Helena Costa recebeu convite para treinar selecção do Qatar
Os amigos até lhe chamam o “Mourinho de Saias”
Tem o Nível III de treinadora e um currículo invejável. Helena Costa está há 12 anos nas escolas de formação do Sport Lisboa e Benfica, já estagiou com o Chelsea de Mourinho e com o Rennes de Boloni e é actualmente prospectora da equipa de futebol sénior masculina do Celtic de Glasgow. Recentemente recebeu um convite para treinar a selecção de futebol feminina do Qatar.
Helena Costa tem um currículo invejável como treinadora. Aos 31 anos a alhandrense já conquistou aquilo que muitos treinadores não conseguiram e por isso chamam-lhe por brincadeira o “Mourinho de Saias”. Tem o Nível III de treinadores, estagiou no Chelsea com José Mourinho e também no Rennes com Lazlo Boloni, actualmente é treinadora nas escolas de formação do Sport Lisboa e Benfica e “olheira” da equipa de futebol sénior masculina do Celtic de Glasgow e recebeu recentemente um convite para treinar a selecção nacional feminina do Qatar.“Já estive no Qatar e de momento ainda não decidi se aceito ou não a proposta. Têm mais condições, infra-estruturas e apoios financeiros que Portugal mas de resto estão ao mesmo nível. Há muita coisa em jogo. A minha família e a situação profissional. Mas é uma proposta muito aliciante e talvez a concretização de um sonho”, confessa com um brilho nos olhos.A paixão pelo futebol começou cedo, ainda em criança, e sem qualquer tipo de influência familiar. “A minha brincadeira favorita era jogar à bola no pinhal. Mas não tive qualquer influência familiar. Pelo contrário, o meu pai não via jogos de futebol em casa, por isso eu tinha de ir para casa do vizinho para ver”, diz com um sorriso. A treinadora confessa que havia muito preconceito associado às raparigas que jogavam futebol e sublinha que infelizmente hoje em dia ainda há, mas diz que “as mentalidades têm mudado ligeiramente e sobretudo as pessoas têm de fazer aquilo que gostam. Foi isso mesmo que fez quando ingressou na licenciatura. “Sempre quis tirar Educação Física e no meu primeiro ano de licenciatura comecei a dar aulas de natação aqui no município, mas sempre com a expectativa de tirar uma especialização em futebol”, explica. A oportunidade surgiu no terceiro ano do curso da Faculdade de Motricidade Humana através de um protocolo com o Sport Lisboa e Benfica. “Lembro-me perfeitamente de me ligarem numa sexta-feira a dizer que eu tinha sido admitida para estágio no Benfica e eu tinha aulas de natação no sábado de manhã. Liguei logo ao meu patrão a dizer que ia desistir e que no sábado já não ia”, lembra.Helena Costa abdicou de tudo para enveredar pelo futebol e neste momento já lá vão 12 anos como treinadora nas escolas de futebol do Sport Lisboa e Benfica. Confessa que nunca tinha havido uma mulher no lugar que desempenha.Pelo meio teve também uma experiência como treinadora de uma equipa de futebol sénior masculina. Foi há quatro épocas atrás, quando recebeu o convite para treinar no Cheleirense (Mafra) e abraçou o desafio de peito aberto. “É um meio muito mais pequeno do que Alhandra. É uma aldeia em que a mulher ainda tem um papel muito submisso e sei que mudei a mentalidade em Cheleiros”, diz com orgulho. A treinadora lembra que foi acolhida com curiosidade e até algum receio mas sublinha que “o primeiro treino é fundamental para passar uma imagem e tudo correu bem a partir daí”. Depois, foi despedida ironicamente por “falta de resultados” quando a equipa se encontrava no primeiro lugar da tabela do campeonato distrital, mas confessa que não guarda mágoa e diz que já falou com o presidente do clube “que admitiu que não foi uma atitude correcta”. Treinou também duas equipas de futebol feminino, o 1º de Dezembro e o Odivelas, clubes com os quais se sagrou campeã. Chegou mesmo a levar o clube de Sintra por duas vezes à Liga dos Campeões mas acabou por abandonar a equipa ao fim de um ano de salários em atraso. É dessa altura que guarda um dos momentos mais frustrantes da carreira.