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Quando os bombeiros puderem usar os desfibrilhadores os equipamentos já estarão obsoletos

António Carvalho, comandante operacional municipal da Protecção Civil de Vila Franca de Xira, presidente da Federação dos Bombeiros do distrito de Lisboa

Quando os bombeiros forem autorizados a usar os desfibrilhadores os equipamentos já estarão obsoletos. Quem o diz é o comandante operacional municipal da protecção civil de Vila Franca de Xira, António Carvalho. O presidente da federação dos bombeiros do distrito de Lisboa defende o trabalho em conjunto entre as corporações do concelho e critica a postura megalómana do INEM que coloca ambulâncias ao lado dos quartéis, mas que não tem resposta adequada nas centrais de emergência.

Investiu-se na compra de desfibrilhadores para as ambulâncias e os bombeiros continuam sem poder usá-los.O Inem já mostrou disponibilidade para abrir às corporações de bombeiros o uso dos desfibrilhadores. Quer dizer que em breve as pessoas vão ter formação específica e vai ser finalmente possível que os bombeiros utilizem os desfibrilhadores. É uma vitória que aa classe de socorristas obteve junto da entidade que é a autoridade competente para legislar sobre esta matéria. As pessoas que hoje estão no Inem estão sensibilizadas para o problema, sobretudo o presidente que tem mostrado abertura para esta área diferente do antecessor. Os equipamentos ainda vão estar em condições nessa altura?Penso que não. Há associações, como a minha [Póvoa de Santa Iria], que compraram ambulâncias, mas sem o equipamento porque estamos à espera da autorização. A esmagadora maioria dos equipamentos que existem nos corpos de bombeiros está obsoleta. Terá que haver uma renovação. Foi dinheiro deitado fora?Foi porque estivemos estes anos todos sem poder usar os equipamentos que foram comprados na altura do Euro 2004. Não digo que um equipamento ao fim de quatro anos esteja obsoleto, mas as baterias não são usadas. Só são carregadas. Foi um investimento que não teve qualquer resultado. Vamos ver se conseguimos pelo menos que tenha sido desbloqueada a situação.A relação entre o Inem e os bombeiros é conturbada. Há muitas queixas sobre a forma como a informação é tratada pelo CODU (Centro Orientação de Doentes Urgentes) e atrasos no socorro.As situações continuam a acontecer, como continuam a acontecer demoras no atendimento das chamadas. Frequentemente temos problemas de comunicação com a central do CODU. Não tenho que justificar esse mau serviço que estão a prestar não só às populações como aos próprios bombeiros, mas enquanto comandante de um corpo de bombeiros já fui prejudicado várias vezes. Não posso estar 10 minutos ou um quarto de hora à espera que o Inem atenda a chamada para fazer uma triagem. Isto pode complicar o socorro. Obviamente que faço sair a ambulância. A resposta de quem atende é normalmente: ‘se já lá estão o serviço é vosso’. Há uma visão economicista. É preciso batalhar junto do Inem para que se altere esta postura que ainda reina no CODU de Lisboa e Vale do Tejo. Há operadores e técnicos de emergência que continuam a olhar para os bombeiros de uma maneira que não é a mais correcta. Já fiz duas ou três reclamações por escrito relatando situações desagradáveis. O que é que tem que mudar?Se de facto é uma questão de falta de recursos então que invistam nos recursos internos em vez de andarem a proliferar ambulâncias em paralelo com os bombeiros. Em vez de colocarem ambulâncias ao lado dos quartéis dos bombeiros ou nos sítios onde já há bombeiros que invistam no sistema do CODU. Em vez de terem quatro ou cinco operadores tenham dez. Já seria uma boa ajuda para resolver este problema. Os bombeiros são a única força de socorro que está implementada em todo o país. Num país pobre como o nosso com tanta falta de recursos é mau que o Estado não aproveite esses parceiros de modo a rentabilizar o que já existe, podendo com o remanescente investir internamento no apoio a esses corpos de bombeiros. É este o caminho que devemos seguir paralelamente com a atribuição de mais formação aos próprios bombeiros para que façam melhor.Porque a missão é a mesma...Há entidades que se esquecem que temos um objectivo único que é servir a população. Às vezes custa-me ver algumas decisões, como a que foi tomada agora. Para financiar a megalomania do Inem aumenta-se de um para dois por cento