António Chora Barroso despediu-se do futebol ao fim de quarenta anos
Nos últimos treze anos foi massagista e “pai” dos jogadores do Monsanto
Entrou para o futebol há quarenta anos, primeiro como jogador depois como dirigente e massagista. Os últimos treze anos passou-os no Grupo Desportivo e Recreativo de Monsanto. António Chora Barroso, natural de Riachos, diz que o segredo para a ligação tanto tempo ao clube tem a ver com a sua maneira de ser: “Sou amigo de toda agente”. Gosto sobretudo de ajudar a resolver os problemas e não gosto de os criar.
É massagista por acaso ou por convicção?Hoje sou massagista por convicção. Mas a minha carreira de massagista desportivo começou por acaso.Como assim?Há duas dezenas de anos convidaram-me para dirigente do Clube Atlético Riachense, aceitei, e passei a acompanhar as camadas jovens do clube. Como em quase todos os clubes do distrito não havia massagista eu próprio resolvi arranjar uma maleta com uns pensos, um frasco de álcool e mais alguns produtos para acudir a alguma pancada. E comecei a assistir os miúdos quando se lesionavam. Começou por necessidade e curiosidade sem qualquer curso?Sim, comecei para ajudar no possível os jovens a ultrapassarem a dor própria do momento. Não tinha então qualquer curso. Mas comecei a gostar do que fazia e resolvi avançar e no início tirei alguns cursos organizados pela Associação de Futebol de Santarém.Eram cursos muito simplificados que davam apenas para o primeiro apoio?Sim, eram cursos que nos davam algumas luzes sobre os problemas principalmente nos traumatismos. Mas eu não fiquei por esses cursos. Ao longo dos anos fui usando a internet para aceder a outros conteúdos e depois tirei um curso técnico de massagista já com alguma dimensão técnica. Foi um curso que decorreu no Porto e foi ministrado pela equipa médica do Futebol Clube do Porto, chefiada pelo médico Mário Bessa. Foi um curso já muito avançado que me deu conhecimentos para fazer parte de qualquer equipa de fisioterapia de qualquer clube.Passou a ser um massagista qualificado mas nunca deixou de exercer outras missões nos clubes por onde passou?Sim, passei a ter alguma qualificação, mas nunca abdiquei de pedir ajuda a amigos enfermeiros mais qualificados do que eu. Quando surgiam lesões mais graves, tive sempre o cuidado de encaminhar os jogadores para pessoas com mais possibilidades de os ajudar no tratamento. Nos clubes por onde passei fui sempre mais do que um massagista. No Monsanto, onde estive nos últimos 13 anos, cheguei a ser director desportivo. A minha intenção foi sempre a de ajudar os dirigentes e os jogadores. E no Riachense cheguei a ser treinador adjunto nos seniores.É claro que o trabalho de massagista era um complemento da sua vida profissional?Sim. Ser massagista foi e será sempre uma forma de ajudar as pessoas. Hoje estou reformado mas a minha vida profissional foi passada em Alverca, nas Oficinas Gerais de Material Aeronáutico. Qual foi a primeira equipa de seniores de que foi massagista?Curiosamente foi no Torres Novas. Na altura fui convidado pelo treinador Rui Oliveira para fazer parte da sua equipa como massagista e aceitei. Estive lá dois anos, que foram muito importantes para me ajudar a compreender a forma como devia lidar com os jogadores mais velhos. Depois surgiu o convite para o Monsanto onde estive até ao final desta época.Foi um longo “casamento”?Sim foi um longo “casamento”. Entrei com o Arsénio Fazenda, e na altura o clube estava na segunda divisão distrital. O projecto era de chegar à primeira divisão. Mas o clube embalou e foi subindo até à Segunda Divisão Nacional onde já esteve e voltou este ano. Estive lá estes anos todos porque me sentia em família.Encontrou algum clube bem apetrechado em termos de aparelhagem de recuperação?Não. Quem tinha o mínimo dos mínimos era o Torres Novas. No resto havia convenções com clínicas de fisioterapia que faziam as recuperações mais difíceis. Eu trabalhava mais com a imaginação e com as mãos. Tem cuidados especiais com as mãos?Nem por isso. Embora tenha sempre o cuidado de ao fazer um tratamento usar luvas.É natural de Riachos e o Riachense é uma referência. Mas o Monsanto é o clube que mais o marcou?Sem dúvida que sim. Estive lá muitos anos. Foi preciso resolver muitas situações, boas e más. Foi o clube que me levou a conviver com o clube do meu coração, o Benfica. Foi uma parte da minha vida ligada ao futebol maravilhosa, porque também me ajudou a conviver e a ganhar a amizade de médicos e massagistas.Foi mais uma forma de actualização?Sim foi. Mas eu nunca descurei a parte de actualização. E como tenho uma clínica médica tenho uma grande ligação a médicos e fisioterapeutas especializados. Trouxe muitos jogadores para serem vistos por ortopedistas aqui na clínica.Afinal era mais do que um simples massagista?Sim. Nunca tive problemas com qualquer pessoa. No Monsanto que tem vários jogadores estrangeiros era considerado por eles quase como um pai. E na verdade eu tratava-os quase como se trata um filho.