A educadora do ensino especial
Anabela Alho trabalha em Fátima e afirma que nunca trocaria de profissão
O seu trabalho é procurar que os alunos ganhem autonomia em áreas como a higiene, a alimentação, o vestuário, a linguagem ou mesmo a nível de comportamentos.
Há quase 20 anos que trabalha como educadora de infância no ensino especial. Anabela Amaro Alho tem 49 anos, vive em Atouguia, Ourém, e afirma que nunca trocaria de profissão, ainda que as actuais reformas do Governo lhe indiquem que terá que voltar ao ensino regular. Toda a sua vida foi dedicada às crianças e refere que se sente realizada profissionalmente.Anabela Amaro Alho comenta que sempre teve o sonho de trabalhar com os mais novos. Após concluir o 7º ano andou um pouco parada, trabalhou em algumas lojas de Fátima, fez o ano propedêutico, até que se decidiu a concorrer para o ensino superior. Refere que 1981 acabou por ser um ano complicado, pois tudo a que concorreu foi aceite, até num banco. “Em Setembro entrei para educadora de infância nas Caldas da Rainha e só em Dezembro fui colocada na faculdade em Geografia. Já não desisti. Estava a gostar de educação de infância e não estou arrependida de ter feito essa opção”. Casou no fim do primeiro ano de curso e após terminada a formação conseguiu estagiar no Jardim de Infância de Atouguia, que então abria. Nos oito anos seguintes foi passando por várias instituições públicas que então iniciavam funções, tendo trabalhado em Alburitel, Cercal, Sobral e Vilar dos Prazeres, todas localidades do concelho de Ourém. “Adoro trabalhar em aldeias, trago muito boas recordações. Os ambientes são mais pequenos, as pessoas recebem-nos melhor, pelo menos naquele tempo. Conhecíamos toda a gente, as pessoas vinham à rua”. Há 19 anos teve a oportunidade de ir trabalhar para o Centro de Recuperação Infantil de Fátima (CRIF) e aí permaneceu. “Para mim era um desafio. Tenho uma irmã com um atraso mental acentuado e tinha curiosidade em saber como era lidar com aquelas crianças”, explica.Na prática, a função revelou-se muito mais difícil do que imaginou à partida, mas adaptou-se. “Foi muito complicado emocionalmente. Era uma realidade que eu desconhecia”. Por vezes questionava-se: “mas onde é que está esta gente?”, pois no dia-a-dia não se encontra com facilidade pessoas com deficiência. “Foi complicado ver o seu sofrimento”. “Há aquele sentimento de que enquanto professores estamos preparados para lhes dar o estímulo necessário para aprenderem. Ali não é isso o mais importante, porque as dificuldades são imensas”, afirma. “O mais importante são as relações, as aquisições em temos de autonomia, evolução pessoal. Eu fui para aquela escola a pensar que podia ensinar da mesma forma e tive que descer ao nível deles”. Uma escola de afectosActualmente trabalha com jovens entre os 12 e os 14 anos. Ao longo da sua vida profissional tem realizado várias formações e continua sempre à procura de mais especialização no ensino especial. Afirma que o mais difícil da sua profissão é muitas vezes lidar com os adultos e não tanto com as crianças. “É muito difícil, criam-se grandes conflitos, grandes problemas, complica-se muito a vida. Com as crianças é muito fácil”. “É muito bom trabalhar no ensino especial. É uma escola de afectos, as crianças dão-nos muito, venho de lá muito realizada”. Para os alunos é simplesmente a Bela, “a amiga dos beijos e dos abraços”.O sofrimento de muitos dos alunos e das famílias emociona-a, sobretudo quando vê crianças a perderem progressivamente a autonomia e a tornarem-se quase vegetais. “Crianças que vão para a minha sala a andar e a falar e de repente, por terem doenças terríveis, começam a decair”. O lado bom são as pequenas conquistas do dia-a-dia, o conseguir que as crianças falem ou peguem simplesmente num copo. “Isso é o mais importante e não aprender a escrever”. O seu trabalho é procurar que os alunos ganhem autonomia em áreas como a higiene, a alimentação, o vestuário, a linguagem ou mesmo a nível de comportamentos. Por isso vê com reticências as novas políticas do Governo de integração das crianças do ensino especial no ensino regular. “A política em termos de teoria é fantástica, mas na prática as escolas não estão preparadas. Tenho medo que com esta história da integração as famílias e as crianças saiam prejudicadas”. Comenta que as pessoas não têm verdadeira noção do que é uma professora do ensino especial e que o trabalho nem sempre é valorizado. “A maior parte desta população é vista como os coitadinhos. Mas não é assim, porque eles são felizes dentro das limitações deles, e é o que mais me cativa”.
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