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Há centenas de aterros a receber resíduos perigosos sem fiscalização

Há centenas de aterros a receber resíduos perigosos sem fiscalização

CIRVER do Eco-Parque do Relvão na Chamusca querem regras apertadas para todos os operadores

Os dois Centros Integrados de Reciclagem, Valorização e Eliminação de Resíduos, SISAV e a Ecodeal não querem ver reduzidas as exigências que lhes são impostas em termos de controle e segurança mas querem que elas se estendam aos outros 350 aterros que também recebem resíduos em todo o país. As autoridades andam há anos a prometer acabar com a concorrência desleal mas nada é feito. A lei para obrigar à descontaminação dos solos industriais também continua em “banho-maria” com prejuízos para a saúde, o ambiente e a economia. Uma entrevista com respostas a uma só voz, aos engenheiros Manuel Simões, Director Geral da Ecodeal - Gestão Integral de Resíduos Industriais, SA e Alexandre Seiça, Administrador do SISAV, Sistema Integrado de Tratamento e Eliminação de Resíduos, SA.

Quantas entidades estão a receber resíduos perigosos para além do SISAV e Ecodeal?De acordo com a Agência Portuguesa do Ambiente, existem 350 instalações licenciadas para receber lixos perigosos em Portugal. Dá, em média, mais que uma por concelho. Com as mesmas regras e obrigações que têm os CIRVER?Não. Completamente diferentes. Têm regras completamente diferentes e ainda por cima ninguém vai ver se as cumprem. Não há fiscalização. Como é que isso é possível? Em termos concorrenciais é uma situação muito desigual.Sim. É disso que se trata. É uma concorrência desleal... institucionalizada, digamos assim. Calculo que tenham reuniões periódicas com as entidades que superintendem nestas matérias e que o problema seja regularmente colocado. Qual tem sido a resposta?As autoridades têm mostrado abertura para resolver mas não tem havido acção. Dizem que estão a trabalhar nisso mas a inacção começa a ser gritante. Desde 2008, quando começámos a trabalhar que temos alertado para este e outros problemas. Se calhar quando o chegarem a resolver já cá não estamos. Um outro problema era o da exportação de resíduos.Sim. Não fazia sentido continuarem a sair resíduos com instalações como as nossas licenciadas em Portugal. Foi uma coisa que as autoridades demoraram algum tempo a resolver mas que, felizmente resolveram. Calculo que não tendo que responder à exigências dos CIRVER e não sendo tão fiscalizados os tais 350 operadores possam fazer preços muito mais baixos. E em situações de crise como a actual é pior. Os clientes escolhem os preços mais baixos. É normal que assim seja. Na Ecodeal, por exemplo, pagam-se cem mil euros de responsabilidade civil e ambiental por ano. Cem mil euros é dinheiro. Se formos distribuir isso por cada tonelada de resíduos que entra, os preços sobem. E não é só o seguro. Há taxas de gestão de resíduos... e há as restantes exigências. Por exemplo, eu faço o mesmo tratamento de águas para o mesmo tipo de águas que outros fazem mas como sou um CIRVER tenho limites de emissão de águas muito mais restritos. Porque é que aos outros não são impostas as mesmas restrições? Isto pesa no custo final de exploração e de que maneira.Há resíduos perigosos que podem estar a ser depositados em aterros que não estão devidamente preparados para os receber? Em Portugal os resíduos estão divididos em perigosos e não perigosos. Os resíduos perigosos têm que ser tratados num CIRVER. Os não perigosos podem ser descarregados em aterros que não têm o mesmo grau de exigências, a começar pela impermeabilização. O tratamento de um resíduo perigoso pode custar 80 ou 90 euros. O de um não perigoso 40. O que acontece é que, em muitas situações, um resíduo perigoso pode acabar num aterro de resíduos não perigosos porque existe uma diferença de valor que pode trazer uma mais valia não só para o cliente como para a pessoa que está a gerir esse aterro. Estas situações têm que ser controladas por parte das autoridades. Fazer com que cada resíduo vá para o local adequado e isso é o que é mais difícil fazer, nomeadamente em tempo de crise. Foram alvo de alguma inspecção no ano passado, por exemplo?Fomos o ano passado e noutras alturas. Não foi detectada qualquer anomalia. Para além das inspecções temos que mandar relatórios semestrais para a APA (Agência Portuguesa do Ambiente). O que fazemos e não fazemos. Somos extremamente controlados, ao contrário dos outros operadores que estão no mercado, que infelizmente não são controlados. Não queremos nenhum abrandamento em relação a nós. Não queremos deixar de ser controlados mas gostávamos que os restantes operadores fossem também controlados como nós somos.Quando há grande alarido em volta de um caso como o do ano passado, por causa de não terem recebido um camião com resíduos que acusavam determinado nível de radioactividade, o que pode ser dito?