“A Câmara de Vila Franca de Xira deixou de apostar na continuidade dos eventos culturais”
Carlos Coutinho lançou duas peças de teatro reunidas num único livro
O antigo vereador da CDU na Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Carlos Coutinho, acaba de publicar um único livro com duas peças de teatro que estavam guardadas na gaveta há mais de três décadas. Já não se dedica à criação literária e ocupa o tempo livre com a leitura e a política. É actualmente deputado municipal. Lamenta que a autarquia não aposte numa linha de fomento cultural.
Carlos Coutinho, deputado da CDU na Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira, acaba de publicar um livro com duas peças de teatro – “O Depoimento da Família Martins seguido de Homem Certo em Casa Certa”, com a chancela da Fonte da Palavra. À conversa com O MIRANTE sobre a nova obra, centrada no período do Verão Quente de 1975, o antigo vereador da CDU aproveitou para criticar a política cultural seguida pela autarquia. “A Câmara Municipal de Vila Franca de Xira foca-se muito no evento e secundariza um processo contínuo de facultar o fruir da cultura. Ao abandonar uma linha de fomento cultural com uma certa continuidade abdica de fidelizar os munícipes ao fenómeno cultural”, apontou. O escritor considera que o elevado preço dos eventos culturais conduz a uma “qualidade irregular” e a uma frequência cada vez menor. “Há quanto tempo não temos música clássica neste concelho?”, pergunta. As duas peças de teatro reunidas num único livro foram escritas em finais da década de 70. “O Depoimento da Família Martins” decorre em 1975, um ano de importantes mutações de natureza sócio-política em Portugal. Os conflitos que estavam a ocorrer na sociedade encontram na família Martins um paralelo. “Todos os membros se dividem, se confrontam uns com os outros, percorrem destinos individuais diferenciados e se colocarmos aí uma lupa podemos ver o país a vivenciar um processo semelhante”. Em “Homem Certo em Casa Certa” deparamo-nos com uma mulher que tem uma vida insuportável, vai sendo encurralada e chega a um determinado momento em que tem de optar por matar ou morrer. Da pulsão pela criação literária que cedo sentiu, Carlos Coutinho rapidamente começou por escrever peças de teatro porque estava familiarizado com a linguagem criativa da dramaturgia. “O meu pai era um actor amador de teatro e cresci a vê-lo a decorar os textos em casa”, recorda. Escritas há mais de 30 anos as duas peças só viram agora acidentalmente a edição. “O editor descobriu num apontamento que eu tinha estas peças inéditas e veio ao meu encontro. Perguntei-lhe se queria deitar dinheiro fora, ele respondeu que sim e então decidi publicar”, recorda o escritor que jamais seria capaz de se dirigir a um editor para publicar os seus livros. “Não admito que um fabricante de materiais indiferenciado possa ser o juíz dos meus livros e também não admito que as regras comerciais possam ditar as regras à criação cultural”, aponta. Neste momento considera-se um ex-jornalista, ex-escritor e dentro de pouco tempo ex-autarca. Hoje já não sente a compulsão interior da escrita, o que o deixa tranquilo. “Por um lado tenho pena, mas por outro liberta-me para escrever outras coisas e ler”, remata. Para o teatro Carlos Coutinho escreveu “O Herbicida” (1974), “A última semana antes da festa” (1974), “Teatro de Circunstância”, cinco peças em um acto (1976), “A Estratégica do Cinismo” e “O jantar do comissário” (1977). Escreveu também novelas: “Uma noite na guerra” (1978), “O que agora me inquieta” (1985) e “Os duros dias” (2001). Escreveu ainda “Recordações da Casa dos Mortos” (1976) e “No país da Alegria” (1976).Luiz Francisco Rebello apresentou o livro no Museu do Neo-Realismo Luiz Francisco Rebello esteve no auditório do Museu do Neo-Realismo, no sábado, 9 de Abril, para apresentar o último livro de Carlos Coutinho com duas peças de teatro - “O Depoimento da Família Martins seguido de Homem Certo em Casa Certa”.Perante uma sala meio cheia o ex-presidente da Sociedade Portuguesa de Autores e um dos maiores autores de teatro teceu rasgados elogios à obra de Carlos Coutinho. “Em Portugal os grupos de teatro representam muito pouco os autores portugueses”, criticou Francisco Rebello, numa altura em que já se tinha ouvido na sala o lamento pelo facto das obras de Carlos Coutinho serem pouco representadas. “Ainda há pouco tempo o Teatro Nacional escolheu uma das minhas peças para ser encenada e depois de tudo preparado acabaram por desistir sem darem cavaco” lamentou-se. O livro, editado pela Fonte da Palavra, contou com o apoio da Cooperativa Alves Redol.
Mais Notícias
A carregar...