Uma história de amor que atravessou sete décadas
José Ferreira declarou-se por carta a Emília de Jesus e aguardou um ano para começar a namorar
Casal de Tomar está casado há 66 anos e namorou quatro. São 70 anos de vida em comum, “para o bem e para o mal, na saúde e na doença”. Fotos do casamento não há. Os noivos não tiveram dinheiro para tal luxo.
Conheceram-se ainda meninos na Escola Primária da Madalena, no concelho de Tomar, e logo gostaram um do outro. Deram tempo ao tempo e começaram a namorar tinha ele 16 anos e ela 15 singelas primaveras.Foi através de carta que José Ferreira, actualmente com 86 anos, se declarou a Emília, que vai agora nos 84 anos: “A menina é tão jovem que, sem dúvida, serão as primeiras palavras de amor que os seus olhos terão ocasião de ler”, começava assim missiva escrita em 1937 e que o casal ainda conserva. “Há muito que procuro alento para vos declarar o amor que sinto pela menina mas a vossa tímida e doce candura tem-me impedido de o fazer. Hoje, porém, certo do vosso bom acolhimento, resolvi fazer-lhe esta confissão: Amo-a, adoro-a, abençoo-a desde o momento feliz que tive a ventura de a conhecer. Aguardando uma resposta que me torne feliz, apiedando-se do que sofre, assino com subida consideração”, termina o bilhete amoroso, talvez considerado de grande arrojo na época. Como resposta, Emília de Jesus mandou o amado aguardar um ano, porque ainda “era muito nova para namorar”. Durante esse tempo, os dois trocaram várias cartas de amor, encontrando-se de vez em quando nos bailaricos das aldeias. Um dia, ao fim de mais de dois anos desde a cartinha de amor, José Antunes encheu-se de coragem e foi pedir autorização à mãe de Emília para a namorar. Esta permitiu o namoro mas “só em casa”, debaixo do seu olhar vigilante. Casaram quatro anos depois, a 1 de Fevereiro de 1942. Segundo o casal, antigamente o casamento era apregoado nas três missas dominicais anteriores ao enlace. O padre anunciava o nome dos noivos e perguntava se havia algum impedimento para o matrimónio se consumar. Antes tiveram que se confessar mas cada um a um padre diferente. “O padre que fez a confissão à noiva não a fez a mim e tive que me ir confessar a outro lado”, contou José Ferreira. No dia do enlace, o noivo foi a pé, juntamente com os seus convidados, buscar a noiva que morava a poucos quilómetros de sua casa, no Carvalhal Pequeno. Foi igualmente a pé que seguiram até à igreja da Madalena, onde viriam a casar numa “cerimónia simples mas bonita”. O almoço decorreu na casa da família do noivo e a boda foi confeccionada por uma cozinheira particular, contratada para o efeito. A loiça era pedida emprestada a vizinhos, dias antes. À noite, a festa de casamento terminou com um baile que durou até de madrugada, animado por um acordeonista. Fotos de casamento não as há porque naquele tempo, “ter um fotógrafo no casamento era um luxo” a que José Ferreira, tipógrafo de profissão desde os 12 anos, não se podia dar. O casal recorda, no entanto, o terno momento em que, ainda namorados, e de fugida, foram tirar meia dúzia de fotos a um fotógrafo ambulante e que custaram “dez tostões” Um ano e meio depois do enlace nascia o primeiro de quatro rebentos, Maria de Jesus. Dois anos mais tarde, a segunda filha, Maria da Purificação. Depois vieram os rapazes: José Jesus e António José. Seis netos e duas bisnetas, completam o leque familiar. Desafiados a contar qual foi o momento mais marcante do seu casamento, o casal conta que para além do nascimento dos filhos e dos netos, há um momento que não esquecem: a cerimónia das Bodas de Ouro, ocasião em que reuniram toda a família e fizeram uma grande festa. E qual o segredo mágico para um casamento durar toda uma vida? “Obedecer um ao outro, existir uma boa compreensão e, claro está, amor”, dizem. O mesmo sentimento que se sente no ar, 66 anos depois, quando pedimos ao casal que troque um beijo e não hesitam em fazê-lo por um segundo.
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