Casimiro Serra gosta de estar na linha da frente para o que der e vier
Depois de oito anos na protecção civil passou a “apagar fogos” no sector das feiras e mercados
É chefe de gabinete do vice-presidente da Câmara Municipal de Tomar. No dia-a-dia gosta de trabalhar ao lado dos funcionários e não liga a horários se há algo urgente para resolver. Em dias de festa, se não tem qualquer responsabilidade a seu cargo, afasta-se, discretamente.
Já foi responsável pela Protecção Civil de Tomar e agora é chefe de gabinete do vice-presidente, Carlos Carrão. Foi uma melhoria. Agora já não anda ao vento e à chuva? Eu não sou homem de gabinete, embora esta afirmação possa parecer contraditória num chefe de gabinete. Gosto de trabalhar junto dos funcionários. Tenho que estar solidário com eles até para ter a noção do que lhes custa fazer o trabalho. A maior parte das pessoas nem sabe exactamente quais são as minhas funções. Está em contacto com os funcionários e com a população. Como tem sido?A maior parte das vezes é uma boa experiência. E quando corre mal? Sou o primeiro a apanhar. Muitas vezes não sou culpado de nada mas como sou eu que dou a cara é comigo que as pessoas desabafam. Se têm que insultar o político que decidiu e não o encontram, descarregam em mim. Como é que lida com essas…descargas?Respiro fundo e tento colocar-me na pele das pessoas. A maior parte das vezes as pessoas desabafam e barafustam mas a seguir acalmam-se e tentam compreender as coisas. Uma vez por outra exageram e obstinam-se. Já recebi ameaças de morte e nem sempre aguentei. Certa vez levei uma pessoa a tribunal. Ela foi condenada mas recorreu. O caso já passou e nem quis receber nenhuma indemnização. Há muitos insultos que ignoro, faço de conta que não oiço. Na maior parte das vezes, eu já sou a parte final que visa o cumprimento de uma legalidade. Nasceu em Moçambique há 50 anos. Como é que veio parar a Tomar?Os meus pais mandaram-me para Tomar em 1973, com 13 anos, para vir estudar para o Colégio Nun’Álvares Pereira. Vim para ficar até tirar um curso superior, tal como acontecia com muitos outros. Quando se dá o 25 de Abril, a minha família regressa a Portugal e vem residir para Tomar. Eu continuei a estudar no colégio mais dois ou três anos. Em Moçambique era bom aluno mas no colégio conseguia ainda ter melhores notas. Fiquei até acabar o antigo 7.º ano. Entretanto, não segui para o ensino superior, por dificuldades financeiras. O meu pai tinha morrido em África, estava só com a minha mãe e comecei a trabalhar com 16 anos. Qual foi o seu primeiro emprego?Foi na empresa madeireira “Freitas Lopes” em Tomar. Numa primeira fase fazia caixas de empreitada. Quantas mais caixas fazia mais dinheiro ganhava. Numa segunda fase, o próprio Freitas Lopes, sócio principal da empresa, convidou-me a ficar e fiquei a trabalhar num sector que visava a inspecção e coordenação da madeira, uma vez que esta tinha que ser cortada com uma espessura rigorosa para ser exportada. Depois fui chamado para a tropa e quando regressei fui trabalhar, de noite, para a Azambuja, para a fábrica da “General Motors”, no sector de controlo e distribuição de material pela linha de montagem. Estive lá cerca de um ano. Depois trabalhei mais um ano num gabinete de desenho de arquitectura em Cascais. Mais tarde vim para os serviços municipalizados de Tomar. Assinei um contrato de três anos, havia a possibilidade de ficar, mas acabei por concorrer a um lugar de bancário na Caixa Geral de Depósitos.E como é que surge a sua ligação à Câmara de Tomar?Depois de vários anos a trabalhar como bancário, já casado e com as minhas filhas pequenas, estive três anos em Moçambique, a trabalhar na direcção de uma rádio. A partir do momento em que se tornou numa rádio partidária da RENAMO vim-me embora. Foi nessa altura que pensei em ingressar no ensino superior mas, entretanto, entrei para a Câmara em 1999. Fui convidado pelo então presidente da câmara, António Paiva, para ficar como assessor e trabalhar na protecção civil. Ressalvo que não sou funcionário da autarquia, tenho ficado por nomeação. Quem o conhece sabe que tem uma vida profissional muito intensa. A família compreende essa entrega?Há alturas em que quase não vejo a família. E, às vezes, nem lhes atendo o telemóvel. Porque as solicitações são tantas que não consigo. Há dias diabólicos. Olho para o contador de chamadas e são mais de cem. O telemóvel acaba por nos escravizar. Telemóvel à parte gosto de trabalhar com empenho e não ligo a horários. Gosto de me sentir útil e de ajudar a resolver os problemas das pessoas. Detesto aquela visão do funcionário que acha que o seu trabalho acaba quando o relógio marca a hora de saída. É funcionário da câmara?Não. Tenho sido reconduzido através de nomeações. O mercado foi encerrado. Não está