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“Sem o Parque de Esculturas Vila Nova da Barquinha não teria a visibilidade que tem hoje”

“Sem o Parque de Esculturas Vila Nova da Barquinha não teria a visibilidade que tem hoje”

Fernando Freire foi eleito presidente da câmara com maioria absoluta sem fazer uma promessa

Foi militar, é advogado e foi eleito presidente da Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha nas eleições de Setembro do ano passado, depois de quatro anos como vereador. É militante socialista, católico praticante e reside na Atalaia há vinte e cinco anos. Considera-se uma pessoa com os pés assentes na terra e assume investimentos em cultura num país em que a cultura é a primeira sacrificada quando a crise bate à porta. Diz que não precisamos de mais nenhum 25 de Abril e que não podemos continuar desfasados da Europa.

O seu mandato é de continuidade. Não vai haver novidades? Vila Nova da Barquinha é um concelho extremamente limitado em termos orçamentais. Temos que ser honestos. Sem fundos comunitários não há obra. É a realidade que temos. Todos os projectos que vêm do mandato anterior têm a ver essencialmente com a possibilidade de conseguirmos apoios comunitários. Eu participei, enquanto vereador, na definição de uma política e quero dar-lhe seguimento. Toda a linha de desenvolvimento, quer em termos de regeneração urbana, quer a aposta na cultura e na arte é para continuar. O que já está aprovado em termos de fundos comunitários?Conseguimos apoio comunitário para a requalificação da Escola Básica nº 1 da Atalaia e vamos lançar o concurso. Vai ser para centro de convívio e centro de bem-estar social. Vai ser gerido pela junta de freguesia com o apoio da câmara municipal. O edifício é da câmara mas cedêmo-lo em regime de comodato à junta. Vamos avançar também com a recuperação da Escola Básica 1 de Vila Nova da Barquinha. Criar mais duas salas de exposições. Não há obras sem fundos comunitários. Tem pelo menos dinheiro para a manutenção do que está feito?Esse é um grande problema que muitos autarcas enfrentam. Quem faz um investimento numa determinada área ou equipamento, devia guardar, pelo menos, trinta por cento para a manutenção e conservação. E isso não aconteceu. Não houve essa preocupação.A Barquinha acautelou isso?Eu acho que sim. Neste momento temos uma dívida perfeitamente sustentável. São cinco milhões a pagar até 2028. É perfeitamente aceitável e equilibrado. Neste momento estamos a pagar a 15 dias aos fornecedores. Não deve haver muitas câmaras a fazer isso. Os políticos têm-se afastado das pessoas e isso nota-se na taxa de abstenção e nos votos nulos e brancos. Tem a percepção desse afastamento ou essa questão só se passa com os outros e noutros concelhos?Eu faço tudo para não me afastar das pessoas. Antes de vir para a política participava na vida associativa e continuo a participar. Estou sempre disponível para ouvir as pessoas mesmo quando sei que vou apanhar uma grande “seca” como às vezes me dizem. Na Barquinha o senhor ganhou com 47,6% mas a abstenção foi mais de 43 por cento e houve mais de 7 por cento de votos brancos e nulos. Sou dos poucos políticos locais a fazer reuniões descentralizadas de câmara. Já realizei uma e vou fazer outra em breve. É importante ouvir as pessoas e é importante que elas participam. A de Dezembro teve casa cheia. Se eu for junto das pessoas elas aparecem e participam. Mesmo num dia de semana e à hora normal de trabalho?Tentamos fazer as reuniões a uma hora em que seja possível conciliar os interesses da câmara, que não pode pagar horas extraordinárias a funcionários, com os interesses dos munícipes. Também vamos avançar com o orçamento participativo dos jovens.Orçamento Participativo dos Jovens? Porquê os jovens especificamente? As pessoas de meia idade não se irão sentir excluídas? Esse é um projecto novo. Temos que começar por algum lado. Envolver as pessoas. As pessoas aceitam melhor as decisões se forem ouvidas. Começámos pelos jovens por sentirmos que a sua adesão às questões políticas é baixa.Que tipo de projectos vão ser comparticipados? Candidaturas para construção de estradas não são elegíveis. Para equipamentos públicos também não. Só são elegíveis os que funcionem em rede. Se vir os projectos que tenho aqui são nessa vertente. Uma ciclovia que ligue o Entroncamento, Barquinha e Constância, por exemplo. Já tive oportunidade de falar acerca deles com autarcas, inclusive com alguns que não fazem parte da Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo. As pessoas têm que começar a mudar a agulha em termos de pensamento político.O senhor pode querer pensar para além do