uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante
Um homem dos sete ofícios que não tem férias há seis anos

Um homem dos sete ofícios que não tem férias há seis anos

Diamantino Duarte é administrador da Resitejo, lidera o PS da Chamusca e preside aos Bombeiros Voluntários de Santarém e à Federação de Bombeiros do Distrito de Santarém

O dia a dia de Diamantino Duarte é uma autêntica correria, tantos são os cargos que ocupa. Diz que tudo se consegue com uma disciplina férrea do tempo e abdicando de alguns prazeres e do convívio com a família. Nesta entrevista, não fecha a porta a uma candidatura à Câmara da Chamusca, diz que a Câmara de Santarém é mal gerida e garante que nunca se sentiu diminuído por não ter um curso superior apesar de ter tanta casa para gerir.

João Calhaz / António PalmeiroÉ administrador executivo da Resitejo e presidente à concelhia socialista da Chamusca, aos Bombeiros Voluntários de Santarém e à Federação de Bombeiros do Distrito de Santarém...E também sou presidente da assembleia geral da Associação de Basquetebol de Santarém.Ainda mais essa. Como consegue ter tempo para desempenhar tantos cargos ao mesmo tempo?Há algumas coisas fundamentais, como gostar daquilo que se faz, ter alguma organização e ter boas equipas. Como não se consegue estar em todo o lado é fundamental saber organizar o nosso tempo. Costumo dizer que só não tem tempo quem não quer.Não deve ser fácil conciliar a agenda.É extremamente fácil. Tem que haver uma disciplina enorme na gestão do tempo e aproveitá-lo nas nossas obrigações. A parte do lazer tem que ficar secundarizada. Depois é preciso ter uma estrutura familiar muito boa, que nos dê apoio. E ter boas equipas para se poder delegar e atingir os objectivos. Passa muito tempo sem ver as suas filhas?Normalmente vejo-as ao fim de semana. Durante a semana é raro, pois quando saio de casa ainda estão a dormir ou já saíram para as aulas e à noite só chego por volta da uma ou duas da manhã. Um ditado popular diz que quem muitos burros toca algum deixa para trás. Tenho tentado que isso não aconteça e penso que até agora tenho cumprido com as minhas obrigações. Isso obriga a uma disciplina férrea do tempo. Já não tenho férias há seis anos. Mas só consigo ter alegria quando estou a fazer aquilo que gosto. E desempenhar funções quer na Resitejo quer nas associações dá-me prazer.Não há coisas de que goste e de que teve de abdicar?Gostava imenso de caçar, era o meu passatempo. Abdiquei disso para ter tempo para outras actividades. Também fui dirigente da Federação Portuguesa de Caça. Só há uma coisa de que ainda não abdiquei, que é ir ver o meu Benfica quando joga na Luz. Tenho lugar cativo.Quando iniciou a sua vida profissional como ajudante numa farmácia estava longe de imaginar que chegaria onde chegou.Muito longe. Aliás, se alguém me dissesse em 1970 que eu iria ter esta vida toda eu dizia que era impossível. Costumo dizer que tudo o que consegui o devo a três pessoas: ao meu primeiro patrão, que foi como um segundo pai; ao 25 de Abril e à possibilidade que tive através da Armada de conhecer novos mundos e pessoas; e a uma pessoa que todos os dias recordo, que é o meu querido e saudoso amigo Ladislau Teles Botas (presidente da Câmara de Santarém durante parte da década de 70, toda a década de 80 e início da década de 90).Foi ele que o levou para a política?Sim. Ensinou-me muita coisa. Transmitiu-me uma série de princípios fundamentais para quem está nestas coisas. Na política tenho duas referências: o Mário Soares e o Ladislau Botas. Estamos numa sociedade de doutores. Nunca pensou em tirar uma licenciatura?Quando acabei o 12º ano nocturno pensei em tirar o curso de Direito e ainda não desisti dessa ambição. Espero ter tempo para isso quando atingir a reforma. Ainda pensei matricular-me, mas a minha vida profissional não permitiu seguir em diante.Tratam-no muitas vezes por doutor?Muitas. E também por