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A pintora que divide o tempo entre aprender e partilhar

A pintora que divide o tempo entre aprender e partilhar

Tanya Cravo pinta o abstracto e fotografa o concreto

É no acto de partilha que Tanya Cravo se sente “em casa” como artista. A pintora partilha conhecimentos com o público na área da iniciação à pintura e prepara uma tese de mestrado que mescla o que mais gosta de fazer – a pintura – com a sua área de trabalho - o património. Nas telas a inquietação com o mundo que nos rodeia fala mais alto e as exposições sucedem-se pelo país.

A tela encontra-se tingida de vermelho e, à volta do desenho, um auto-retrato de quando era criança, rostos do pai, da mãe e da avó. Também em redor da imagem há espelhos. O quadro, de Tanya Cravo, pintora de 26 anos, residente em À-de-Freire, freguesia de São João dos Montes, concelho de Vila Franca de Xira, é um de dois que evocam a vida da jovem e a memória da mãe, já falecida, que também retrata nos seus trabalhos e a quem durante anos foi buscar entusiasmo e inspiração. Outros, abstractos, lembram paisagens e figuras humanas em alto contraste cromático. “Gosto de pintar aquilo que sinto. Talvez por isso tenha alguma dificuldade em vender”, conta a artista. Mas não se importa. É fora dos circuitos comerciais que lhe têm surgido alguns dos convites mais interessantes, como a participação num livro sobre vários pintores portugueses (ver caixa). E é fruto das propostas que tem enviado que conta com participações, desde 2007 (antes de se formar em arte plásticas na Escola Superior Arte e Design das Caldas da Rainha), na Bienal Internacional de Arte Contemporânea de Porto Santo (Madeira), no Panteão Nacional, em Lisboa, e em exposições nas Caldas da Rainha e em Ponte de Sôr. “Tento enviar trabalhos para locais onde sei que posso estar, mas também para outros onde, mesmo não podendo fisicamente, sei que os trabalhos ficarão em boas condições”, conta. A artista prepara-se ainda para participar na Bienal de Coruche. E tenta aprender com cada uma das experiências. “Gosto de deixar o espectador questionar-se com o que faço, em alguns trabalhos, e não colo título. Mas há outros que só resultam se ele “viver” o trabalho e tiver a sensação que quero que experimente”, conta. Para aferir a artista não hesita e nas exposições observa, disfarçadamente, as reacções às suas obras enquanto parece mirar os trabalhos de outros autores. “Às vezes faço perguntas sobre o que pensam dos trabalhos, como se fosse outra espectadora”, revela. Nas telas o género abstracto ainda domina o trabalho de Tanya. Durante o ensino superior um “braço-de-ferro” artístico com uma professora amante do naturalismo, Fernanda Maio, acabou por a lançar com convicção nas manchas e formas, remetendo as representações da natureza para a fotografia. “Até que numa exposição sobre os avieiros, no Celeiro da Patriarcal, em Vila Franca de Xira, vi uma fotografia de uma embarcação, com o rio Tejo e a ponte em pano de fundo e senti que devia guardá-la de alguma forma. Tirei-lhe um foto com telemóvel e pintei a paisagem de modo a que parecesse, também ela, uma fotografia”, relata. A partir daí, a pintura passou a compreender também experiências no campo figurativo. “Em muitos trabalhos abstractos uso a figura do auto-retrato em alto contraste. Noutros faço experiências com formas reais em alto contraste”, revela. Os dois projectos de homenagem à mãe ocupam um lugar especial no seu trabalho. “Era alguém que me dava muita força e energia”, nota. A influência de professores e da formação sempre existiu no trabalho de Tanya Cravo, mas em diferentes medidas. Aos 13 anos, o exemplo de uma professora da disciplina de educação tecnológica, Maria Luísa, da Escola EB2, 3 Soeiro Pereira Gomes, em São João dos Montes. “Dava as aulas com tal paixão e energia que decidi que teria de ser como ela”, recorda. No ensino secundário, na Escola Infante D. Pedro, em Alverca, Alexandra Moraleja: “Deu força numa fase em estive quase para desistir”. No ensino superior, nas Caldas, Isabel Barahona, “fez ver que podia ir mais longe” e Fernanda Maio, levou-a a “questionar-me se realmente teria nascido para a arte”. A resposta tem sido dada pela jovem pintora nos trabalhos que realiza nos tempos livres. O convite para a formação de crianças e adultos, no Centro Cultural do Bom Sucesso (a primeira terminou a 11 de Setembro, a outra arranca em Outubro) foi também um estímulo. “Entrei com muitas expectativas e dúvidas e saí satisfeita. Eles brincaram, divertiram-se e aprenderam”, relata a O MIRANTE. O curso não foi primeira experiência de Tanya. A pintora, de 26 anos já tinha dado formação antes de ir para faculdade a alunos de famílias problemáticas numa escola básica de Alverca. Em paralelo a pintora quer apostar na formação e vai realizar um mestrado na área do património com uma tese dedicada ao espólio da Misericórdia de Alverca do qual fazem parte inúmeras pinturas. O trabalho que Tanya Cravo desenvolve como assistente técnica do Núcleo Museológico de Alverca também contribuiu para esta última vertente de estudo. Sobre a arte em geral, e perante a ausência de muitos cidadãos das galerias e museus, argumentando “nada perceberem de arte”, Tanya Cravo, tem resposta pronta. “Não é preciso perceber a arte. É preciso sentir que se gosta ou não de determinada obra”, contrapõe. E oferece-se como exemplo. “Já vi a obra “Guernica”, de Picasso, e apesar de reconhecer estar bem feita não me agrada esteticamente. Por outro lado, durante algum tempo, não apreciava nem percebia o trabalho de uma artista mexicana, Frida Kahlo. Depois vi um filme sobre a sua vida e tudo passou a fazer sentido e sou fã do seu trabalho”.Sobre a arte em geral, e perante a ausência de muitos cidadãos das galerias e museus, argumentando “nada perceberem de arte”, Tanya Cravo, tem resposta pronta. “Não é preciso perceber a arte. É preciso sentir que se gosta ou não de determinada obra”..Um livro e vários convites O convite surgiu sob a forma de uma mensagem de e-mail, no início do Verão. Ernesto Coelho Silva, artista plástico, queria editar um livro sobre pintores de vários pontos do país e depois de ver a obra de Tanya no seu site, lançou a proposta. “Fiquei satisfeita e surpreendida. O livro saiu a 25 de Julho e no dia 27 tinha no meu e-mail vários convites para feiras internacionais de arte, em Espanha e Itália. “Entrei em pânico! Não esperava nada daquilo”, exclama entre sorrisos “Depois de respirar fundo, acalmei e vou ter mais atenção aos próximos convites, tentando inscrever-me”, conta. O preço das inscrições para as galerias, por causa dos seguros e expedição de obras, é que complica tudo. “No último regulamento que vi a inscrição era de 290 euros. É muito...”, nota. Mãe sempre presenteA figura da mãe de Tanya Cravo é parte integrante da sua obra. Tendo falecido em 2008, deixa na artista a marca da inspiração e da saudade. A obra reflectiu a sua presença. “Um dos projectos que lhe dediquei foi “Os caminhos de Atman”, (divindade indiana), mostra os caminhos da vida quando somos um, e estamos bem connosco próprios, e depois como ficamos fragmentados quando erramos ou perdemos parte de nós”. A aprovação e o gosto de quem a viu nascer marcam fortemente os seus trabalhos.
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