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Francisco Jerónimo é o novo dono da bola no futebol distrital

Engenheiro civil de 57 anos tomou posse no sábado como presidente da Associação de Futebol de Santarém

Francisco Jerónimo foi durante mais de duas décadas quadro superior da Câmara de Santarém, onde chefiou o departamento de obras municipais. Nasceu perto de Torres Novas e foi na sua terra natal, Pintainhos, que iniciou um longo percurso de ligação ao associativismo em várias frentes. Substituiu agora Rui Manhoso à frente do futebol distrital.

Presidir à Associação de Futebol de Santarém (AFS) quando o futebol distrital, em termos de representatividade nacional, parece ter batido no fundo, é um desafio motivador?É na realidade um desafio motivador. Tenho consciência do que é dirigir esta associação, com a história e o prestígio que alcançou nas suas nove décadas de existência. Na conjuntura actual considero que não vamos ter uma vida fácil, mas estamos aqui de corpo e alma para continuar a dinamizar o desporto no distrito de Santarém.Há uma dúzia de anos o distrito chegou a ter uma dezena de equipas a disputar os campeonatos nacionais de futebol sénior. Actualmente tem quatro. O que correu mal?O futebol não pode estar desligado da força do tecido empresarial da região. O distrito de Santarém não tem tido uma pujança industrial e portanto a riqueza não tem sido abundante e isso reflecte-se no apoio aos clubes. Essa força industrial é mais forte na zona norte do país e a força do futebol passou também para essa zona. É uma situação normal que temos que lutar por inverter.Nos próximos anos prevê-se que, devido à crise, os clubes ainda contem com menos apoio das câmaras e das empresas. Os clubes vão ter de aprender a viver com o que têm?Essa é uma realidade que não podemos esquecer. É uma realidade que se sente e que todos nós, clubes e associações temos que ter em conta. Temos que ser capazes de reinventar um novo modelo de associativismo. Toda a sociedade portuguesa andou a viver acima daquilo que eram as suas possibilidades e os clubes não fogem à regra. Essa espiral de inflação dos custos no futebol amador teve muito a ver com as ambições desmedidas de dirigentes de alguns clubes?Há clubes que têm feito uma vivência claramente equilibrada, mantendo-se dentro das receitas que são capazes de angariar. Há outros em que as ambições dos seus dirigentes atingiram picos muito elevados, mas depois a queda foi muito grande. Em alguns casos levou mesmo à extinção dos clubes. É preciso ter prudência e saber viver com o que temos.A AFS não podia ter tido aí um papel mais activo no sentido de pedir ou exigir moderação aos clubes?O que podemos fazer é sensibilizar os clubes para a situação que se vive. Sei que tem havido da parte da AFS uma acção pedagógica em relação aos clubes. Mas não podemos intervir na vida interna dos clubes.Como dirigente associativo ligado ao futebol como vê o facto de ter havido clubes nos distritais a pagar ordenados de mil euros a jogadores que são supostamente amadores?Dizem bem, que são supostamente amadores. Estamos a falar de desporto amador em que, é verdade, nalguns períodos foram pagos vencimentos desse nível. Isso levou a ambições desmedidas em que se investiram números claramente acima daquilo que as instituições podiam gastar. A crise que vivemos pode ajudar a moralizar essa situação. Uma das maiores queixas dos clubes é o elevado custo das inscrições dos jogadores. O que vai fazer para alterar essa situação?A AFS tem que avaliar isso numa perspectiva global. Temos despesas fixas, nomeadamente o custo da arbitragem é elevado, e por isso não podemos descurar as receitas necessárias para o equilíbrio da nossa gestão corrente. O esforço de amenizar a situação tem que ser de todos. Apostamos na capacidade de inventar receitas extraordinárias que possam ajudar a vida dos clubes. Por sua vez também queremos reduzir os custos de exploração da própria AFS. Mas isso só é possível se puxarmos todos para o mesmo lado. Enquanto não se arranjam formas de amenizar a situação, os clubes continuam a desistir dos campeonatos.É verdade que nos últimos anos alguns clubes têm ficado pelo caminho. Mas a regeneração vai acontecendo. No último mês inscreveram-se dois novos clubes na associação. É evidente que cada vez que um clube desiste é um momento de tristeza para a associação. Mas a verdade é que a AFS tem dado sinais claros de ajuda aos clubes. Ainda agora tomámos a decisão de não cobrar taxas de jogo na fase final da Taça do Ribatejo. Os custos das taxas de jogo são quase incomportáveis para os clubes?As taxas de jogo incluem as despesas com a arbitragem. O que recebemos dos clubes da segunda divisão distrital não chega sequer para pagar aos árbitros.Mas os clubes também não têm receitas nos jogos que cheguem para pagar as despesas?