engenheiro. Eu tenho logo o cuidado de dizer que o meu nome é Diamantino Duarte, não é doutor nem engenheiro. Nunca se sentiu discriminado por não ter um “canudo”?Nunca. Aliás prezo-me de trabalhar na minha vida profissional com muitos doutores e engenheiros e tenho a felicidade de eles me tratarem com a mesma deferência com que se tratam entre eles.Marinha abriu-lhe os olhos para a políticaDiamantino Duarte começou a despertar para a política quando ingressou na Marinha de Guerra em 1973. Confessa que o serviço militar lhe abriu os horizontes e lhe permitiu ter contacto com outras realidades. Conheceu um primeiro-sargento com quem conversava sobre ideias e ideais e que veio depois a saber que pertencia ao Partido Comunista Português. Acabou por simpatizar com o PS porque era o partido com o qual se identificava em termos de ideais e daquilo que era a sua visão da sociedade.Andou vários anos a colaborar com o Partido Socialista sem ser militante. Diz que colou, sozinho, centenas de cartazes. Levava ao ombro uma escada, o balde de cola na mão e os cartazes enrolados debaixo do braço. Em 1980 decidiu inscrever-se como militante. Na revolução do 25 de Abril de 1974 estava de serviço às comunicações da Marinha e acompanhou o golpe militar desde o início, com “muita emoção”, confessa.Diamantino Duarte nasceu e sempre viveu em Tremês, concelho de Santarém, onde já foi presidente da junta de freguesia. Andou na escola primária da localidade. Diz que foi aluno de uma grande educadora e construtora de seres humanos, a professora Guilhermina, que ainda é viva. Confessa que levou algumas reguadas na escola e que isso não lhe fez mal algum. “Aprendi muito com as reguadas que levei”. Quando acabou a 4ª classe foi trabalhar para a farmácia de Tremês. Tinha um caixote para chegar ao balcão e às prateleiras. Considera-se um autodidacta e diz com orgulho que recebeu o prémio de melhor aluno da escola de comunicações da Armada no ano em que ingressou na Marinha. Na tropa especializou-se em criptografia. Fez comissões da NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Desde novo que esteve ligado ao movimento associativo. Sempre foi uma pessoa interessada pela vida autárquica e da gestão. Recorda que o seu patrão na farmácia comprava todos os dias o Diário de Notícias, que ele aproveitava para ler às escondidas. Quando saiu da Marinha foi trabalhar para uma fábrica de loiça porque o seu lugar na farmácia já tinha sido ocupado, mas algum tempo depois voltou para ajudante técnico de farmácia. Diz que teve a felicidade de trabalhar com o antigo presidente da Câmara de Santarém, Ladislau Teles Botas, com quem aprendeu muito sobre política e gestão. Depois esteve também na autarquia no tempo do presidente José Miguel Noras. Foi administrador dos Serviços Municipalizados de Santarém. Não tem dúvidas que é mais importante ter vontade de trabalhar e de aprender do que ter cursos superiores. “Os jovens que saem da universidade se não tiverem alguém que os acompanhe e se não ganharem experiência de vida podem ser uns grandes filósofos mas nunca serão uns grandes gestores”, refere. Filho de pais agricultores e pai de duas filhas, de 26 e 15 anos, garante que nunca mexeu uma palha para conseguir algum benefício para elas. Tem pena que a vida ocupada que tem levado não lhe permita acompanhar mais de perto a educação e percurso das filhas. Não tem vícios. Já teve. Gostava de beber à noite um bom conhaque e fumar um charuto, mas razões de saúde levaram-no a abandonar esse prazer. Não abdica de ir ver o seu Benfica ao Estádio da Luz. Costuma ler. Agora está a ler o novo livro de Mário Soares - “Um Político Assume-se”. A coisa que tem melhor na vida, realça, é continuar a viver da mesma forma desde que entrou para a política. “Posso mostrar as minhas contas bancárias a toda a gente”.Gestão da Câmara de Santarém nos próximos mandatos já está hipotecadaA sua gestão na Resitejo e nos Bombeiros