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Miguel Relvas diz que se acabou o tempo da arrogância e que o país não fica mais rico com o discurso da ilusão

Miguel Relvas diz que se acabou o tempo da arrogância e que o país não fica mais rico com o discurso da ilusão

Para o Ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares o poder local é demasiado conservador e ainda não percebeu o que se passa

Assume as responsabilidades do que fez e que agora não faria mas não está preso ao passado. O seu compromisso é com o presente e com as mudanças que estão a ser feitas. Alerta os autarcas para o facto de ainda não se terem adaptado aos novos tempos e de estarem a cortar menos na despesa do que o próprio poder central. Garante a extinção de freguesias proposta e diz-se preparado para enfrentar e lutar contra todos os interesses instalados.

Já lá vai o tempo em que os autarcas eram o exemplo da aplicação dos dinheiros públicos? Os autarcas em Portugal, em matéria de visão de futuro, nunca foram capazes de serem ousados. Olham demasiado para a realidade do seu concelho. Se há sector conservador, é o poder local. As voltas que o mundo dá. Logo os autarcas que o senhor sempre elogiou. São conservadores na visão que estão a ter da nossa sociedade. Ainda não se convenceram que Portugal está numa situação particularmente difícil. Que Portugal esteve na bancarrota. Que tem que se fazer cortes. E não estão a fazê-los?As autarquias em Portugal estão a cortar menos que o Estado Central está a cortar. É uma realidade. Ainda não se adaptaram a este novo tempo. Nós chegámos ao fim da linha. Deixámo-nos encostar à parede. E temos que sair da circunstância em que estamos. Não podemos continuar a vender ilusões. O Governo tem tido a atitude de querer mudar. A maior parte das autarquias ainda não.O que tem que ser feito? Temos que estimular as capacidades intermunicipais. Não é preciso fazer a fusão de municípios ou extinguir municípios para que muitas das competências que estão nos municípios possam ser delegadas nas entidades supramunicipais ou nas Áreas Metropolitanas e o mesmo se passa com competências da administração central. Isso é possível mas há muito que se fala nisso e nada tem sido feito.Em Portugal é tudo impossível até ser feito. Tomar, Torres Novas e Abrantes, por exemplo, deviam ter uma perspectiva de gestão de uma grande cidade mas multiplicam equipamentos. Não são capazes de ter uma política global e de complementaridade. A multiplicação de investimentos que foi feita com fundos comunitários gera um enorme acréscimo de despesas com a sua manutenção.É a lógica eleitoral a funcionar. Enquanto cada autarca tiver que se preocupar com os votos dos seus eleitores, isso vai acontecer. Os eleitores pressionam para terem um pavilhão igual ou maior do que o do concelho vizinho. Já não vai acontecer com tanta facilidade. Sabe o que mudou? Acabou-se o dinheiro.Hoje as autarquias já não podem recorrer ao crédito. A banca não lhes empresta dinheiro. Os municípios têm que fazer uma gestão mais racional e não aumentar as suas dívidas.“A Associação de Freguesias deixou-se emparedar num discurso facilitista”Em Dezembro foi vaiado no congresso da Associação Nacional de Freguesias. Agora está a ser inundado com petições e moções de assembleias de freguesia contra a fusão e extinção das mesmas. O Governo vai conseguir levar a água ao seu moinho? Como?A Associação Nacional de Freguesias deixou-se emparedar num discurso “facilitista” do qual vai ter dificuldades em sair. A proposta do Governo para agregação de freguesias é conhecida. A Associação limita-se a dizer que é contra. O Partido Socialista faz o mesmo. No acordo da Troika está prevista a redução substancial de autarquias até Junho de 2012. Foi assinado pelo PS que agora tenta fugir às suas responsabilidades. Isso de dizer que apoia toda a agregação e extinção de freguesias que as populações aceitem, não é nada.Muitos presidentes de junta e autarcas de freguesia também estão contra porque as populações estão contra. Dizem que defendem os interesses dos seus eleitores. As pessoas também não querem aumento de impostos. Não querem fome. Não querem miséria. Quem está a ser beneficiado com o actual número de freguesias?Há uma certeza. Existem freguesias a mais e é possível ter mais qualidade com menos freguesias. Temos que caminhar para um modelo de gestão pública que não seja feito para satisfazer aqueles que exercem funções mas que tenha por base a melhoria do serviço prestado. Enquanto deputado, há uma década atrás, defendeu a criação de novos concelhos como Fátima ou Samora Correia e foram deputados do PSD e do CDS/PP que propuseram, por exemplo, a criação de uma nova freguesia no Entroncamento que é um dos concelhos mais pequenos do país em termos de