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O chefe e os lacaios

“A gente sente calafrios quando considera este abismo da imbecilidade humana e se lembra de que também assim podia ser”. Antero de Quental.Há pessoas que só sabem viver rodeadas de lacaios. Como não têm a natureza dos líderes vivem permanentemente para serem os chefes da manada. O problema, ainda maior, é que andam sempre horrorizadas com a possibilidade de acabarem como cordeiros do sacrifício.Gostava de dizer estas palavras a uma pessoa que conheço e a quem assentam como uma luva. Escrevi-as para isso mesmo: para as dirigir a um nome próprio. Depois de as escrever percebi que ia fazer uma grande maldade a mim mesmo; a pessoa é minha amiga apesar de tudo. É fraca por natureza; julga-se permanentemente perseguida e não há outro poder maior no mundo do que aquele que emana da sua poderosa voz; o mundo é tudo o que se vê e não se vê da sua torre de marfim; mas a pessoa é minha amiga apesar de tudo; se não é muito amiga pelo menos sabe demonstrar algum afecto; devo deixar-lhe aqui o recado mas é melhor evitar o incómodo de lhe citar o nome. Nem toda a verdade se diz, nem se diz a verdade toda—Eis um postulado impeditivo, espécie de aziar humano com que nem todos se conformam. A verdade que se pensa, a verdade que se sente, a verdade que se prova, desde que seja necessária e útil, porque não há-de expressar-se nua e crua? O texto é de um livro editado em 1918 da autoria de Ricardo Jorge (Contra um Plágio) que eu um dia reeditarei com dinheiro do meu bolso se não conseguir entusiasmar uma editora. A lembrança vem a propósito porque eu contrario nesta crónica tudo aquilo que é a singularidade deste livro. Como escrevo aos encontrões, e vou adiando a publicação de textos como adio as minhas viagens à Rússia, reencontrei nestes últimos dias a escrita soberba de Nelson Rodrigues no livro “A Menina Sem Estrela”. Foi lá, entre um conjunto de oitenta belíssimas crónicas, que voltei a encontrar-me com a sabedoria das palavras e de onde retirei uma outra frase que diz tudo sobre a origem do texto desta crónica que leva destinatário certo. Somos realmente uns impotentes da admiração. Cochichamos o elogio e berramos o insulto. JAE

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