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Sebastião, nome de poeta

Sebastião Mateus Arenque. É o nome do poeta que escrevia em folhas de papel pardo na lezíria; do menino que guardava gado no campo e do electricista da câmara municipal que durante anos cuidou da rede eléctrica do concelho. É também o nome que a câmara municipal atribuiu ao museu de Azambuja.Parte do espólio foi respigado por Sebastião Mateus Arenque quando o projecto era pouco mais que um sonho. A história do museu confunde-se com a história do etnógrafo autodidacta. Os utensílios de trabalhar o campo que calejaram as mãos do menino estão lá. Tal como o primeiro lençol do enxoval e a fotografia do casamento de Ilda e Sebastião, de 77 e 85 anos. Continuam companheiros, tal como prometeram naquela manhã de Maio de 1950. Tiveram três filhos. Dois vingaram. António, Lourenço e Sebastião. São os nomes gravados nas campainhas da moradia de casais do Regedor, em Casais de Baixo, Azambuja.O mestre partilha a casa rente ao chão com a companheira de 57 anos. É lá que se refugiam durante a noite. Depois de um dia partilhado na sala de convívio do Centro Social e Paroquial de Azambuja onde os anciãos convivem de perto com os mais novos. O autocarro vem buscá-los à porta de casa. Sebastião Mateus Arenque tem dali uma vista sobre o vale. O cenário campestre que também lhe inspirou os poemas. Que chegou a escrever durante a noite, lembra a companheira. Às vezes Ilda lê-lhe umas páginas de livros, mas aborrece-se quando descobre que o marido está a espreitar a televisão. Foi tropa de infantaria no quartel de Mafra e escreveu cantigas. Foi na altura em que viveu em Arruda dos Vinhos. Ficou em sexto lugar num concurso em Sintra com uma canção que falava da cidade. O electricista escreveu a letra. Um amigo serralheiro encarregou-se de compor a música. “Trabalhávamos na mesma oficina. Fomos para um pinhal, levamos uma garrafa de vinho, sentámo-nos à sombra dos pinheiros. Ele escreveu a música toda com base nos versos que eu tinha feito”, recorda.Viveu no tempo em que era distribuída a sopa dos pobres em Azambuja. Quando o trabalho do campo não rendia e as famílias passavam mal. A certeza de um ordenado ao fim do mês e um horário fixo vieram com o trabalho na câmara municipal. Preocupa-o o problema do desemprego e do custo de vida, mas admite que hoje a sociedade tem outras exigências. As famílias querem mais conforto. O menino poeta nasceu no coração de Azambuja. É o mais velho de cinco irmãos. Aos 85 anos sobe ligeiro a escadaria de sua casa, mas tem pena que os anos lhe tenham levado parte da memória. “Escrevi 14 livros sem saber escrever”, diz o poeta e etnógrafo que revela que fora das encadernações dos livros ficaram umas quantas folhas que espera que os filhos queimem quando um dia partir.

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