área. Agora trabalha para agregar freguesias e extinguir algumas. É verdade. Mas hoje nunca o faria. O caminho hoje é outro. Está em curso uma reorganização administrativa. Não podemos continuar com o discurso do passado porque estaremos condenados ao fracasso.A reforma administrativa vai avançar como está delineada?Até agora só há uma proposta. Estamos abertos a discutir mas não vamos ficar paralisados pela falta de alternativas. Em Portugal as boas reformas são as que se aplicam aos outros. O país está a lutar contra muitos interesses instalados, que foram aqueles que puseram Portugal na situação em que se encontra.Não se poupará muito dinheiro com a fusão ou extinção de freguesias.O que se vai conseguir é uma racionalização da gestão e uma melhoria do serviço prestado às populações. A escala e a dimensão trazem resultados melhores.As próximas eleições autárquicas vão ser feitas já em novos moldes? É inevitável. Vamos ter já uma nova lei das finanças locais. Vamos ter já um novo modelo de organização territorial. Uma nova lei eleitoral.Porque é que só se mexe nas freguesias e não se faz também a fusão e extinção de concelhos? Para fazer fusão de municípios precisávamos ter um valor muito significativo para fazer acordos de reequilíbrio financeiro. Se eu juntar três municípios que estão mal, vou ter um muito mal. Nem o Estado Central, nem o tesouro nem a banca têm, neste momento, capacidade e liquidez para fazer acordos de reequilíbrio financeiro. Tudo tem que ser posto em cima da mesa. Empresas municipais, activos, passivos, dívidas...temos que ser realistas. Neste momento o país não tem condições para fazer isso. Não é fugir às responsabilidades. É uma questão de incapacidade financeira para poder fazer isto nesta fase.Que relacionamento existe actualmente com a Associação Nacional de Municípios.A Associação conhece bem a realidade dos municípios. Não vale a pena andar a dizer que os municípios estão com uma excelente saúde. Passou o tempo do discurso da ilusão. Temos que enfrentar com realismo os problemas que temos pela frente. Temos que evitar a demagogia e o facilitismo. Muita gente tem-se relegitimado com maus resultados de gestão.Algumas autarquias poderão ter de abdicar de fazer obras programadas mesmo com candidaturas ao QREN em andamento ou já aprovadas?Algumas vão ter que fazer isso. O tempo das rotundas passou. Quem continua a olhar para o futuro a pensar fazer obra de fachada está completamente desenquadrado. O país chegou a este estado por causa disso. Hoje o investimento tem que ser muito bem pensado. Os municípios têm que investir nas pessoas. Na capacidade de ajudar a gerar riqueza. Não podemos continuar com o actual modelo.Ao longo de 2011 os municípios continuaram a contratar pessoas apesar de estarem em situação difícil e as contratações na administração pública estarem congeladas. A lei deste Orçamento de Estado é muito rigorosa nessa matéria e não vai poder continuar a acontecer. As autarquias devem mais de 2,5 mil milhões de euros a fornecedores. Dívida de curto prazo. Estão a precisar de um processo de boa gestão, como o Estado central. O Estado também deve às autarquias. É uma discussão interminável. O Estado deve às autarquias cerca de 70 milhões e as autarquias devem ao Estado Central cerca de 600 milhões. As afirmações têm que ser baseadas no rigor. Acabou o tempo de falar por falar. “O país não fica mais rico com o discurso da ilusão”Um pouco por todo o lado multiplicam-se as manifestações contra o encerramento de extensões de saúde e contra a falta de médicos. Não é sensível a isso?Temos que racionalizar. Não podemos multiplicar infra-estruturas. Temos que ter bons cuidados de saúde primários mas temos que racionalizar. Não é uma questão de querer ou não querer. É uma questão de necessidade. O país não tem capacidade. Nós no próximo ano vamos gastar com o Serviço Nacional de Saúde 7 mil milhões mas vamos pagar de juros da dívida pública portuguesa 9 mil milhões de euros. É assustador, pagarmos mais de juros do que o que gastamos com a saúde.O cidadão comum quer saber é se vai ter médico ou não. O país vai empobrecendo e não podemos enriquecê-lo com o discurso da ilusão. O discurso da ilusão levou-nos à situação que tínhamos em Junho do ano passado, em que estávamos na bancarrota. Não tem uma quota parte de culpa pelo estado a que isto chegou?Sei que se fosse hoje não teria defendido um hospital em Torres Novas, um hospital em Tomar e um hospital em Abrantes. Não é possível. Gastámos o que tínhamos e o que não tínhamos. Este não é um tempo de os políticos se preocuparem com a popularidade. É um tempo de meter a mão na massa e resolver os problemas.Muitas pessoas já aceitaram a inevitabilidade das portagens mas não concordam com os preços fixados. A A23 tem um custo