o valor que as seguradoras vão ter que cobrar a quem tem seguros para financiar o sistema de emergência médica. Alguma coisa não está bem quando se aumenta um imposto em cem por cento.As reclamações que apresentou são recentes?Têm dois meses. Na opinião dos bombeiros há triagem que são mal feitas. Não estou a culpar o operador. Mas a pessoa que está a dar os dados pode não saber. É um familiar, um amigo, um vizinho que quer lá uma ambulância. O que aconteceu foi que o operador avaliou mal porque o que lhe estavam a dizer não era correcto. O tripulante quando chegou ao local para fazer o serviço verificou que a situação era mais grave e tentou fazer uma segunda passagem de dados. Foi insultado pelo médico. São situações que não devemos tolerar. Temos coisas a melhorar. Lá e cá. Uma instituição como o Inem deve colaborar com os bombeiros. Obra para evitar cheias em Alverca vai resolver apenas parte do problemaFalava das ambulâncias do Inem ao lado do quartel dos bombeiros. Os meios no concelho de Vila Franca de Xira são suficientes face à densidade populacional?Os corpos de bombeiros estão bem apetrechados. Os equipamentos servem para o nível de ocorrências. Haverá uma ou outra carência pontualmente num corpo de bombeiros. Obviamente que queremos sempre mais, mas também faltam os recursos humanos. Por vezes acontecem situações de desequilíbrio. No concelho há várias corporações com auto-escadas. Justifica-se essa duplicação quando são equipamentos que oneram as corporações por causa de encargos como os seguros?Mais do que os seguros requerem prática, treino e uma manutenção muito cara. Temos três auto-escadas no concelho. Penso que é um número razoável. Se fosse hoje tentaríamos ter uma plataforma e duas auto-escadas porque têm funções diferentes e poderia servir melhor o concelho. É preciso caminhar para uma nova realidade que é o trabalhar em conjunto. O país é pobre e o município também não é rico. As corporações estão preparadas para colocar de lado esses bairrismos?Temos feito algum trabalho em conjunto e há pouco tempo por causa do QREN chegamos a conclusões sobre o que cada um precisava e o que era prioritário. Temos que trabalhar assim senão não há nada para ninguém. Já não há mecenas no futebol quanto mais nos bombeiros.As cheias são um assunto que preo-cupam as populações. Sobretudo em Alverca. Sobretudo na rua da Estação. Apesar da obra estrutural anunciada a população ainda vai enfrentar um ou dois Invernos…Tem sido feito no município um grande trabalho na regularização e limpeza das ribeiras, no caso particular do Rio Crós Cós. Mas por vezes registam-se fenómenos anormais. Se chover copiosamente e a maré estiver cheia dificilmente não há inundações. Se houver uma tromba de água não há nada que consiga escoar a água. Antigamente quando chovia um bocadinho a cidade de Alverca ficava debaixo de água. Hoje isso não se verifica. Quando temos avisos de chuva colocamos a postos máquinas e operadores de modo a limpar os detritos. Esta obra irá resolver uma parte do problema, mas haverá sempre risco. O que acontece é que tudo está a mudar. Até aqui tínhamos uma época de chuvas e outra de calor e hoje isso não é tão linear. O transporte de doentes dá prejuízoAs corporações queixam-se que o transporte de doentes não dá dinheiro, mas continuam a fazê-lo.Em representação da Liga dos Bombeiros estou mandatado, mais um outro elemento, para negociar o protocolo para o transporte de doentes. Fizemos uma proposta protocolo que já foi entregue ao Ministério da Saúde e aguardamos que seja marcada reunião de trabalho. Enquanto que Vila Franca de Xira tem o hospital aqui mesmo ao lado – só cobra a taxa de saída – Póvoa de Santa Iria – por exemplo cobra 19 quilómetros. O transporte de doentes tem que ser visto numa proposta nacional ponderada. Mas seja em Vila Franca de Xira, na Póvoa ou no Algarve o serviço de saúde dá prejuízo. Porquê? Neste momento está a 47 cêntimos por quilómetro e não paga a mão-de-obra e o gasóleo. A média nacional estará em 81 cêntimos o quilómetro porque tem que ser considerado o desgaste da ambulância e o pessoal. Isto dá prejuízo. Nós estamos a financiar o serviço de saúde de prestamos. E porque continuam a fazê-lo?Porque é uma questão histórica. Já viu o que era se os bombeiros deixassem de fazer o transporte de doentes? Imagina os milhares de utentes que deixavam de ir às consultas e fisioterapia? Por isso as