Voluntários de Santarém já foi questionada publicamente, em termos pouco abonatórios, pelo presidente da Câmara de Santarém, Moita Flores, em sessões da assembleia municipal. Como se sente quando é confrontado com esse tipo de críticas?Acima de tudo há que ter a consciência tranquila relativamente àquilo que fazemos. Tenho por hábito aprender com aqueles que são melhores do que eu. Com aqueles que fazem pior gestão que a minha normalmente ignoro-os. Como gestor, não conheço esse senhor nem lhe reconheço qualquer qualidade. Isso quer dizer que não existem relações institucionais entre o presidente da Câmara de Santarém e o presidente dos Bombeiros Voluntários de Santarém (BVS)?Entre essas pessoas não. Só costumo sentar-me à mesa com pessoas que estejam ao meu nível em termos de educação. Mas entre os BVS e a câmara existem relações.E em relação à Resitejo?Dentro da Resitejo, para mim, as entidades estão sempre acima das pessoas que as dirigem. Tenho uma direcção à qual respondo, tal como tenho a assembleia geral a quem presto contas. Limito-me aqui a cumprir as funções de administrador delegado tratando todas as entidades da mesma forma, sem me preocupar quem representa essas entidades.Como cidadão residente no concelho de Santarém como vê a acção da Câmara de Santarém nestes últimos anos?Como munícipe vejo com tristeza aquilo que se passa no meu concelho. Conheço bem a realidade interna da câmara e vejo com preocupação que a minha cidade e o meu concelho precisam urgentemente de alguém que antes de se preocupar consigo se preocupe com as pessoas que lá vivem e que no final do mandato não se vão embora. Com a situação financeira que se vive, o futuro dos próximos cinco mandatos está já hipotecado.A má situação financeira da Câmara de Santarém não nasceu com Moita Flores.Reconheço que o último mandato do PS à frente da câmara foi aquele em que mais obras se fez e se calhar algumas não deviam era ter sido feitas naquele tempo. Porque quando não temos meios devemos programar os investimentos para mais tarde. Nos últimos mandatos correu-se atrás de uma série de obras que, se calhar, não estavam já feitas porque houve consciência da situação financeira e não se quis deixar para as gerações vindouras uma casa ingovernável. Acha que o PS tem condições para voltar ao poder em Santarém nas próximas autárquicas?Penso que sim. O actual presidente da concelhia tem as ferramentas necessárias para poder dinamizar o PS e nas próximas autárquicas apresentar uma candidatura muito forte de pessoas credíveis, que gostem de Santarém. O PS não necessita de ir buscar ninguém fora do concelho para ter uma lista forte, com pessoas competentes técnica e politicamente.Quer arriscar um ou dois nomes?Não, mas já os disse ao presidente da comissão política, Carlos Nestal.O PS de Santarém está bem entregue?Está. Tem à sua frente uma pessoa que gosta muito do PS, muito competente, que sabe ouvir as pessoas. E conseguiu juntar na sua lista uma série de pessoas que andavam afastadas do PS. A oposição que o PS tem feito deixa-o satisfeito?Não. Acho que a oposição do PS tem-se deixado levar um pouco pelas cantigas de embalar que se vão cantando no concelho. Santarém merece que o PS passe a fazer uma oposição mais vigorosa e que dê conhecimento às pessoas do real estado que se vive na câmara. “Câmara da Chamusca tem a liderá-la um dos autarcas mais carismáticos do país”Sempre foi militante do PS em Santarém. Há pouco tempo filiou-se na Chamusca e já é o presidente da concelhia. Tem ambições políticas nesse concelho?Não. Em 2002 vim trabalhar para a Chamusca e já nessa altura tinha um relacionamento muito antigo com alguns militantes do PS. Passei a fazer aqui grande parte da minha vida e os camaradas começaram a convidar-me para as actividades políticas no concelho. E há três anos convidaram-me para passar a minha militância para a Chamusca. De início achei que não era o mais correcto, mas depois