Vergonha e falta de informação continua a matar mulheres com cancro da mama
Vila Franca de Xira tem muito a fazer ao nível do rastreio, diz directora da unidade de oncologia
A vergonha e a falta de informação em relação ao cancro da mama continuam a fazer vítimas entre as mulheres, sobretudo as que pertencem a uma faixa etária mais avançada. A opinião é de Ana Alcazar, directora da unidade de oncologia e directora clínica do Hospital de Reynaldo dos Santos em Vila Franca de Xira, onde são registados cerca de 60 casos por ano.
Os casos de cancro da mama detectados no Hospital de Reynaldo dos Santos, em Vila Franca de Xira, têm registado um crescimento “pouco expressivo” – cerca de 60 casos por ano – face à média nacional. A informação foi avançada a O MIRANTE por Ana Alcazar, directora da unidade de oncologia do hospital.“A incidência a nível nacional tem vindo a crescer e vai crescendo com a idade dos pacientes mas os nossos números, aqui em Vila Franca de Xira, estão estabilizados”, explicou a responsável na tarde de quinta-feira, 17 de Março, dia em que mais de meia centena de doentes da unidade oncológica do hospital participaram num “chá de primavera”, pretexto para um encontro, troca de experiências e lançamento de balões que levaram muito alto os desejos de cada paciente.Ana Alcazar considera que a vergonha e o preconceito das mulheres face à doença continuam a ser responsáveis pela elevada mortalidade que esta ainda representa – cerca de 1800 mortes por ano, segundo a Liga Portuguesa contra o Cancro (LPCC).“Destes 60 doentes por ano temos desde aqueles que estão numa fase muito inicial da doença até outros que aparecem já em fase muito avançada. Infelizmente vemos que cada vez mais estas não são doenças só da idade mas também aparecem em pessoas mais jovens. A diferença está na quantidade de informação que as mulheres mais novas têm”, afirma.Segundo a responsável é sobretudo para as mulheres mais velhas que a doença representa ainda um tabu. “Nas mulheres de grupos etários mais elevados ainda há muita vergonha, a tentativa de esconder, não querer mostrar e deixar avançar. O cancro muitas vezes começa com um nódulo, é silencioso em termos de sintomas, não dói e isso faz com que não tenha aquele alerta imediato de uma dor que incomoda e que faz a pessoa procurar o médico. Muitas vezes fica-se em casa à espera que passe”, lamenta Ana Alcazar.Em Vila Franca de Xira ainda há, segundo a responsável, muito por fazer ao nível do reforço da divulgação, acções de prevenção e criação de unidades de rastreio, que hoje não existem no Reynaldo dos Santos. “Aqui não temos nenhum desses programas mas em Lisboa e Santarém eles existem. Vila Franca de Xira não tem porque está muito próxima de Lisboa. Os médicos de família têm indicações sobre como fazer o despiste destas situações”, defende.No último dia nacional de prevenção do cancro da mama – 30 de Outubro – os especialistas lembraram que um diagnóstico precoce pode diminuir até 30 por cento a hipótese de mortalidade na doença. Por ano surgem, em todo o país, quatro mil novos casos de cancro da mama, segundo a LPCC.“Temos que ter muita coragem, força e fé”Em 1993, Virgínia Araújo, vilafranquense, descobriu que tinha um cancro na mama. Hoje com 80 anos fala da doença com a segurança de quem já fez imensos tratamentos para vencer a batalha pela vida. “O médico disse que era um caroço fibroso e tive de o tirar. Depois de algum tempo geraram-se novos gânglios na cova do meu braço o que exigiu uma nova intervenção, com radioterapia e quimioterapia”, relata. Com a voz embargada garante que a doença não pode derrubar a força de vontade. “É preciso muita fé e muita coragem. A vergonha é um problema, as pessoas encolhem-se e não conseguem dar conta do recado. O meu conselho é que vão ao médico, tenham muita coragem e que pensem que têm de resolver o problema”, alerta. A primeira doente da unidade oncológica de Vila Franca de XiraChama-se Otília Ferreira, vive em Arruda dos Vinhos, tem 67 anos e foi a primeira doente da unidade oncológica do Hospital Reynaldo dos Santos em Vila Franca de Xira. Detectou um “caroço” no peito em 1994 e desde esse dia ficou a saber que tinha cancro na mama. “Fui ao médico de família que por sua vez me mandou para cá para que pudesse fazer outros exames e remover o tumor”, conta. Já fez quimioterapia, perdeu o cabelo e diz que “com muita força” conseguiu vencer a batalha. “Depois, infelizmente, tive outros problemas, de coração e um acidente vascular cerebral (AVC)”, lamenta.“A espada está sobre a minha cabeça”No dia em que se realizou o “Chá de Primavera” da unidade oncológica do Hospital de Vila Franca de Xira, Maria Augusta celebrou o 67º aniversário. Esta vilafranquense já convive com a doença há dois anos. “Foi detectada através de uns exames de rotina. Não fui eu que descobri o que se passava. O médico mandou fazer uns exames, estava na altura e descobriu-se”, conta. “A espada está sobre a minha cabeça mas quando ela cai eu não sei”, diz. É por isso que opta por viver um dia de cada vez. Uns são melhores, outros piores. “No início ouvimos e nem queremos acreditar nem falar com ninguém sobre isso. É muito complicado”, refere. Maria Augusta alerta outras mulheres para que não se descuidem com os exames periódicos porque, sobretudo no que diz respeito ao cancro da mama, “é um problema que não aparece só aos outros”.
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