a ser fácil gerir esta situação?O edifício do mercado estava a necessitar de obras profundas e urgentes. E não se pode fazer um investimento tão vultuoso em obras e ao mesmo tempo construir um novo edifício. Isso é esbanjar dinheiro. O que lamento é que nos últimos vinte anos não se tenham feito melhorias no mercado que poderiam ter evitado o seu encerramento. A decisão política que se tem que tomar agora é: ou se reconstrói aquele edifício ou se constrói um novo edifício a curto prazo. A tenda que está lá agora tinha que ter as condições correctas para funcionar como se fosse um edifício definitivo. Para que todas as questões fossem acauteladas, sem falha alguma.Na altura em que foi responsável pela protecção civil quais foram as situações mais graves que viveu? Lembro-me de um incêndio muito grande, num ano que não sei precisar, na freguesia de São Pedro em que, numa tarde, arderam várias casas. Orgulho-me de dizer que foi graças ao trabalho dos bombeiros, protecção civil, populares e da junta de freguesia da altura que se conseguiram salvar algumas casas. Também recordo outro incêndio na Pedreira que pôs em perigo algumas casas e algumas aldeias nos arredores. Mas a situação que eu recordo com maior drama para Tomar foram as inundações de 2000 que afectaram maioritariamente a população de etnia cigana que mora no Bairro do Flecheiro e os comerciantes e moradores da parte histórica da cidade. Foram três dias sem ir à cama. Tomar é a sua terra?Estou há 37 anos em Tomar e as minhas duas filhas nasceram cá. A minha esposa é da Sertã mas também se sente tomarense. É obvio que Tomar, como todas as terras, também tem as suas qualidades e os seus defeitos. Uma das coisas que não gosto em Tomar é o diz-que-diz, a intriga. Em Tomar, há em demasia intriga e magoa um bocadinho porque se fazem muitas acusações anónimas e infundadas. Custa muito pedir desculpa, mas fica tão bem. Aqui há tempo exaltei-me com um vendedor do mercado porque pensava que me vinha falar de um assunto que a mãe já me tinha colocado e quando me apercebi que me precipitei, assentei os pés e pedi-lhe desculpa meia dúzia de vezes.E as coisas boas de Tomar, quais são?A história de Tomar é extraordinária. É das cidades que conheço talvez a mais bonita. Tem tradições muito interessantes. O património, cultural e arquitectónico, é fabuloso. A feira de Santa Iria que dá muito trabalho a organizar é um evento muito interessante.E, este ano, pensa ir à Feira?Eu não gosto muito de confusões. Quando não tenho responsabilidades na Feira de Santa Iria e não tenho ninguém de família a visitar a cidade nessa altura, saio de Tomar. O mesmo acontece em relação à Festa dos Tabuleiros. Quando a confusão é grande, e se não tiver responsabilidades no evento, prefiro ausentar-me. Um apaixonado por África e pela história da Guerra ColonialMilitante da JSD desde os 16 anos, Casimiro Serra, nasceu em Lourenço Marques (actual Maputo), Moçambique, a 2 de Fevereiro de 1960. Com treze anos veio estudar para o Colégio Nun’Álvares Pereira (CNA), em Tomar e acabou por ficar na cidade. Casou e teve duas filhas, actualmente com 20 e 23 anos. Foi presidente da concelhia da JSD durante vários mandatos, da distrital da JSD e candidato a deputado nas eleições intercalares de 1979 pela Aliança Democrática. Foi o deputado mais novo com assento na assembleia municipal de Tomar, tomando posse com 19 anos. Acumulou várias experiências profissionais, chegou a frequentar o 2.º ano de Direito, na Universidade Clássica de Lisboa, mas as obrigações profissionais e familiares levaram a que não concluísse a licenciatura. Em 1999 chega à Câmara Municipal de Tomar, a convite do então presidente da autarquia, o social-democrata António Paiva para coordenar a Protecção Civil. Desde então, já “correu” quase todos os sectores da autarquia e, embora ainda seja conhecido por muitos como o homem forte da protecção civil de Tomar, onde esteve oito anos, actualmente está a trabalhar como secretário do vereador Carlos Carrão, trabalhando, com os sectores de Higiene e Limpeza e Feiras e Mercados. Uma área que, nos últimos meses, está a ser particularmente difícil de gerir com o encerramento do edifício do mercado diário pela ASAE e a posterior montagem de uma tenda para albergar os feirantes, que ele garante estar a poucos dias de abrir. “É esgotante, ainda não fui de férias este ano”, confessa. O pouco tempo livre que tem dedica-o ao seu passatempo preferido. Coleccionar objectos e livros relacionados com África e com a Guerra Colonial, contando já para cima de seis mil livros sobre África, entre revistas, postais e fotografias. Um dos seus projectos pessoais, apoiado por amigos, passa por escrever um livro que faça uma cronologia da guerra colonial.
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