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"Gosto de viver em harmonia e minimizar os problemas"

"Gosto de viver em harmonia e minimizar os problemas"

Maria Teresa Gonçalves, 62 anos, médica, Ourém

Tem consultório no centro da cidade de Ourém, onde vive e trabalha há mais de trinta anos. Especialista de Clínica Geral e Saúde Familiar, a médica Maria Teresa Gonçalves considera-se uma pessoa muito bem-disposta, que gosta de receber os amigos em casa. Procura viver em harmonia com os outros e minimizar os problemas.

Reformei-me em Dezembro de 2011 após 35 anos de serviço. Trabalhei nas instalações antigas do Centro de Saúde de Ourém e no chamado Hospital antigo, numa altura em que ainda se faziam internamentos e se recebiam doentes em estado terminal. Também dava consultas em várias freguesias como Rio de Couros, Espite e Olival. Mais tarde fui colocada em Fátima, Sobral e Seiça. Trabalhei sempre em horário completo, as 42 horas semanais, e em regime de exclusividade. Antigamente, o doente, antes de ir a qualquer lado, ia ao médico de família. Isso agora acontece cada vez menos. Sou uma especialista dentro da Clínica Geral e da Saúde Familiar. Fazia clínica geral, saúde materna, diabetes, hipertensão. Tirávamos muita gente aos hospitais. Hoje vão pessoas ao meu consultório para aviar uma receita ou pedir análises porque já não tem um médico a quem pedir. Se existir uma brecha de confiança entre o médico e o utente a relação não vai funcionar. Quando era pequena queria seguir Belas Artes. Gostava muito de desenhar e de pintar mas a minha mãe não me deixou seguir porque receava que me tornasse hippie. Aos 18 anos era a típica menina da província deslocada de casa para estudar na cidade. Sou natural de Mirandela, terra das alheiras, onde vivia. Tirei o curso no Hospital de Santa Maria em Lisboa e depois vim trabalhar para Ourém como médica à periferia. Vim para aqui porque a minha filha já tinha nascido e os meus sogros tinham raízes nos Cabaços. Estou em Ourém há 32 anos. Não gosto de andar em contra-relógio. Quando chegava ao Centro de Saúde, nunca tinha hora estabelecida para sair. Enquanto houvesse gente para atender eu ficava. Eu acho que uma pessoa pode ter horários flexíveis sem que isso afecte a produtividade. Uma pessoa que cumpra rigorosamente o horário de trabalho nunca faz nada de jeito porque está sempre preocupada com a hora de entrar e a de sair. É difícil trabalhar em meios rurais e não estabelecer relações de amizade com os doentes. Costumava dizer que era paga em géneros. Desde carne, ao peixe, aos ovos, tudo me ofereciam. No Natal ninguém se esquecia de mim. Em Seiça, eram as batatas, azeite e até um quilo de arroz e farinha no Natal para fazerem as filhoses. Nunca recusei presentes com o argumento de que o Estado não me deixava. O doente tem prazer em dar ao médico como dá ao padre ou aos vizinhos. Tenho alguns utentes que continuam a vir a minha casa e que antes de começarem a tomar comprimidos vêm perguntar se podem. Abri o meu consultório dez meses depois de me reformar. Estava habituada a ver muita gente durante o dia, cerca de 30 a 40 pessoas e, quando me reformei, esta rotina fez-me muita falta. Não consigo estar em casa sozinha. Faço preços muito baratos porque assim a crise o exige mas também porque não era com esta idade que pensava ser rica (risos). Agora tenho um horário muito flexível. Se não puder ir ao consultório não vou e quando atendo, normalmente, às 17 horas já estou em casa.Tenho quatro cães e dois gatos em casa. Adoro animais. O meu marido, com quem estou casada há 34 anos, ajuda-me a cuidar deles. Gosto muito de tratar do meu jardim e tenho uma horta onde cultivo morangos. Gosto de conversar e de estar rodeada de muita gente. Não gosto de silêncio. Tenho um grupo de amigos, verdadeiros foliões, com quem me junto ao fim-de-semana para conviver. Não gosto de me arreliar com nada. Dou a volta facilmente aos problemas. O que não tem remédio, remediado está. A minha preocupação foi sempre a de não chocar as pessoas ou ferir os sentimentos dos outros. Gosto de tratar bem toda a gente. Encaro a vida com boa disposição. Para mim, um problema grave é a Morte. Perder pessoas de família. Tudo o resto se resolve. Minimizo sempre os problemas. O meu pai lidava com a vida assim. Sou muito parecida com ele. Gosto de ir para a cama deitar-me e dormir sossegada. Se faço mal a alguém é mesmo de forma inconsciente. Só me pisam os calos uma vez. Se dou a mão não me podem ficar com o braço. As minhas filhas, neste capítulo, são o meu “anjo da guarda” e avisam-me quando sentem que há abusos. As pessoas pensam que, por sermos médicos, temos que os ajudar a resolver todos os seus problemas, mesmo os financeiros. O meu sonho maior é viajar. Gostava de ir à Tailândia visitar a minha filha que está lá a trabalhar. À falta disso, contento-me muito com Trás-os-Montes (risos). Sou fã da posta mirandesa e em Agosto levo os meus amigos às festas da minha terra.Elsa Ribeiro Gonçalves
"Gosto de viver em harmonia e minimizar os problemas"

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