por quilómetro para quem lá passa superior ao custo por quilómetro da A1 , por exemplo. Essa situação vai ser revista?Não conheço com profundidade esse assunto e não falo do que não conheço. Terei que falar disso com o secretário de Estado das Obras Públicas. Há Misericórdias em dificuldades por falta de pagamento do Estado. O Governo está a olhar com muita atenção para esse problema. O senhor ministro da Saúde e o senhor ministro da Solidariedade Social estão a tentar encontrar formas que permitam a transferência desses meios para as Misericórdias. O trabalho dessas instituições é muito importante mas também sabemos que em muitas Misericórdias pode haver uma melhor gestão. O actual modelo de organização do turismo vai manter-se?Não. Vai ser extinto. O modelo das regiões de turismo está desadequado. Quem tem que gerir o turismo são os empresários do sector. O Estado tem que acompanhar. Quem faz o turismo não são as organizações onde estão ex-autarcas. A acção do Turismo de Lisboa e Vale do Tejo, por exemplo, é risível e nós em Portugal temos obrigação de apostar mais no turismo. O modelo em que me revejo é o do turismo de Lisboa em que está o público e o privado.“Para se ter sorte na vida é preciso muito trabalho”Gostou de ver cidades portuguesas sem iluminação de Natal este ano? Se o dinheiro poupado foi canalizado para a área social ou para pagar dívidas, gostei.Esteve na Madeira durante a passagem de ano. O que achou do fogo de artifício? A Madeira vai passar por um programa muito austero e exigente e tem que fazer opções. É normal que aposte no seu produto turístico. Uma parte significativa das receitas da Madeira vem do turismo. A Madeira especializou-se a vender um produto que é o fim de ano e está condenada a ter fogo de artifício, por muito difícil que seja explicar aquela despesa. Mudou de número de telemóvel quando tomou posse como ministro? Nunca mudei de número de telemóvel. As mudanças que possam ter acontecido com o meu número foram decorrentes de alterações de indicativos feitos pela operadora. E só tenho um número de telemóvel. Continua a dormir pouco? Entre cinco e seis horas. É suficiente. Quando foi a última vez que pegou num cigarro?Há seis anos. Por vezes tenho saudades mas se eu pegasse num cigarro nunca mais parava. Fujo disso! Uma das melhores coisas que fiz na vida foi ter deixado de fumar. Ainda tem tempo para ler? Leio. Principalmente relatórios (riso). Continuo a ler o que lia. Ensaios históricos...jornais, revistas, estas últimas no ipad bem como alguns jornais. Sente que as pessoas o olham de maneira diferente?Eu sou a mesma pessoa. Não me deixo iludir pela sacralização do poder. Procuro levar uma vida normal. Ainda hoje às 7 da manhã estava a entrar no ginásio. Falo com as mesmas pessoas que falava antes. Tenho mais responsabilidades mas tenho vida para além da política. Dá atenção ao seu índice de popularidade?Não. Não ligo muito a isso.O nome de dois amigos da política que tenha há muito tempo.Como O MIRANTE é do distrito de Santarém refiro dois de lá, o Octávio Oliveira (director do IEFP) e o Vasco Cunha (presidente da Comissão Distrital de Santarém do PSD e deputado). Mas tenho muitos outros amigos na política. Considera-se uma pessoa afortunada. Considero mas para se ter sorte na vida é preciso muito trabalho.“Carlos Carrão tem todas as condições para ser um excelente presidente de câmara”Porque insiste em manter o seu lugar na Assembleia Municipal de Tomar, onde é presidente? É um cargo que desempenho com satisfação. Não gostaria de ouvir dizer que, por ser ministro, me tinha afastado da terra e das pessoas. Pela assembleia passam os problemas do cidadão comum e eu gosto de estar ali. Eu não sou como aqueles políticos que quando chegam a determinadas funções deixam de conhecer as pessoas que conheciam. Eu não sou ministro. Eu estou ministro. Hoje estou. Amanhã não sei se estarei. É o seu último mandato?É. Já o tinha dito e mantenho. No final do mandato completo 16 anos como presidente da assembleia municipal. Está na hora de sair. Em Tomar, o acordo que existia entre o PSD e o PS acabou. Está a acompanhar a situação de perto? Hoje não acompanho de perto essa questão política. Preocupa-me mas não tenho tempo. O presidente da câmara agora é Carlos Carrão devido ao pedido de suspensão do mandato de Corvêlo de Sousa. Esta situação coincide com o desfazer-se da coligação. O PSD tem maioria relativa.O Carlos Carrão é uma pessoa muito sensata e muito equilibrada. Tenho uma expectativa positiva pelo seu desempenho. É uma pessoa que conhece os problemas, tem experiência; é humilde; sabe ouvir. E está a demonstrar que quer dialogar. Tem todas as condições para ser um excelente presidente da Câmara Municipal de Tomar.
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