de alguma insistência aceitei, com o objectivo de ajudar gente jovem que precisava de ser enquadrada por pessoas mais experientes. Disse que não queria fazer parte de qualquer órgão mas sim ser militante de base. Mas não foi isso que aconteceu.Quando foi a eleição da última comissão política, o camarada Fernando Pratas pediu-me para fazer parte da sua lista e acabei por aceitar. Quando vi a lista o meu nome estava em número dois, mas para mim isso não tinha qualquer importância. Em Setembro passado, Fernando Pratas pediu a demissão de presidente da concelhia. A minha primeira reacção foi a de que não estaria disponível para ficar no seu lugar, até porque tinha um compromisso comigo próprio de não voltar à política activa nos tempos mais próximos. Mas alguns camaradas entenderam que seria útil nesta fase do partido liderar a comissão política. Aceitei e agora cá estou a desempenhar essas funções com toda a força pelo menos até às próximas eleições internas.Apareceu quase como um salvador no PS da Chamusca, numa altura em que havia alguns problemas internos, divisões.Se calhar faltava alguém que mobilizasse as pessoas. Havia pessoas que já estavam há muito tempo na estrutura. Quem me conhece sabe que gosto de abanar as coisas e pô-las a funcionar à minha imagem e medida. Foi isso que fizemos nestes três ou quatro meses.É uma boa oportunidade para o PS ter um bom resultado na Chamusca nas próximas autárquicas?O PS quando concorre a qualquer eleição tem sempre oportunidade de obter bons resultados. Depende da vontade dos eleitores e dos programas que se apresentam.Sem a possibilidade de recandidatura do presidente Sérgio Carrinho (CDU) as coisas podem ficar mais fáceis.É evidente. Não podemos esquecer que a Chamusca tem na liderança do seu concelho alguém que, para mim, é dos autarcas mais carismáticos deste país. O presidente Sérgio Carrinho ficará sempre ligado ao concelho da Chamusca. É um autarca que comete erros como toda a gente, mas tenho a certeza que não há ninguém que goste mais do concelho do que ele. Assim é difícil fazer-lhe oposição.Fazer oposição na política não é só dizer mal uns dos outros. Esse é um mal da política actual. Há que ter a coragem de reconhecer nos nossos adversários políticos aquilo que de bom se faz.Como vai gerir a sua relação com Sérgio Carrinho, uma pessoa com quem trabalha todos os dias como presidente da Resitejo. Ser agora o líder do principal partido da oposição no concelho não influencia o vosso relacionamento?Conheço o presidente Sérgio desde 1990, trabalhamos juntos há 10 anos, ele sabe como eu funciono, eu sei como ele funciona. E connosco existe acima de tudo lealdade. Na prática, durante o dia é aliado dele e à noite é oposição.Não somos nem aliados nem opositores. Somos duas pessoas que sabem perfeitamente qual é o nosso lugar e as nossas funções. Tenho uma lealdade para com ele a toda a prova. Não vendo os meus princípios em troca de nada. Quando estou de acordo digo, tal como digo quando não estou e porquê. O presidente Sérgio foi a primeira pessoa a saber que eu ia tomar essa decisão de assumir a liderança do PS.E pode-se saber o que ele lhe disse?Não disse nada de especial, não ficou triste nem contente. Admite ser candidato à Câmara da Chamusca?Dificilmente. Neste momento isso não se põe nos meus objectivos.E se os militantes do PS insistirem tanto como insistiram para o senhor ser o presidente da concelhia?Não sei como vai ser o dia de amanhã. Estarei sempre disponível para fazer aquilo que o partido entenda que é mais útil. Neste momento não está na minha perspectiva ser candidato a alguma coisa nas próximas autárquicas. Mas nunca direi nunca.Se calhar, para Sérgio Carrinho, apesar de serem de partidos diferentes, o senhor seria o melhor candidato a seu sucessor.Não sei. Têm que lhe perguntar a ele. Não pensei nisso.
Um homem dos sete ofícios que não tem férias há seis anos

Mais Notícias

    A carregar...