É verdade. A AFS deu um sinal claro aos clubes que está apostada em ajudar, mas voltamos a afirmar que temos que ser todos a procurar soluções. As despesas dos clubes com a AFS são as mais expostas, mas há outras despesas que os clubes têm que nos surpreendem. Sobem as receitas das multas aos clubes?Não, essas até têm baixado. Sobem muito as receitas de transferências de jogadores. As pessoas têm a ideia que as multas são a grande receita da associação, mas essa não é a realidade. No que diz respeito à questão das despesas com o policiamento há alguma coisa que a AFS possa fazer?Temos consciência que as despesas com policiamento são um custo muito grande na organização dos jogos de seniores. Isso é uma grande preocupação. Manifestámos isso junto da Federação Portuguesa de Futebol, que sabemos estar também preocupada com isso e já teve uma reunião com o Ministério da Administração Interna para reavaliar toda a situação, porque as comparticipações acabaram. O número de agentes enviados para fazer a segurança parte da opinião do comandante do posto e os clubes queixam-se de que muitas vezes é exagerado?Admito que em muitos casos os clubes têm razão. Mas aí também tem que haver da parte dos clubes alguma responsabilidade. É tempo de assumirem alguma segurança nos próprios campos, porque quando isso acontecer as despesas com policiamento vão baixar. Já reunimos com os comandos da PSP e da GNR no sentido de os sensibilizarmos para esta situação.Em relação à reestruturação dos quadros competitivos o que se propõe fazer?Neste momento há uma posição consensual de que a 3ª divisão é para extinguir, pois tem sido um desastre financeiro e até desportivo. A grande maioria dos clubes vem para os distritais, daí ser necessário partir para uma reestruturação do futebol distrital, que na minha opinião passa a ser mais forte e a ter uma maior proximidade entre clubes. Logo que sejam aprovados os novos parâmetros competitivos na Federação, criaremos um grupo de trabalho para encontrar um modelo de organização dos campeonatos distritais.“Luta com o Inatel é desigual”O Inatel é um grande concorrente da AFS aqui no distrito de Santarém.Chamo a isso uma luta desigual. O Inatel tem benefícios que a nossa associação não tem. Estou a falar no policiamento e noutros encargos para os clubes. Por isso alguns clubes procuram essa solução para praticar futebol, apesar de não ser o mesmo nível de competição e organização. Não sei se esse financiamento é para continuar, não faz sentido. Ao nível da direcção da AFS vamos abordar essa situação e vamos procurar uma solução para trazer de volta alguns desses clubes. Mas se esse financiamento ao futebol do Inatel continuar é impossível competirmos com isso.Em relação à arbitragem, o que vai ser feito para captar novos árbitros?O actual Conselho de Arbitragem tem mostrado grande dinamismo e tem uma estratégia de curto e médio prazo que está a resultar e já trouxe muitos jovens para a arbitragem. Esses árbitros que entraram agora estão a ser cuidadosamente integrados em equipas mais experientes de modo a apoiá-los em relação às novas realidades. Não é desmotivante que o Conselho de Arbitragem mande árbitros do nacional para os jogos mais aliciantes do campeonato distrital?O Conselho de Arbitragem deve ter tido razões para nomear um árbitro do nacional para esses jogos. Concordo com a decisão. Não sei se havia ou não um árbitro do distrital disponível para esses jogos. São decisões do Conselho de Arbitragem que não quero comentar.Gostava de ver um Benfica-Porto arbitrado por um árbitro estrangeiro?Não, não gostava. A arbitragem portuguesa está muito bem conceituada a nível mundial.Falou há pouco da entrada do VSI Rio Maior para a AFS. O clube pode competir nos distritais só com estrangeiros?As indicações que temos é que o clube não vai integrar só jogadores estrangeiros. É uma academia que se instala tirando partido das excelentes infra-estruturas desportivas e académicas que Rio Maior tem. A Cidade do Desporto ganhou a corrida a várias outras cidades da Europa, por isso para a AFS e para o distrito de Santarém é uma vitória. Um engenheiro orgulhoso da obra feitaFrancisco Jerónimo, casado e pai de duas filhas, estudou em Torres Novas e em Tomar até acabar o ensino secundário. Aos 18 anos foi para Lisboa estudar engenharia civil mas acabou a licenciatura na Universidade de Coimbra. Ainda deu aulas na zona de Lisboa, mas o objectivo era trabalhar em engenharia. Nessa altura concorreu para muitos lugares, entre eles a Câmara de Santarém, cidade onde não conhecia ninguém. Acabou por escolher, sem estar muito convencido da bondade desse passo, o trabalho na autarquia ribatejana em detrimento de um trabalho no gabinete da área de Sines.Diz que a “capacidade mobilizadora” do então presidente da câmara Ladislau Botas (PS) acabou por o convencer a ficar na Câmara de Santarém, “mas sempre na perspectiva de que um dia desses me ia embora”. A possibilidade de trabalhar na área de execução de obras ajudou a que fosse ficando. Entretanto foi subindo na hierarquia e foram surgindo “desafios” que fizeram prolongar a sua passagem pela autarquia, como a construção do pavilhão desportivo de Santarém, a circular urbana Rua O _ “havia pessoas com responsabilidade que me perguntaram várias vezes para que era preciso uma rua tão larga” - e a ETAR de Santarém, “que foi em termos técnicos o projecto mais difícil e que continua a funcionar