associações se chamam humanitárias. Há aqui uma questão social de que não nos podemos dissociar. As associações nasceram para servir a população, embora nas zonas mais urbanas se olhe para os bombeiros como um prestador de serviços. Se formos para o Portugal profundo os bombeiros são os únicos ao lado das populações. O voluntariado é uma actividade que não se deve perderA presidente da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira já veio a público falar na necessidade de avançar para a profissionalização. É sustentável que as corporações continuem a apoiar-se nos voluntários quando as pessoas têm as suas vidas e os seus trabalhos?O voluntariado é uma actividade que não se deve perder. Ocupa os jovens e as pessoas sentem-se úteis. Por outro lado é uma maneira de poupar dinheiro ao erário público. Sou a favor da continuidade do voluntariado. Mas as pessoas não têm tempo. Temos que caminhar devagar para a profissionalização das equipas de primeira intervenção. Temos que ter profissionais durante a noite, durante o dia e ao fim de semana porque a população assim o exige. Sou a favor de um sistema misto. Equipas profissionais com a retaguarda de voluntários. Enquanto sai a primeira equipa de profissionais tenho tempo de mobilizar os voluntários para uma segunda intervenção. E são as câmaras municipais a pagar a essas equipas... Também. No caso de Vila Franca de Xira sim, mas o Governo – uma exigência da liga e da federação - abriu a possibilidade de criar equipas subsidiadas pelo Ministério da Administração Interna e município. É o Estado a descartar-se das responsabilidades.De certa forma, dizendo que são zonas onde existe muita gente e muitos voluntários e assim tem fugido à contratação das equipas. Enquanto presidente da federação tenho alertado o secretário de Estado para abrir ao distrito de Lisboa esta possibilidade até porque muitos municípios estão a pagar as equipas que estão nos bombeiros, como Azambuja, Vila Franca, Loures, Odivelas e outros. É injusto que suportem sozinhos uma fatia dos profissionais. Há a necessidade de que o Governo olhe para o distrito de Lisboa com outros olhos.Escolas de Vila Franca sem planos de emergênciaOs planos de emergência para os cerca de 80 estabelecimentos de ensino do concelho de Vila Franca de Xira estão a ser preparados no âmbito da protecção civil do concelho e deverão estar concluídos em 2009. “Havia apenas meia dúzia de escolas com planos feitos por sua iniciativa”, constata o comandante operacional municipal da protecção civil de Vila Franca de Xira, António Carvalho, que considera que mais importante que os planos é que as pessoas tenham conhecimento de como agir. O gabinete está também a trabalhar nos planos de emergência externos das empresas de risco no concelho – a Ferro Portugal e a ADP - e no novo plano de emergência municipal. O comandante operacional municipal privilegia o trabalho de planeamento. Adquiriu um programa informático para a gestão da protecção civil municipal que permite aceder em qualquer lado à informação de cadastro para saber onde estão as empresas, os equipamentos e os recursos humanos. Comandante de bombeiros e analista de riscosO comandante operacional municipal da Protecção Civil do concelho de Vila Franca de Xira, António Carvalho, tem 49 anos e é analista de riscos numa empresa de seguros.É licenciado em gestão, tem pós-graduação em gestão de emergências e está a efectuar o mestrado em segurança em incêndios urbanos e industriais na Universidade de Coimbra. É docente na Universidade Nova de Lisboa. Além de ser presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Lisboa é também comandante dos bombeiros da Póvoa de Santa Iria. Foi eleito do PSD na assembleia municipal de Vila Franca de Xira, mas afastou-se da política para agarrar o desafio lançado há um ano pela presidente do município ficando à frente da protecção civil. “Acho que é preciso mudar alguma coisa. Mas tenho consciência de que não se consegue fazer num ano ou dois o que não se fez em 20. É culpa do poder político, mas também das pessoas que não foram capazes de motivar o poder político para as decisões que é preciso tomar”. A cheia de Alverca foi a situação mais complicada que enfrentou, mas que o concelho resolveu bem. “Ainda conseguimos colocar meios em Loures para os auxiliar nas inundações que foram mais graves, ilustra.

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