvesse uma decisão sobre a localização do aeroporto cuja escolha recaiu em Alcochete (ver texto pag. 34). É presidente do grupo Tiner, que começou por ser uma pequena empresa de construção e que se transformou num grande grupo do sector imobiliário quando decidiu apostar na edificação de grandes armazéns de logística em Alverca. Hoje tem negócios nos Estados Unidos, Brasil, Angola.

Não tem grandes investimentos no concelho de onde é natural. A Chamusca não é apetecível?É um concelho interessante por ter uma área muito grande. Mas, por outro lado, para a minha actividade imobiliária não tinha expressão. Fixei-me ainda durante dois anos na Chamusca, criei uma empresa de construção que desenvolveu várias empreitadas na localidade e nos concelhos em redor. Mas é uma zona muito rural para o desenvolvimento de actividades que precisem de suporte de continuidade. Quando saiu da Chamusca apostou em Almeirim. Mas acabou por ficar na falência e deixou várias obras por concluir. O que aconteceu?Estava numa fase de crescimento que coincidia com um ciclo negativo da economia nacional. Os meus clientes, que eram as câmaras municipais, e o Estado não tinham dinheiro. Atrasavam-se nos pagamentos.Saiu de Almeirim com uma má imagemÉ a imagem de alguém que abandona um sonho.Ficou abalado?Psicologicamente não fiquei no melhor estado, porque sou consciente e quem não consegue assumir os seus compromissos fica sempre demolido. Depois fui arrumando esse passado, que é bem incómodo para quem tem vontade de fazer com que as coisas aconteçam pela positiva.Diz-se que pensou em suicidar-se nesse momento difícil…Não! Isso são boatos próprios dos meios pequenos. Durante algum tempo não se ouviu falar no seu nome e de repente aparece com o estatuto de empresário importante. Grande reviravolta…Comecei de novo do zero, mas em Lisboa. Fui avaliando alguns erros que teria cometido, juntando a experiência dos anos vividos, apesar de ser muito novo na altura. Recuperei a vontade de fazer coisas e o crédito. A parceria que fez com o grupo Espírito Santo contribuiu para que pudesse dar o salto?Foi apenas um banco que apareceu no caminho acidentalmente. Desenvolvi negócios que tinham como destino os fundos de investimento imobiliário que essa instituição financeira administrava. O Espírito Santo comprava os activos a quem os tivesse. E eu era um fornecedor de centros de distribuição logística que construía e para os quais arranjava os inquilinos. Depois fazia e ainda hoje faço, em Portugal e no estrangeiro, a venda a esses fundos. Porquê a aposta em centros logísticos?Há 12 anos começou a surgir a necessidade desses espaços em Portugal com o aparecimento dos grandes operadores logísticos nacionais e internacionais. O país estava a zero neste tipo de infra-estruturas e foi o momento certo. É uma questão de estar atento e identificar as oportunidades.Comprou muitos terrenos a baixo preço que não tinham qualquer aptidão e que depois foram muito valorizados. Isso é especulação…O especulador é alguém que compra determinado bem que depois o vai vender pelo melhor preço que conseguir sem acrescentar qualquer valor patrimonial. E existem muitos. O que faço não tem nada a ver com especulação imobiliária. Não sou vendedor de terrenos. Os espaços que comprei estavam destinados nos planos directores municipais à indústria, comércio ou habitação e se vender um lote já desenvolvi todo o processo de legalização e infra-estruturação. Mas tem alguns terrenos inseridos em Reserva Agrícola e Ecológica.Esses comprei-os como qualquer cidadão o pode fazer. E quando um dia as entidades que controlam o território definirem que aquele local pode ter uma utilização irei mandar fazer projectos, fazer as infra-estruturas e construir os edifícios. Se os comprou é porque tinha informações que um dia vai poder construir…Se um empresário não tiver visão de futuro jamais será empresário. Há tempos confessou dar-se bem com os autarcas, como por exemplo os de Vila Franca de Xira e Azambuja. Essas amizades ajudam-no a ter essa visão?Qualquer cidadão, se estudar os planos directores municipais e a forma de evolução da economia em determinadas zonas, vai poder ter uma percepção do que pode vir a acontecer. Daí ter investido em terrenos que considero importantes desde o Algarve a Vila Nova de Gaia. E estamos a falar de muitos autarcas. Mas um grande empresário tem mais facilidade em conseguir que os autarcas façam o que ele quer…Não. O nosso país está cheio de burocracia e sistemas anti-evolução. Compramos terrenos em áreas que já estão definidas para construção e andamos muitos anos a desenvolver projectos e a fazer pressão para que as coisas aconteçam de acordo com a lei. Mas fazer com que essa lei seja cumprida é algo muito penoso neste país. Como é que consegue manter equipamentos que estão sem funcionar há vários anos, como é o caso do Lezíria Retail Park em Almeirim?Esse foi um projecto bem feito mas ficou concluído fora do ciclo económico favorável. Está a dar prejuízo mas há-de haver o momento para a recuperação. A sua imagem também ficou muito afectada quando o seu avião particular, que decidiu alugar a uma empresa de aviação, foi confiscado pelas autoridades da Venezuela por ter droga no seu interior.Isso até me deu notoriedade. Nada tive a ver com o assunto e perdi um avião. Hei-de vir a ser ressarcido no âmbito de um processo em tribunal contra a companhia de seguros. Não pode viajar através das companhias aéreas?Tive que comprar outro avião porque tenho que viajar muito e com eficiência e tenho que estar apto fisicamente para desenvolver negócios em várias partes do Mundo. Comprou uma ilha no Tejo, o mouchão do lombo do Tejo. A ideia era transformá-lo num empreendimento turístico?Adquiri o terreno por uma questão de afinidade com o mundo rural. Tenho cuidado e valorizado aquele espaço fantástico, se calhar sem a compreensão de pessoas que desconhecem a realidade. Essa incompreensão tem alguma coisa a ver com o facto de ter no local construções que não estão licenciadas?Isso é especulação de pessoas que acham que o mundo deve ficar ao natural, que os diques devem cair e que os mouchões podem desaparecer.As associações ambientalistas continuam a afirmar que há construções ilegaisSão mentirosos. Eles não sabem rigorosamente nada do que se passa. Levo lá toda a gente que queira visitar o espaço porque não há nada de ilegal.Chegam-lhe comentários desagradáveis?Às vezes ouço coisas que preferia não ouvir. Quase sempre são comentários associados à inveja, que não é só dos portugueses. Dizem que ninguém pode enriquecer sem roubar ou sem ter negócios escuros.É raro dar entrevistas, tenta ser discreto. É uma estratégia?É uma questão de temperamento. Há pessoas que gostam de ser fotografadas e de aparecer em todo o lado. A exposição traz benefícios e malefícios. Sou uma pessoa reservada.Quem anda de avião privado, de helicóptero e carros de luxo não passa despercebido.Durante muitos anos fiz tudo isso e ninguém se apercebeu. Foi preciso acontecer aquele estúpido incidente do avião apreendido para toda a gente se aperceber. Nunca senti necessidade de mostrar às pessoas o que tenho. Só tenho necessidade de cumprir as minhas obrigações fiscais e sociais de forma correcta. Não preciso do Jet Set para alimentar o meu ego.
“O nosso país está cheio de burocracia e sistemas anti-evolução”

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