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Quantificação de risco cardiovascular e arrítmico

Opinião

Vítor Paulo Baltazar MartinsMedico Cardiologista e ArritmologistaClinica do Coração Santarém

As principais causas de morte em Portugal são o acidente vascular cerebral (AVC) e o enfarte agudo do miocárdio (EAM) e na sua génese está sobretudo a hipertensão arterial.A presença de três factores de risco cardiovascular major (tabaco, hipertensão arterial e hipercolesterolémia ) está associado a uma redução de 10 anos da esperança de vida aos 50 anos (estudo Whitehall). Na medida em que são factores de risco modificáveis, a nossa atitude não pode ser meramente expectante. A prevalência da hipertensão arterial em Portugal é de 42,6% segundo estudo recente de 2008.Menos de 50% dos hipertensos estão controlados apesar de estarem medicados. Esta percepção nem sempre é sentida quer pelo médico, quer pelo doente.Hoje, através de associações farmacológicas fixas é possível utilizar fármacos com doses mais baixas, com menos efeitos colaterais mas com eficácia muito superior. No entanto, deve ser recordado que os medicamentos antihipertensores não são todos iguais. O medicamento mais barato nem sempre é sinónimo de potência semelhante. O papel do médico especialista é crucial no diagnóstico, no aconselhamento e acompanhamento clínico. A prática regular de exercício físico ligeiro a moderado é uma opção não farmacológica na redução do risco cardiovascular e da pressão arterial. Uma única sessão de exercício físico pode ser responsável por uma redução de 6 a 8 mmHg da pressão arterial sistólica e diastólica. No entanto, a prática de exercício não é isenta de complicações, sendo estas tanto maiores quanto for a idade, o número de factores de risco, a presença de complicações de órgão alvo ou doença cardiovascular confirmada. Em 75% dos casos de morte súbita após exercício físico com idades acima dos 35 anos foi identificada doença coronária anteriormente não diagnosticada. A medição da pressão arterial, a prova de esforço e a ecocardiografia são mandatórias nestas circunstâncias previamente a qualquer programa de actividade física.A morte súbita (MS) pode aparecer em indivíduos sãos como em portadores de doença cardíaca. É uma morte que ocorre uma hora após o início dos sintomas. É incrivelmente uma entidade ainda não codificada nas certidões de óbito. Em jovens e adultos, a maioria dos casos está relacionada com doenças cardíacas que podem ser de etiologia congénita (desde o nascimento), infecciosa, tóxica, arrítmica ou isquémica. Esta última situação decorre de processos de aterosclerose gradual e progressiva relacionada com a idade mas também com o nosso estilo de vida. Mas, na maioria dos casos, a MS é provocada por uma arritmia que é o epílogo de uma soma de factores.Medicamentos naturais (dietas de emagrecimento), que actuam no sistema nervoso central (antidepressivos), cardiovasculares (antiarrítmicos e outros), descongestionantes nasais ou tóxicos (cocaína, ectasy) podem provocar arritmias que podem levar à morte. A fibrilhação auricular afecta cerca de duzentas mil pessoas em Portugal. Trata-se da arritmia mais prevalente sabendo-se que o risco de AVC duplica na ausência de tratamento. No entanto, segundo dados nacionais, apenas 62% dos indivíduos estão diagnosticados e destes 74% não faz qualquer tipo de tratamento (Estudo FAMA 2010). A anticoagulação oral reverte parte significativa deste risco desde que realizada em condições adequadas. O lançamento a curto prazo de novos fármacos obviando o controlo analítico apertado vai permitir tratar mais doentes e com maior segurança.Pacemakers e desfibrilhadores implantáveis são dispositivos utilizados no tratamento de arritmias, que permitem salvar vidas e dar uma nova esperança a um número significativo de doentes. Além do tratamento das bradiarritmias e da evitação da morte súbita, a evolução tecnológica veio contemplar a monitorização em ambulatório e consequente conhecimento antecipado, de situações de elevada gravidade. Em tempo de crise, apesar das restrições orçamentais, a não realização de análises de rotina anuais e alguns testes diagnósticos após os 40 anos em sedentários ou em praticantes de actividade física regular ou mesmo mais cedo em situações particulares, pode ter consequências dramáticas nos nossos indicadores de saúde a médio prazo.Como a legislação já obriga a determinados empregadores a realização de avaliações periódicas a nível da Medicina do Trabalho, peça ao seu médico esse cuidado independentemente de estar ou não no activo.A prevenção em saúde, apesar de ter um custo inicial, tem um impacto económico e social a médio e longo prazo extraordinário, objectivável em menor abstencionismo e menor utilização de recursos terapêuticos dispendiosos. Em conclusão, a quantificação do risco cardiovascular e arrítmico e execução de medidas de âmbito organizacional, diagnóstico e terapêutico é crucial em qualquer estratégia de saúde. Esquecer esta realidade é hipotecar os nossos indicadores e o nosso futuro.

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