bem”.Trabalhou na Câmara de Santarém durante quase 30 anos, onde foi chefe da Divisão de Engenharia, director do Departamento de Obras Municipais entre 1992 e 2004 e assessor técnico do gabinete do presidente entre 2006 e 2009. É actualmente sócio gerente de uma empresa de projectos e engenharia.Apesar de haver fundos comunitários para financiar obras de saneamento básico há mais de 25 anos, continua a haver localidades com alguma dimensão sem rede de esgotos e/ou sem tratamento dos mesmos. Os nossos autarcas têm dado prioridade a obras mais vistosas, em detrimento de outras que não rendem tantos votos?Um exemplo: a diferença entre a ETAR de Santarém e a circular urbana da cidade traduz um pouco isso. As pessoas sentem a Rua O porque todos os dias passam lá e muitas vezes devem pensar: se não houvesse esta circular urbana como é que se circulava em Santarém? Eu diria que não se circulava. Quanto à ETAR, só se dá por ela se deixar de funcionar, porque está lá escondida. É verdade que se preferiu muitas vezes fazer pavilhões multiusos e outras coisas do que outros investimentos menos visíveis. Como é que vê o facto de o complexo desportivo de Santarém, há muitos anos falado, ainda não ter saído do papel?Como responsável da Associação de Futebol de Santarém vejo com tristeza que Santarém não tem infra-estruturas desportivas capazes de competir com outras cidades e vilas do distrito.Foi durante muitos anos responsável pelo sector das obras municipais da Câmara de Santarém. Teve muitas vezes de respeitar decisões políticas que lhe custassem a engolir?A vida de um técnico numa autarquia tem a responsabilidade de apresentar soluções técnicas. E raramente há só uma solução. A nossa missão é propor a mais eficaz, a mais barata, a que sirva melhor o objectivo pretendido. Depois, há quem tenha a responsabilidade de decidir. Até porque o técnico nem sempre tem todas as variáveis que obrigam à decisão. Isso não pode é ser confundido com soluções que tentem pôr os técnicos a apresentar soluções que violem a sua própria deontologia profissional.Alguma vez foi confrontado com uma situação dessas?Não. Se tentaram não dei por isso.Saiu de chefe do departamento de obras municipais no mandato de Rui Barreiro. Qual foi a razão?Achei que estava na hora de fechar o ciclo. Estava num bom momento para sair e é importante sabermos sair. Com a conclusão do Teatro Sá da Bandeira, uma obra que me deu também particular gozo, achei que era a altura de sair. Quando nos cansamos podemos começar a reagir em função desse cansaço e isso não é desejável. Futebol e política andam muitas vezes de mãos dadas. A política pode ser o passo seguinte na sua vida?Tenho a minha intervenção na sociedade mas nunca tive e não tenho qualquer ambição política.Qual foi o presidente da Câmara de Santarém com quem mais gostou de trabalhar?Pode parecer a resposta mais simples, mas tive uma estima muito grande por Ladislau Botas. Não sei se foi por ter sido o primeiro com quem trabalhei, mas a sua capacidade de mobilização e a sua solidariedade eram fantásticas e levavam-nos a estar sempre na primeira linha para o que fosse necessário. Sentíamos que ele estava ali para nos mobilizar.E o que pensa do trabalho do presidente da Câmara de Torres Novas, António Rodrigues?Conheço-o há muitos anos, estudou na escola onde eu estudei. Tenho uma óptima relação pessoal com ele e acho que é um homem que conseguiu dar uma imagem à cidade de Torres Novas de que todos os que lá vivem se orgulham.Ligado ao associativismo desde a juventudeFrancisco António Maia Jerónimo nasceu em 5 de Junho de 1954 na pequena aldeia de Pintainhos, no concelho de Torres Novas, filho de pai operário e mãe doméstica. Foi na Sociedade Recreativa Pintainhense que se iniciou nas lides associativas, sendo presidente da assembleia geral da colectividade desde 1981. O que elucida a sua ligação afectiva à agremiação e à terra natal que visita regularmente apesar de viver desde 1980 em Santarém, onde construiu a sua carreira profissional.Na capital de distrito teve e tem participação activa em várias associações. Foi membro dos corpos sociais da Associação Académica de Santarém entre 1991 e 1999, foi sócio fundador da Casa da Europa do Ribatejo em 1996, foi membro da direcção do Círculo Cultural Scalabitano entre 1993 e 2000 e é presidente do conselho fiscal da mesma colectividade desde 2000. Foi também membro fundador da comissão organizadora do Festival Nacional de Gastronomia de Santarém e integrou como vice-presidente o Conselho Directivo da Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas entre 2003 e 2006.Benfiquista militante, tem no futebol uma das suas grandes paixões. Ainda hoje joga futsal todas as semanas para manter a forma. Diz que na região não tem propriamente um clube preferido, mas sempre reconhece que tem simpatia pela Académica de Santarém e que gosta que o Desportivo de Torres Novas ganhe. Mas, fundamentalmente, e em nome de um discurso equidistante como presidente da AFS, diz que o que lhe interessa mesmo é que os clubes do distrito tenham todos bons desempenho.

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