Rosácea do Convento de S. Francisco é a obra da vida de Cristina Maria Ferreira
A mestre de cantaria artística e fadista é autora de um trabalho que marca a história de Santarém
Cristina Maria é conhecida pelo fado, mas é também uma das poucas mestres de cantaria artística em Portugal. Com a construção da rosácea do Convento de S. Francisco mostra que esta arte apesar de esquecida ainda está viva em Portugal.
Quem olha para as mãos de Cristina Maria Ferreira não imagina que esteve a trabalhar toneladas de pedra até há pouco tempo. A mestre de cantaria artística, conhecida pelo fado, demorou quatro meses a fazer a rosácea que já está a ser colocada no Convento de S. Francisco em Santarém. Nos trabalhos de precisão, a escopro, não usou luvas. Os dedos não têm cortes. Nas palmas das mãos não se vislumbram calos, o que revela a destreza e precisão no trabalho. Na voz, a fadista Cristina Maria tem a força de um escopro a sulcar a pedra e nas mãos a arte e a sensibilidade que a levou a ser escolhida para fazer a rosácea de quatro metros de diâmetro, que considera ser a obra da sua vida pelo simbolismo que representa.Herdeira da sabedoria e arte do mestre Alfredo Neto Ribeiro, falecido há uma década, Cristina Maria é das poucas que se dedicam à cantaria artística, uma arte que tem estado esquecida em Portugal. “Fazer esta rosácea é um diploma e uma forma de dizer que ainda estamos vivos”. A canteira fadista diz que recebeu o trabalho como um desafio muito importante, por se tratar de uma obra para a capital do gótico. Foram precisas algumas pesquisas e ensaios para apresentar um projecto que vai finalmente tapar o buraco da fachada do convento. Até porque se desconhece o que já esteve naquele sítio.Cristina Maria inspirou-se no portal de entrada e em alguns elementos ornamentais do interior do convento para fazer a rosácea. O projecto foi desenvolvido em instalações na zona industrial da Batalha, porque o atelier da artista, na mesma vila, não tinha espaço suficiente. Foi preciso fazer, além de desenhos e ensaios, moldes e até construir várias ferramentas específicas. Umas mais improvisadas que outras. Como um compasso constituído por uma régua de alumínio presa a um escopro com fita-cola e grampos para fazer de compasso. O trabalho chegou a durar de sol a sol. Cristina trabalhava os enormes blocos a ouvir fado. Outros quatro técnicos ajudavam a mestre canteira. Como António Moreira, que fez o desenho. São 12 peças de pedra maciça que constituem a moldura. A parte rendilhada interior tem sete peças. Durante este tempo, até o trabalho estar concluído no dia 30 de Abril, Cristina teve que contrariar várias dificuldades. “Todos os dias havia coisas que era preciso mudar”. Fez viagens sem conta à pedreira de onde foi extraído o vidraço de moleanos para escolher os blocos. Era preciso garantir que os enormes pedaços de pedra não tinham fissuras. “O Convento de S. Francisco vai ficar na história da minha vida”, diz a artista que foi dividindo o tempo entre a construção da rosácea, os espectáculos, alguns no estrangeiro, as gravações… Umas vezes estava na Batalha outras em Monte da Vinha, Paço dos Negros, Almeirim, onde vive com o músico e mestre da guitarra portuguesa Custódio Castelo, seu marido e produtor. O processo de construção da rosácea foi registado em vídeo e vai integrar o DVD intitulado “A escultura e o fado”, que faz a ligação das duas artes da vida de Cristina Maria. É um projecto “onde as artes se cruzam num só sentimento”. A inauguração da rosácea, paga pela Fundação Montepio, vai decorrer no dia 10 de Junho às 20h00 com um espectáculo da artista em frente ao convento e à sua obra com a participação de Custódio Castelo Trio.
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