“Nunca esquecerei a lesão do Jamerson”Há alguma lesão que o tenha marcado?Há. Nunca esquecerei a lesão do Jamerson.Porquê?Num jogo com o União da Serra, uma equipa que tem uma grande ligação ao Monsanto, na disputa de um lance mais viril o Jamerson levou um pontapé na cabeça, perdeu os sentidos, já estava a dobrar a língua. Estava mesmo mal. Eu estava no outro lado campo, o meu colega do União, o Hugo Serra, apercebeu-se da gravidade da lesão e entrou logo em campo. Quando eu cheguei ele já estava a tentar recuperar o jogador. É um homem com larga experiência e foi importante para conseguirmos ajudar o jogador.Temeu uma tragédia?Sim, temi. Toda a gente chorava. Na altura toda a gente pensou que o Jamerson não voltava a si. Felizmente que as coisas evoluíram bem. Eu próprio vi o jogador a passar para o outro lado. Mesmo depois a caminho do hospital só pensava que ele não resistiria, felizmente tudo evoluiu no melhor sentido. E o Jamerson continuou a ser um bom jogador ao serviço do Monsanto. Mas assistiu a outras lesões graves?Sim. Só que na altura em que aconteceu e em campo, a lesão do Jamersom foi a mais impressionante. Tive outras graves, como as lesões do Nuno Martins e do Pedro Fazenda, mas foram roturas de ligamentos, que evoluíram para operações. Não foram tão traumáticas como a do Jamerson.É nesses momentos que se nota a falta de ambulâncias e equipamentos de socorro nos campos de futebol?Sem dúvida que sim. Sei que isso fica muito caro e os clubes não têm possibilidades de pagar, mas o próprio Governo devia ter isso em conta e deveria partir dele essa assistência. Na altura da lesão do Jamerson senti a falta do equipamento de socorro como nunca. A espera por uma ambulância para levar o jogador para o hospital foi angustiante.Festa de despedida com centena e meia de amigosPorquê agora a despedida do Monsanto e de massagista?Todos estes anos, 40 anos foram muito intensos. O trabalho, as viagens e agora a clínica ocupam-me muito tempo, por isso penso que chegou a altura de ter algum descanso e dar mais tempo à família. Foi isso que me levou à despedida.A abertura da clínica foi determinante para a despedida?Foi. Abri a clínica há um ano e é preciso agarrá-la para não ser surpreendido. Há muita coisa a tratar no dia a dia e eu quero ajudar as pessoas aqui na clínica, e para isso entendo que não tinha tempo para o futebol como é necessário.Foi a altura certa para sair?Penso que sim deixei muitos amigos no futebol. E a festa de despedida foi uma prova disso. Estiveram em Riachos mais de 150 pessoas que fizeram questão de me acompanhar na despedida e mostrar que são efectivamente meus amigos.Na festa de despedida fez questão de agradecer o apoio da família?Sim. A família foi o principal suporte para eu poder dedicar-me a outras áreas da vida fora do trabalho. Fiz teatro, dancei folclore e andei 40 anos no futebol. A minha família compreendeu sempre a minha ambição de ajudar os outros e nunca me faltou com o seu apoio.As pessoas de Riachos compreenderam a sua ligação ao Torres Novas e ao Monsanto?Sem dúvida que sim. Sou riachense, dei muito ao clube da minha terra, mantive sempre uma ligação forte. O ter passado pelo Torres Novas e pelo Monsanto em nada obstou a que as minhas amizades em Riachos esfriassem. Continuo a ser amigo da maioria dos riachenses e quero continuar a ajudá-los no que me for possível.A clínica que abriu em Riachos e que conta com um excelente corpo médico é também uma mais valia para a vila?Não tenho dúvidas que é uma mais valia para a vila de Riachos e também para a região. Quero que as pessoas da região vejam a clínica Chora Barroso como um local de ajuda aos seus problemas de saúde e também um lugar onde encontram amigos para os ajudar em todos os sentidos.Um homem com esta actividade toda é reconhecido, já foi convidado para a política?Já. Estive na Assembleia de Freguesia de Riachos. Não foi uma experiência para continuar. Tenho uma forma diferente de ver as coisas, os políticos deviam ser mais unidos na defesa das suas terras, não deviam estar sempre a pensar nos partidos. Se o convidassem de novo não aceitava?Não. Se aparecesse um grupo independente dos partidos para ajudar a resolver os problemas de Riachos ainda podia pensar duas vezes, mas partidariamente não.
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