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Um homem do desporto que raramente calça as sapatilhas

Carlos Coutinho é administrador da Desmor, empresa municipal de desporto de Rio Maior

Carlos Coutinho começou como técnico superior de desporto da Câmara de Alpiarça. O clima político que se vivia na altura no concelho e a vontade de progredir fê-lo procurar outras oportunidades. Foi trabalhar para a Câmara de Santarém em 2005 e chegou a director geral da empresa municipal Scalabisport. Após as eleições de 2009 foi convidado para administrador da empresa municipal Desmor que gere o complexo desportivo de Rio Maior. Diz que na vida as oportunidades surgem pelas aptidões que se vão mostrando. Nesta entrevista, o militante do PSD fala da política e do seu percurso profissional e diz que nunca pratica desporto nas instalações que tutela. Em casa de ferreiro espeto de pau.

Começou na política na JSD. Considera-se um político profissional?Nem pensar. Neste momento sou um militante de base do PSD, não tenho qualquer responsabilidade em qualquer estrutura do partido. Já tive alguns cargos no PSD, na concelhia de Alpiarça. Agora sou militante na concelhia de Santarém porque a minha residência é em Santarém. Porque não tem um papel activo na concelhia? Não quer desgastar a imagem ou não quer misturar a política com a função que exerce de administrador da empresa municipal Desmor?Não há nenhuma razão para estar afastado. Aliás, não é um afastamento profundo, até porque as pessoas que estão na concelhia de Santarém são muito próximas em termos de amizade e de ideias. Não tenho qualquer ambição em ter um cargo na estrutura do PSD, mas isso também pode acontecer.Ser militante de um partido como o PSD é um bom trampolim para se arranjar um bom emprego?No meu percurso profissional não sei se isso teve alguma importância. Às vezes as oportunidades surgem por aquilo que fazemos no nosso percurso. Se tivermos oportunidades para mostrar o que conseguimos fazer podemos ter sucesso. Há muitos que passam por juventudes partidárias e chegam a cargos importantes de decisão sem terem qualquer experiência profissional. Não gosto que as coisas aconteçam dessa forma, principalmente no meu partido. O novo Governo quer que haja uma avaliação curricular e de alguma forma dar valor à experiência profissional para a escolha de pessoas para cargos públicos. Isso é de valorizar. Foi um acaso ir trabalhar para a Câmara de Santarém e fazer parte da empresa de desporto Scalabisport e agora ser administrador da Desmor, precisamente em dois municípios do PSD? Não foi um acaso. Foi um conjunto de oportunidades que foram criadas. Em Santarém estive três anos a trabalhar na câmara e quando se fez a reestruturação da empresa municipal fui convidado para a integrar. Fui nomeado pelo conselho de administração como director geral. Saiu da Scalabisport porque o seu lugar estava em risco depois do vice-presidente Ramiro Matos, que o levou para a autarquia, se ter incompatibilizado com o presidente da autarquia, Moita Flores?Depois das eleições surgiu o convite da presidente da Câmara de Rio Maior, Isaura Morais, para fazer parte da administração da Desmor. Era um desafio completamente diferente. O facto de Rio Maior ter o único centro de preparação olímpica em Portugal dá outra dimensão. Nunca senti o meu lugar em risco na Scalabisport, nunca me convidaram a sair. A decisão de sair foi uma questão pessoal, de carreira, de desafio profissional. wJá podia ter sido candidato à Câmara de Alpiarça, vila onde residia e onde foi presidente da mesa da concelhia. Porque não avançou?Não era o momento. Para conseguirmos tomar uma decisão de nos candidatarmos e tentar pôr em prática as ideias que temos sobre a gestão de uma câmara têm de estar cumpridas algumas condições. As coisas acontecem quando têm que acontecer. Não quer dizer que não possa um dia ser candidato.Isso é se o concelho não vier a ser extinto.Não vejo como é que isso possa ser possível neste momento. Acho muito difícil. Apesar de considerar que o facto de Alpiarça estar entre o concelho da Chamusca, que é um dos maiores do país em termos de área, e o concelho de Almeirim, que registou nos últimos anos um grande desenvolvimento, colocou o concelho num beco sem saída em termos de crescimento. A CDU tem estado a gerir bem o município?Estou muito afastado da vida política e da gestão da Câmara de Alpiarça. Deveria estar mais atento, até porque sou funcionário dos quadros da autarquia e devia estar mais atento à minha progressão na carreira. Por me envolver demasiado nas minhas funções deixo a minha vida pessoal para trás. Mas por aquilo que ouço e leio parece que há algumas divisões internas na maioria e isso nunca permite a tranquilidade necessária para governar, ainda para mais nesta altura de crise. Quando decidiu ir para a Câmara de Santarém em regime de requisição foi porque o clima na câmara, na altura em que era presidente o socialista Rosa do Céu, era também bastante conturbado?Talvez. Não gosto de me sentir a mais nos sítios. Gosto de fazer parte da solução e não do