É natural a preocupação das pessoas. Mas se em relação aos CIRVER do Eco-Parque do Relvão todas as situações são controladas o mesmo não se passa nos outros locais.Tinham curiosidade em saber para onde foram encaminhados os resíduos que vocês não aceitaram? Era interessante saber.Os senhores não sabem. A opinião pública não sabe. Quem fez barulho na altura também não sabe. E esses resíduos podem ter entrado num outro aterro com menos condições que os CIRVER. Qual a vossa posição relativamente à comissão municipal de acompanhamento da vossa actividade, que está em formação? Para as empresas e para a população é importante que essa comissão de acompanhamento exista. É um sítio onde podemos esclarecer todas as dúvidas. Pela nossa parte não temos nada para esconder. Convém recordar que o município da Chamusca tem uma participação de 2,5 por cento nos dois CIRVER o que lhe possibilita a presença em todos os conselhos de administração e permite saber as decisões que são tomadas. E uma comissão de acompanhamento até nos pode ajudar noutros assuntos. A criar sinergias no eco-parque, por exemplo a resolver alguns problemas como o facto de não termos fibra óptica, por exemplo. Uma empresa como a Ecodeal ter cinco ou seis vendedores no país que não conseguem aceder ao seu servidor, não é do século XXI. Já não se usa. Não têm porquê?Quando uma entidade como a PT pede 30 mil euros para instalar a fibra óptica. Não temos esse dinheiro para investir mas desenvolvendo esforços dentro da região a operadora conseguiria instalar a fibra óptica de graça e ter aqui mais dez ou quinze clientes que podiam rentabilizar o investimento e ajudar a pagá-lo a curto prazo, escusando estar um dos seus clientes a fazê-lo. Isso é um trabalho que uma comissão de acompanhamento pode tentar fazer. Criar sinergias. A própria detecção da radioactividade. Existem mais instalações dentro do Eco-Parque e nem todas têm capacidade para um investimento de 30 ou 40 mil euros para um equipamento desses. Pode-se constituir aqui um cluster e tem que ser alguém que tenha uma posição isenta como uma comissão, que o promova. Ou uma associação. Poderia trazer mais valias para as empresas aqui instaladas que, por si próprias, são mais valias para a região. Fomos sobredimensionados e faz todo o sentido prolongarem-nos as licençasA diminuição da actividade económica afecta-vos directamente porque há menos resíduos industriais para tratar. Mas os CIRVER não foram sobredimensionados...Foram, foram. Como? Fomos obrigados a ter uma capacidade muito superior à necessária. Isso fazia parte do concurso. Estava no caderno de encargos. Se não cumpríssemos éramos excluídos. E cada um foi obrigado a ter capacidade para tratar o que se calculava ser a produção nacional de resíduos industriais perigosos.Quem fez esses cálculos?Sete universidades. Fizeram um estudo de mercado e calcularam que a produção média nacional de resíduos seria 250 mil toneladas por ano.E qual tem sido a média? Entre cinquenta e sessenta por cento desse valor. Sendo que cada um dos CIRVER foi obrigado a ter capacidade para a totalidade dos resíduos que se calculava serem produzidos em Portugal. Ou seja, só aqui nos dois CIRVER e tendo em atenção a média de resíduos efectivamente tratados. E há ainda as cimenteiras de Souselas e do Outão. A capacidade estimada era de 250 mil toneladas.Sim. E a capacidade licenciada pela Agência Portuguesa do Ambiente é de 600 mil toneladas. Não é preciso dizer mais nada.Para quantos anos foram licenciados?Para dez anos mas queremos a extensão da licença. Se uma instalação foi construída para receber 250 mil toneladas por ano mas só recebe 100, consegue viver mais cinco ou dez anos. Estas instalações foram construídas com recurso a crédito. A entidade financiadora diz que se a licença é de dez anos temos que pagar tudo em dez anos. Se nos estenderem a licença podemos renegociar com os bancos e baixar o esforço de tesouraria mantendo o equilíbrio das contas.Foram forçados a diminuir pessoal por causa da crise?Na Ecodeal trabalham trinta e três pessoas, vinte das quais com formação superior e não houve qualquer redução de pessoal. No SISAV trabalham 50 e já houve quatro dispensadas. Para além destas trabalham nos dois CIRVER trabalhadores de empresas subcontratadas nas áreas de limpeza, vigilância, etc.
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