uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante

Mulher de 105 anos sobreviveu ao terramoto de 1909 em Benavente

Borda d’Água previu tragédia às cinco da tarde mas ninguém ligou

Terramoto matou 38 pessoas e destruiu 80 por cento das casas do concelho de Benavente. Bárbara viu morrer a mãe soterrada a seu lado e foram os seus olhos azuis que chamaram à atenção de quem a salvou.

Bárbara Ganhão, 105 anos, é um dos poucos sobreviventes do terramoto de Benavente que ainda está viva para recordar as memórias da catástrofe. No dia em que fez 100 anos ,viajou até 23 de Abril de 1909 e contou a O MIRANTE como viu morrer a mãe a seu lado. Recuperamos o relato. “Eu debaixo da terra, gritei: “oh senhor Júlio, estamos aqui”, mas ele não me ouviu. Andaram várias pessoas por cima de mim e não me encontraram, até que um homem sem querer escavou ao pé da minha cabeça e viu os meus olhos. Lembro-me tão bem dele ter dito: ai ela é tão bonitinha. Tem um olhinho azul”, contou.Naquele dia uma vizinha insistiu para que a sua mãe a acompanhasse ao campo onde o pai trabalhava, mas a mãe não queria ir porque tinha lido no “Borda D’água” (publicação que falava das marés, luas e fenómenos naturais) que às cinco da tarde iria haver um abalo de terra. As insistências da vizinha acabaram por convencer dona Litícia, assim se chamava a mãe de Bárbara, e lá foram. Ao chegarem à casa do pai da vizinha, passavam cinco minutos das cinco da tarde, ouviram um enorme estrondo e sentiram um abalo. Antes de conseguirem reagir, ficaram soterradas nos escombros resultantes do desabamento quase imediato do edifício. Bárbara Ganhão, a mãe, a vizinha e duas filhas de tenra idade. Só ela sobreviveu.Depois de desenterrada, Bárbara foi levada num carro de bois para Benavente ao lado da mãe e das crianças mortas. “Nunca mais me esqueci do que vi. Chegaram ao cemitério e puseram os corpos para dentro de uma vala”, lembrou emocionada.Nos dias que se seguiram ao terramoto, Bárbara apercebeu-se da destruição da vila. Nem a igreja resistiu ao sismo que destruiu a maioria das casas e fez 38 vítimas mortais. “Foi uma tristeza muito grande”, disse.Maioria dos habitantes salvou-seporque estava no campoO balanço só não foi mais dramático porque, à hora em que ocorreu, 17h05, a grande maioria da população estava ainda a trabalhar nos campos. Com uma magnitude estimada entre 6 e 7,6 graus na escala de Richter, o sismo foi sentido em todo o país é ainda é considerado o mais destruidor em Portugal continental no século XX. O terramoto destruiu por completo os aglomerados de Benavente, Samora Correia, Santo Estêvão e Salvaterra de Magos.Testemunhos da época referem as “casas que se desmoronam em nuvens colossais de poeira que se elevam nos ares”, o “aspecto desolador da vila em ruínas” e as populações em pânico a reunirem-se no Largo do Chaveiro ou em fuga para os campos.Quarenta por cento das habitações de Benavente ficaram totalmente destruídas, outras tantas sem condições para voltarem a ser habitadas e apenas 20 por cento recuperáveis depois de obras de reparação, referem os dados da Biblioteca Municipal de Benavente.Dos edifícios públicos, apenas a Câmara Municipal (construída em 1874) e a Biblioteca Municipal resistiram, mesmo assim com danos relevantes, tendo o património religioso praticamente desaparecido. O sismo terá durado 22 segundos e as réplicas fizeram sentir-se durante muito tempo, a mais forte das quais sentida a 2 de Agosto, mais de três meses e meio depois do primeiro abalo.Sem comunicação telegráfica, a notícia do sismo chegou à capital do distrito, Santarém, através de um lavrador que para aí se dirigiu de automóvel, referem os documentos.O Governador Civil de Santarém, o chefe da polícia, guardas e bombeiros chegam a Benavente ainda no dia da tragédia, por volta das 23h00.No dia seguinte, o rei D. Manuel visita a zona sinistrada e as forças militares começam a instalar tendas de campanha e trazem mantas, camas, roupas. O Hospital Militar da Estefânia enviou médicos e enfermeiras.Por iniciativa do Diário de Notícias e do Clube de Fenianos, do Porto, foram edificados dois bairros para as famílias mais pobres, ainda hoje conhecidos por Bairros Novos, enquanto a Cruz Vermelha mandou edificar barracas de zinco.

Mais Notícias

    A carregar...