problema. A determinada altura achei que seria bom para todos e principalmente para a minha progressão ter outras experiências profissionais. Comecei à procura e em Janeiro de 2005 fui para a delegação de Santarém do Instituto Português da Juventude. Mas não foi uma experiência aliciante. Regressei à câmara em Outubro, depois das eleições em que voltou a ganhar Rosa do Céu. Quando pouco tempo depois surgiu o convite para ir para a Câmara de Santarém não hesitei.A situação que se vivia na autarquia de Alpiarça, com denúncias de acessos a sites pedófilos nos computadores, ameaças ao presidente, o roubo do cofre, não devia ser fácil para os funcionários…Foi uma altura muito complicada em termos políticos. Toda a pressão política passava para o interior da câmara. Havia uma instabilidade e desconfiança de toda a gente. Não me sentia bem com isso. Por todas as organizações por onde passei nunca cultivei o clima de medo ou desconfiança. Como passei por isso entendo que ninguém deve passar pelo mesmo. É muito complicado para o PSD repetir o resultado de 2009 em SantarémO PSD em Santarém está um bocado apagado.Não considero. Até porque pela primeira vez foi eleito um deputado oriundo da concelhia, o Nuno Serra. O PSD vai ter facilidade em encontrar um sucessor de Moita Flores na Câmara de Santarém?Os desafios que hoje se colocam na administração local são de encontrar pessoas que consigam estar muito junto da população e que tenham sensibilidade para resolver pequenos problemas, porque os grandes vão ser impossíveis de resolver na situação em que o país está. Santarém precisa no futuro de um presidente que tenha a capacidade de perceber as coisas de outra forma, e não do querer anunciar grandes projectos e fazer grandes obras que depois se tornam pouco sustentáveis e vão onerar muito as contas do município. Esse foi um dos erros de Moita Flores? O de colocar as expectativas muito altas? O PSD nestes seis anos na Câmara de Santarém conseguiu fazer muita obra. Por exemplo, o saneamento básico estava numa taxa de cobertura muito baixa e conseguimos ter agora uma perspectiva de futuro nesta área. A política de capelinha, aquela de ter algo porque o vizinho também tem, cria hoje dificuldades enormes na gestão de equipamentos públicos. Porque se quis ter esses equipamentos sem se saber qual seria a rentabilidade deles. E esse foi um erro estratégico de todos os autarcas. Ainda não respondeu à pergunta sobre a sucessão de Moita Flores…Existem muitas soluções. Essa matéria cabe exclusivamente ao PSD e não sei se também ao presidente Moita Flores. O partido vai conseguir encontrar a melhor solução para continuar a governar a câmara. O actual número dois na autarquia, Ricardo Gonçalves, pode ser uma boa aposta?Penso que sim.Acredita que o PSD sem Moita Flores vai conseguir manter o eleitorado?Vai ser difícil porque o resultado das últimas eleições foi estrondoso, com o maior número de votos algumas vez alcançado pelo PSD em Santarém. Repetir um resultado como o de 2009 é muito complicado mesmo com uma recandidatura de Moita Flores. Isso também tem a ver com as polémicas e as dívidas que têm sido criadas durante a gestão de Moita Flores?Todos os partidos que são poder nas câmaras terão dificuldades. É difícil governar nas condições actuais e ainda mais quando não se previu que estas condições pudessem vir a acontecer. Jogos Olímpicos são uma oportunidade para afirmar o centro de estágios de Rio MaiorOs vereadores da oposição na Câmara de Rio Maior de vez em quando falam de uma gestão despesista na Desmor. Que comentário lhe merece essa consideração?Tem sido recorrente o que tenho dito sobre a gestão da empresa municipal. Há momentos em que para se crescer tem de se investir. Não teria sido possível a Desmor ter visto crescer a sua facturação de forma exponencial se não tivesse investido em muitas áreas e fundamentalmente nos recursos humanos. A facturação no primeiro semestre deste ano foi de 646.711 euros.Ou seja, venderam serviços nesse valor?Exactamente.Isso cobre as despesas. Quando se trata de empresas municipais que prestam um serviço público, obrigatório por aquilo que é também o nosso objecto social, não se consegue ficar de um momento para o outro sem dependência financeira. Há um contrato-programa com a câmara para cobrir o défice de exploração entre aquilo que são as receitas conseguidas pela exploração das instalações desportivas e do centro de estágio e aquilo que custa a manutenção destas instalações. O centro de estágio não é auto-suficiente em termos financeiros?O centro de estágio é. Não há nenhum valor no contrato-programa que seja para compensar défice de exploração dessa estrutura. As receitas do centro com estágios, dormidas e refeições são fundamentais para ser auto-suficiente e ajudam a Desmor a conseguir reduzir a dependência financeira para a gestão das outras instalações, como o estádio, pavilhões e piscinas. Os Jogos Olímpicos em Londres em 2012 são uma oportunidade para tentarem captar mais atletas estrangeiros?Obviamente. Toda a nossa actuação desde o ano passado tem sido nesse