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Igreja não desiste de erradicar o espectáculo de imagens de santos cobertas de notas

Em Coruche não houve dinheiro nos andores mas em Samora Correia a tradição manteve-se

Longe vão os tempos em que, nas procissões, as imagens dos santos, iam cobertas de notas da cabeça aos pés. A ostentação das dádivas ainda se mantém em alguns locais mas a igreja católica não desiste de a erradicar. Ana Isabel BorregoRicardo Carreira

De ano para ano vão desaparecendo os estendais de notas nos santos que vão nos andores das procissões. Mas ainda há quem resista às novas regras da Igreja Católica. O MIRANTE acompanhou as procissões de Coruche e Samora Correia. Em Coruche Nossa Senhora do Castelo passa pelos crentes sem dinheiro à vista. Em Samora Correia, Nossa Senhora de Oliveira, Nossa Senhora de Guadalupe e algumas das outras imagens ainda vão enfeitadas com notas presas aos mantos.Às 17h00 de domingo, os 17 andores da procissão de Samora Correia estão alinhados nas zonas laterais da igreja matriz. Alguns dos santos já têm notas de euro presas às vestes. Não são muitas, apesar de tudo. Nossa Senhora de Oliveira e Nossa Senhora de Fátima terão 60 a 70 euros cada. Notas de 20, 10 e 5 euros.A colocação de notas nas imagens é um dos rituais dos crentes que mais desagrada à igreja católica. As hierarquias têm insistido junto dos párocos para que tentem evitar tal situação. A Arquidiocese de Évora, a que pertencem Coruche e Samora Correia, não é excepção. O padre Tarcísio Pinheiro que presidiu à procissão de Samora Correia confessa que foi obrigado, mais uma vez, a abrir uma excepção, em nome de pessoas modestas e humildes que o procuraram para explicar que tinham promessas para cumprir. “O dinheiro nunca foi objecto de adorno. Ninguém anda na rua ornamentado com notas. Nós temos respeito pelas imagens. Pelo que elas representam para as pessoas. Porque as vamos adornar com as notas?”, questiona.Há quem discorde. É o caso de Felismina Alves de 75 anos, com quem O MIRANTE falou no dia anterior, sábado, em Coruche, durante a procissão em honra de Nossa Senhora do Castelo. “Venho todos os anos de Salvaterra de Magos para a procissão. Antigamente pregávamos o dinheiro que queríamos oferecer no manto da Nossa Senhora. Eu gostava mais de ver a Santa enfeitada com as notas que cada pessoa oferecia, mas acabaram com esta tradição e resta-nos aceitar as ordens da igreja”, explica. O dinheiro que Felismina Alves decide oferecer à igreja é agora colocado na caixa das esmolas. Elias Serrano Martins, pároco de Coruche há 32 anos, está satisfeito com o fim da tradição. “Desde 1994 que surgiram normas da Diocese de Évora a respeito da pastoral das festas. Uma dessas normas impede a colocação de notas com fitas penduradas nas imagens. Julgo que isso não dignifica as imagens dos Santos e de Nossa Senhora que procuramos venerar e tributar com a nossa própria devoção”, explica. E acrescenta com alguma satisfação que foi dos primeiros a dar seguimento às ordens da Arquidiocese. “Em nenhuma freguesia do concelho de Coruche isso acontece actualmente”. O juiz da Irmandade de Nossa Senhora do Castelo, Diamantino Diogo, refere um outro pormenor que também teve influência na decisão da Arquidiocese de Évora. “O manto que cobre a imagem de Nossa Senhora do Castelo é revestido a ouro. Como as pessoas utilizavam alfinetes para colocar as notas o manto foi-se deteriorando. E para não estragar algo que é único e muito antigo optou-se pela caixa de esmolas junto ao andor”, explica.América Dias, samorense de nascimento mas a viver em Lisboa, tem lágrimas nos olhos quando fala com O MIRANTE. Acaba de colocar algumas notas junto às imagens da Senhora da Oliveira. “É a padroeira da terra onde nasci e faço-o por tudo o que lhe tenho pedido e que ela me tem dado. É uma questão de fé que não tem mal nenhum”, responde quando lhe perguntamos se concorda com o fim daquela forma de dar donativos à igreja. Quem também tem pena de não poder pregar a sua oferta na imagem de Nossa Senhora do Castelo é Ana Maria Costa. Devota da padroeira de Coruche que, diz, lhe tem valido muito em momentos de grande aflição, lembra-se quando a imagem percorria as ruas da vila coberta de notas da cabeça aos pés. “A procissão era mais bonita. Tinha mais colorido, mas são as regras da igreja e temos que respeitá-las”, conforma-se.Em Samora Correia, domingo à tarde, nem todos os andores levavam dinheiro. E naqueles onde flutuavam notas ao sabor do vento elas eram poucas. Nossa Senhora da Oliveira ou Nossa Senhora de Alcamé, protectora de lavradores e campinos, não levariam mais de 100 euros cada. Uma situação bem diferente dos tempos em que passavam nas ruas aos ombros dos fiéis cobertas de dinheiro dos pés à cabeça. A colocação de notas nas imagens é um dos rituais dos crentes que mais desagrada à igreja católica. As hierarquias têm insistido junto dos párocos para que tentem evitar tal situação

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