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Manuela Soares

Manuela Soares

45 anos, médica dentista

Formou-se em farmácia e bioquímica, mas a medicina dentária acabou por falar mais alto. Manuela Soares, 45 anos, está a seguir as pisadas do pai na clínica Fernando Soares, em Vila Franca de Xira. A busca incessante pela qualidade é o seu modo de vida.

O medo da cadeira de dentista é uma questão de geração. Em tempos era justificado. Hoje em dia não porque temos a anestesia e outras formas de tranquilizar o paciente. Fomos sempre os maus da fita. Ao nível da banda desenhada temos sempre alguma coisa que não nos abona. Eu fiquei mais traumatizada com o filme “Nemo” do que as crianças. Felizmente passou ao lado. A saúde não tem preço. Somos bombardeados constantemente. Há pouco espaço para que as pessoas possam ponderar. Mas é preciso saber procurar. Com o número que existem é necessário fazer selecção. As pessoas são assediadas por preços baixos, mas correm o risco de ter que pagar um valor real mais alto. A saúde oral começa na barriga da mãe. Desde logo no tipo de alimentação. Há gestantes que deixam para último o tratamento dos dentes. E depois ou aguentam as dores ou vão ter que tomar fármacos. E o bebé vai sofrer com isso. Faltam os primeiros cuidados de higiene oral. As próprias instituições não abrem excepções para que as crianças lavem os dentes. Não faz sentido. Temos uma má educação alimentar. A refeição a que deveríamos dar mais atenção é ao pequeno-almoço e é exactamente quando as coisas falham. Há crianças que vão sem comer para a escola. E há pais que substituem o pequeno-almoço por um café e um cigarro. Quanto custa uma escova de dentes? As questões do preço são relativas. E se a pessoa tiver o hábito de escovar os dentes e fizer a visita de controlo ao dentista uma vez por ano? É tudo uma questão de prioridades. Mas as pessoas preferem deixar chegar tudo ao extremo. O que normalmente implicatratamentos mais onerosos ou a perda total de um dente. Acabei por fazer da minha profissão o meu filho. Tenho os meus sobrinhos e os meus pacientes a quem de forma indirecta dou o meu amor e carinho. Trabalho em Vila Franca de Xira, mas resido em Benavente. Consigo conciliar as coisas porque tenho um companheiro – só marido não chega – que compreende. É um profissional que dá o melhor e põe sempre o seu cliente primeiro. Em tempo de crise temos que trabalhar muito a transparência. Tanto nesta como em outras profissões é importante fazer a diferença. Dou tudo o que tenho e o que não tenho. É a minha maneira de estar na vida. O que me custa é receber pessoas com problemas. Há uns anos tive um paciente com um tumor dos piores que andava a ser tratado como uma afta. Ponho-me sempre no lugar do doente. Sinto-me abençoada. Faço parte do grupo restrito de pessoas que fazem o que gostam. Há sempre problemas, mas é tudo superado. Sempre quis ser médica, mas não foi por influência paternal. Licenciei-me em 1999 na Faculdade de Medicina Dentária de Lisboa. Já tinha tirado um curso em farmácia e bioquímica no Brasil. Acabei por desistir do primeiro curso. Quando regressei achei um absurdo o que estavam a pedir pelos alvarás. Trabalho um dente como trabalho uma tela. Gosto muito de arte e o trabalho dá-me essa possibilidade. E uso pincéis. Ao nível de reconstrução e restauração. Um dente deve ser devolvido tal e qual como a natureza o deu e com as paletes de cores que tem. Um dente não tem só uma cor. É azul, marrón, branco e pérola. O meu sonho foi sempre fazer o bem ao próximo. Hoje está tudo mais virado para os bens materiais. Os bens morais quase não existem. Isso desgosta-me. Disperso-me no número de horas de gasto com o trabalho. Não sou uma pessoa de ambições monetárias. O meu pai ainda exerce. Faz atendimento duas vezes por semana. Tem 73 anos e 52 de profissão. Vou fazer a sua caminhada. E acho que só largarei a profissão por questões físicas. Vou investir até morrer na minha profissão. Para dar o meu melhor ao meu paciente.
Manuela Soares

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