sentido. Percebemos que havia ali uma clara oportunidade de promoção do nosso complexo desportivo. A proximidade ao aeroporto de Lisboa e o facto de estarmos no mesmo fuso horário de Londres dá-nos uma capacidade em termos de procura dos países da América Latina, dos Estados Unidos, da Ásia. Neste momento já temos cerca de seis mil dormidas marcadas para 2012. Este complexo desportivo é estruturante para a afirmação do concelho de Rio Maior. Foi uma boa aposta política, dado o investimento brutal feito?Foi uma aposta no desporto também como negócio, com a criação de um factor diferenciador que é um complexo desportivo agregado a um centro de estágio que seja um motor do financiamento da gestão das instalações desportivas. Acho que foi inteligente a forma de ver isto.De que forma é rentabilizada a presença da Escola Superior de Desporto na cidade?A Desmor tem um protocolo com a escola, que não existia no passado, e somos de facto um parceiro activo até pelo que conseguimos fazer em termos destes projectos prolongados no tempo, como acontece com a equipa de triatlo brasileira. Isso dá possibilidade aos alunos e professores da escola de estudarem atletas de alto rendimento.E o que tira a Desmor desse protocolo?Tira a possibilidade de contratar serviços à escola, nomeadamente de psicologia, de nutrição, de avaliação da condição física, de análises laboratoriais a custos mais acessíveis. O que nos permite oferecer serviços mais diferenciados.Não é estranho que a denominada cidade do desporto não tenha uma equipa de futebol sénior?O desporto não é só futebol, mas de facto existe em Rio Maior um défice de desporto sénior e não só no futebol. O que me entristece mais nessa questão é não conseguirmos rentabilizar ao máximo as nossas instalações, designadamente o estádio. É uma lacuna do ponto de vista da gestão das instalações. Do ponto de vista desportivo e da própria dinâmica social do concelho foi mau a União Desportiva de Rio Maior acabar com a equipa sénior e o próprio clube ter suspendido a sua actividade.O futebol na região viveu muito acima das suas possibilidades?Esse foi o problema. Tudo isso tem a ver com a forma como as câmaras foram gerindo os apoios aos clubes. Havia uma excessiva dependência financeira, quando as câmaras deviam ter criado condições de excelência para a parte desportiva, reduzindo gradualmente o seu apoio financeiro. Em muitos casos isso não se verificou. Acredito que a breve prazo vamos ter em Rio Maior futebol sénior, até pelo crescimento do Núcleo Sportinguista, que tem feito um excelente trabalho na formação.A prática desportiva da população em Rio Maior corresponde às instalações que existem?Não existe nenhum estudo recente. Vamos querer fazê-lo porque acredito que o investimento municipal na promoção da actividade física fez com que o crescimento da taxa de participação desportiva tenha sido efectivo e seja superior à da média nacional. Mas acho que se pode fazer muito mais. Para isso contribuem os programas que a autarquia promove e que nós implementamos no concelho, alargados a mais franjas da população como os mais idosos e os mais novos.Tem de haver gestão partilhada de equipamentosA proliferação de equipamentos desportivos na região faz com que hoje muitos estejam subaproveitados.Devia ter-se entendido o investimento mais numa lógica complementar do que concorrencial. Porque se houvesse complementaridade aquilo que hoje oferecemos em Rio Maior em termos de negócio de venda de instalações desportivas podia ser mais diversificado quando fazemos promoção do nosso centro no estrangeiro. Um desportista de gabineteCarlos Coutinho nasceu no Hospital de Santarém em 2 de Março de 1975, mas viveu sempre em Alpiarça, de onde a sua família é oriunda, até se casar. Após dar o nó mudou-se para Santarém, onde reside actualmente. É pai de um casal.Licenciado em Ciências de Educação Física e Desporto pelo Instituto Superior de Ciências da Saúde, tem uma pós-graduação em Gestão do Desporto e encontra-se actualmente a tirar o mestrado. Mantém o lugar de técnico superior de desporto do quadro da Câmara Municipal de Alpiarça mas há uns anos que tem trabalhado para outras autarquias da região, sempre na área do desporto. Primeiro na empresa municipal de Santarém Scalabisport e há quase dois anos na empresa Desmor, em Rio Maior.Apesar de ter uma vida profissional ligada ao desporto não é na actualidade um assíduo praticante de actividade física. Embora no passado tenha sido um razoável jogador de andebol, que jogou em clubes de Almeirim e de Santarém até ao escalão sénior. Era ponta esquerda e distinguia-se pela sua rapidez. O último jogo que fez foi contra a selecção nacional de juniores.É frequentador habitual do Estádio da Luz, para ver os jogos do seu Benfica, mas curiosamente o último jogo de futebol que viu ao vivo foi o Sporting-Lazio para a Liga Europa. Isto se exceptuarmos o jogo que a selecção nacional de sub-21 fez recentemente em Rio Maior, cidade que já é uma espécie de casa das selecções de futebol mais jovens de Portugal.

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