A companheira de um anti-fascista que doou o espólio ao museu do neo-realismo
Margarida Tengarrinha foi a personalidade convidada em Vila Franca de Xira
É para manter viva e preservar a memória de José Dias Coelho que a família decidiu doar parte do espólio do artista ao museu do neo-realismo de Vila Franca de Xira. Margarida Tengarrinha, companheira do artista plástico assassinado pela PIDE em Dezembro de 1961 numa rua de Lisboa, foi a convidada de mais uma sessão de “Encontros e Desencontros”, no auditório do Museu que se realizou sábado, cinco de Abril.A artista veio falar não só sobre a vida em comum com o companheiro José Dias Coelho (cuja exposição esteve patente até domingo no museu do neo-realismo) como também da luta política e da luta pela modernidade travada em pleno regime ditatorial. Margarida Tengarrinha fez questão de salientar que não entende porque é que o nome de José Dias Coelho foi apagado da história da arte em Portugal. Margarida Tengarrinha agradeceu o convite do museu do neo-realismo e mostrou-se satisfeita por “finalmente poder dizer algumas coisas que tinha encalhadas e que não havia maneira de sair por falta de oportunidade. “Essa ocasião chegou”, disse.Na sua opinião o período pós-guerra da cultura portuguesa tem sido, desde a sua eclosão, ignorado, subestimado e deturpado por aqueles que ocupavam lugares de destaque na pesquisa e divulgação da história da arte e também das artes plásticas. A pintora e professora de História de Arte, há mais de duas décadas, não quis acusar ninguém por essa desvalorização mas não deixou de tecer algumas críticas.“Tenho consciência que na origem do apagamento da cultura portuguesa esteve uma grande carga política que se foi prolongando pelo tempo até cristalizar e criar ideias feitas, difíceis de remover”, afirma.Margarida Tengarrinha garantiu que aceitou participar nesta sessão apenas como testemunha e participante na vida e lutas dessa época fascista. A artista recordou a influência que o companheiro teve na contestação aos programas da Escola de Belas-Artes e na abertura aos artistas não afectos ao regime. A pintora doou ainda ao museu fotocópias de circulares dadas aos sócios da sociedade nacional de Belas-Artes, datadas de 1952, assinadas pelo presidente da direcção da escola como forma das pessoas entenderem melhor como foi dura a luta travada com o regime. “Conseguimos a eleição de júris abertos à modernidade que até ali eram dominados pelos velhos bodes do regime como Eduardo Malta, pintor, e uma das altas figuras do regime fascista. Eduardo Malta acabou por ser expulso enquanto sócio da sociedade nacional de Belas-Artes pela provocação que encenou contra José Dias Coelho que encetou essa batalha pela modernidade e liberdade”, afirmou. E acrescentou. “Travamos verdadeiras batalhas, mas vencemos. E a prova de que vencemos foi o facto do regime ter mandado encerrar a Sociedade Nacional de Belas-Artes”.
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