Laranjas maduras da quinta vendidas em vão de escada
Deixa a caldeirada de peixe ao lume e desce as escadas. José Moleiro, 84 anos, tem este tique de revirar as laranjas da caixa de madeira que tem no seu vão de escada, numa casa de primeiro andar do centro da cidade de Vila Franca de Xira. São laranjas da quinta que José Moleiro “abandonou” há 11 anos para vir partilhar os dias com a companheira, dez anos mais velha, também viúva e merecedora de toda a sua admiração. É com orgulho que José Moleiro prepara as refeições, organiza a casa e cuida da mulher. Quando é preciso matéria prima para a venda parte pela manhã de autocarro até Benavente. Paga dez euros a uma mulher – por duas horas a apanhar laranjas – para que reúna frutos suficientes que mais tarde serão levados nas traseiras de uma carrinha que um outro homem, seu conhecido, transporta em troca de um montante justo pelo gasóleo gasto. As laranjas são vendidas com autorização da junta de freguesia a quem José Moleiro paga a devida taxa. Já foi roubado, aconteceu também já ter que expulsar amigos do alheio do seu vão de escadas, mas ainda assim não esmorece. Tanta laranja que todos os dias toca o chão em Benavente. A companheira está em repouso. Essa sim, prestes a comemorar mais um aniversário, merece fotografia e honras de jornal. Voz de soprano ou contralto, digna de ser ouvida, atesta um piscar de olho. Do varandim pende não flor de laranjeira, mas um arranjo de frutos. Laranjas. Como que a anunciar um romance na idade de oiro. Como o sumo da fruta que amadurece nas caixas de madeira. Ana Santiago
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