“A qualidade das jogadoras era fantástica e por um triz não conseguimos atingir os nossos objectivos. Sofremos um golo a 4 minutos do fim e foi contra a corrente do jogo. Já tínhamos o pé na fase seguinte, o que era um momento histórico e foi pena. Ainda hoje quando olho para longe ,consigo ver a bola a entrar”, diz com tristeza.“Estagiei com Mourinho e com Boloni”Helena Costa teve o privilégio de estagiar com alguns dos mais reconhecidos treinadores a nível mundial. A experiência com José Mourinho surgiu depois de uma conversa no Estádio da Luz e que levou a treinadora portuguesa até Chelsea, onde esteve como observadora, há quatro anos atrás. “A minha ida coincidiu com a primeira derrota do Mourinho, por isso nem tudo correu muito bem, diz com um sorriso. Confessa que encontrou condições de trabalho muito acima das expectativas e ficou fascinada principalmente com o futebol jovem do clube. “Cheguei a um campo de estágios que tinha 23 campos relvados de futebol 11, mais os campos para os três guarda-redes. Foi também a primeira vez que vi um campo coberto de futebol 11 onde as raparigas treinavam à noite”, sublinha. Passou depois por outra experiência idêntica no Rennes de Lazlo Boloni, onde encontrou também o adjunto português Rolão Preto, com quem tirou o mestrado. “Foram experiências muito positivas e aprende-se sempre”, realça.Há muita qualidade em Portugal e muita matéria-primaApós vários anos a trabalhar com as camadas jovens, Helena Costa considera que há muita qualidade no futebol feminino em Portugal, mas falta prospecção e investimento.“Há muitas miúdas jovens por aí, mas não há muita oferta em termos de clubes e as atletas acabam por ir para o futsal, que agora está na moda. Mas há muitas atletas no futebol 11 que se tivessem um empurrão e alguém lhes desse um incentivo iriam progredir muito mais e retribuir depois em termos de resultados pela selecção nacional”, sublinha.A treinadora considera que a modalidade está a crescer, mas que falta existirem clubes de topo que apostem na modalidade ao nível do feminino para que o futebol se possa desenvolver. “Se equipas como o benfica, o sporting ou o Porto investissem no futebol 11 feminino era completamente diferente. Temos o exemplo do futsal do Benfica. Há uns anos ninguém ligava ao futsal. Assim que o Benfica criou uma equipa o panorama mudou. Não tenho dúvidas que é o que é necessário para esta modalidade explodir também, porque passava a ter projecção a nível da comunicação social”, frisa. “Tive um convite para ser prospectora do Celtic”Helena Costa iniciou o curso de treinadores na Escócia, mas mesmo assim foi com alguma surpresa que recebeu o convite do futebol sénior do Celtic de Glasgow para ser prospectora de jogadores, o que vulgarmente se chama “olheira”.“Fiquei muito surpreendida, mas foi a maior prova de que além fronteiras a competência não se mede pelo género. O clube disse-me que está muito satisfeito com o meu trabalho e tenho cem por cento de credibilidade para falar inclusivamente com presidentes da Premier League quando é altura de contratações”, refere com orgulho.Apesar das competências adquiridas e do reconhecimento a nível internacional, a treinadora confessa com tristeza que na Liga portuguesa os clubes ainda não estão preparados para ver uma mulher à frente da equipa. “É preciso acabar primeiro com os preconceitos. Existem pessoas do sexo feminino muito competentes, tal como as do sexo masculino”, alerta.Por isso mesmo, não hesita quando O MIRANTE lança o desafio e pergunta se aceitaria treinar uma equipa de topo, caso surgisse o convite. “Ser profissional de futebol para mim é um sonho, por isso é obvio que aceitaria e não precisava ir para o fim do mundo para treinar. Mas isso não vai acontecer tão rápido. Talvez os meus trisnetos”, diz entre risos. “
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