Fabulástico Serafim das Neves
Os organizadores da Feira Nacional da Agricultura, através de um dos administradores do Centro Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas (CNEMA), fartaram-se de elogiar o que se passou durante o decurso da mesma. Para esmagarem os críticos até relevaram coisas como o número de ministros, secretários de estado e deputados que por lá passaram e os vinte e dois colóquios realizados. Deve ter sido a Melhor Feira Nacional de Agricultura do Mundo, presumo eu. Quiçá, do Universo, vá-se lá saber! No 10 de Junho o presidente da câmara municipal de Santarém anunciou que vai deixar o cargo antes do final do mandato e elogiou a obra que realizou ao longo dos últimos anos. Não me lembro de outro presidente de Câmara com tanta obra feita. Deviam dar-lhe o cognome de Obreiro. E fazer-lhe uma estátua já que, como lembras no teu último e-mail, está na moda inaugurar estátuas. Apanhado por esta vaga de auto elogios até eu me sinto tentado a fazer o mesmo chamando a atenção para a soberba qualidade dos e-mails que te tenho endereçado. A fina ironia dos meus escritos; a qualidade do português; a cuidada selecção dos verbos; a subtileza da pontuação; a criteriosa escolha das fotografias que os ornamentam... Eu sou pelo auto-elogio. Acho mesmo que deveríamos candidatar o auto-elogio português a Património Imaterial da Humanidade. Se conseguimos com o fado não será difícil obter novo sucesso com o auto-elogio. Pode haver alguns portugueses que desafinem a cantar o fado mas não acredito que haja um português que se engasgue na altura de se auto-elogiar. O auto-elogio é tão genuíno como o fado. Vem-nos do fundo da alma. É sincero e sentido. Quem se auto-elogia sabe bem do que fala. Não inventa. Eu cá, quando começo a auto-elogiar-me sou tão português que até me espanto com a minha portugalidade. Para veres como o auto-elogio é tão bem visto em Portugal basta estares atento à forma como são olhados os críticos e como é elogiada a caça ao crítico. Calar um crítico em Portugal é actividade praticada com sucesso ao longo da história. Alguns são silenciados à calhoada. Outros de forma mais sofisticada. O método não importa. O que importa é acabar com eles. Denegri-los; insultá-los; desacreditá-los; processá-los, preteri-los; asfixiá-los; equipará-los a vírus e a outros animais nocivos. O senhor Moita Flores que agora anuncia a saída de presidente da câmara de Santarém tem tanta mestria a auto-elogiar-se como a denegrir críticos. É o chamado português completo. Esmaga-os com a verve como quem esmaga piolhos. Um mestre!!!Os críticos deviam ser desbastados como as ervas daninhas. Deviam ser internados em hospitais psiquiátricos. Como é que pode alguém no seu perfeito juízo pôr em causa a excelência do mandato autárquico de Moita Flores? Como pode alguém fazer reparos à Feira Nacional de Agricultura? Como pode alguém duvidar, por exemplo, da clarividência e luminosidade do ideário do Ministro Miguel Relvas? Sem críticos éramos muito mais felizes, acredita. Estas angústias existenciais que por vezes sentimos são provocadas pelo veneno da crítica. Termino este excelente naco de prosa anunciando-te que me sinto preparado para receber o Nobel da literatura já na próxima edição e que aguardo impacientemente a revoada de auto-elogios que políticos, dirigentes de clubes de futebol, automobilistas, recém-licenciados, empresários, funcionários públicos...não deixarão de continuar a produzir. Graças a Deus!!!Manuel Serra d’Aire
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