território do seu concelho e pode fazê-lo mas está amarrado ao seu município em termos de decisão. Não há nenhum poder intermédio entre o poder central e os municípios. Não soubemos adaptar-nos à nova realidade. As comunidades intermunicipais são um sub-modelo das regiões. O Estado português não sabe se há-de dar poder às comunidades intermunicipais. Se há-de delegar competências num corpo intermédio e quais as competências a delegar.Como se está a resolver essa falta de adaptação?Consultados os acordos celebrados em Bruxelas pelo Governo Português, eles reflectem o que se passa na Europa, mas depois, enxertando-os aqui em Portugal, a bota não bate com a perdigota, como se costuma dizer. Até quando vai durar esta situação?Toda a gente está chocada agora porque, aqui d’el rei, os privados também vão participar nalgumas decisões no âmbito do Quadro Comunitário 2014/2020. Porque vão também definir quais são os projectos elegíveis para fundos comunitários. Faz todo o sentido que as empresas; as colectividades e os grupos de acção social se pronunciem sobre determinado tipo de investimento para o território, no âmbito de uma democracia participativa, mas vai haver um choque. Acredita ser possível mudar a agulha, como diz?Está tudo no acordo de parceria que o Governo assinou em Bruxelas. Está na página 253. Um modelo de governança partilhado. Mas chega-se à lei à 75/2013 e não vem lá nada. A nossa realidade política não encaixa na realidade que é transmitida da Europa para aqui. Ou a gente se adapta à Europa ou não vai ter direito a fundos. Essa visão da região esbarra com a nossa realidade. A replicação de investimentos em municípios vizinhos e por vezes no mesmo município tem prevalecido sempre. A realidade mudou. No Quadro 2014/2020 isso não é possível. Filho de um mineiro e de uma trabalhadora ruralO presidente da Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha, Fernando Manuel dos Santos Freire, reside naquele concelho, na freguesia de Atalaia, há 25 anos. É casado e tem um filho. Advogado com escritório em Lisboa, exerceu aquela profissão até entrar para a câmara há quatro anos, onde foi vereador com o pelouro da Cultura, entre outros. Durante o tempo que trabalhou em Lisboa, viajava diariamente de comboio entre o Entroncamento e a capital.Filho de gente humilde, nasceu em Oleiros, distrito de Castelo Branco, a 2 de Fevereiro de 1960. O pai era mineiro e trabalhava nas minas da Panasqueira, a mãe trabalhava no campo. Tem dois irmãos mais velhos. Depois de fazer a instrução primária estudou até ao antigo quinto ano, no Seminário de Beja de onde saiu em 1974. É cristão convicto e católico praticante. Trabalhou na sua terra natal como empregado comercial até 1981 quando ingressou na Força Aérea onde esteve vinte e quatro anos. Durante esse tempo licenciou-se em Direito e abriu entretanto escritório em Lisboa. Actualmente é militante do Partido Socialista mas não tinha qualquer filiação partidária até entrar na política activa.“Vivo bem com a crítica e respeito” Atende os seus munícipes às segundas-feiras a partir das duas da tarde. Qual o assunto que mais vezes lhe é colocado?Há diversos assuntos que me são colocados mas não há dúvida que os pedidos de emprego estão em primeiro lugar.Um cargo político tem exposição pública e está sujeito a críticas. Como lida com isso?Quem estudou liderança e passou pela advocacia, como é o meu caso, habitua-se a estar sujeito a determinado tipo de contraditório. É bom é que os fundamentos de qualquer decisão sejam sempre analisados por quem decide, para que se decida em consciência. Vivo bem com a crítica e respeito quem critica. Faz-nos falta outro 25 de Abril? Outro 25 de Abril? Para quê?! O 25 de Abril é um acontecimento histórico. Levou à implementação do regime democrático em Portugal. Eu não conheço um regime melhor que este. Se há defeitos não são do regime mas dos homens. Tinha 14 anos quando se deu o 25 de Abril. Não tinha idade para se envolver directamente no que se passou na altura. Mas ao longo da minha vida sempre liguei muito às forças democráticas. Posso dizer-lhe que, como advogado, fiz a reconstituição de carreiras de muitos dos militares que participaram, quer no 11 de Março, quer no 25 de Novembro. Tenho a honra de ter no meu arquivo, embora coberto pelo sigilo, muita história relacionada com o 25 de Abril.Como vai ser comemorado o 25 de Abril em Vila Nova da Barquinha?Como nunca foi comemorado no concelho. Vai ser de 23 a 27. Vou envolver colectividades, escolas. Vou trazer militares e políticos que participaram na transição para a democracia, alguns dos quais foram hostilizados na sequência dessa transição, para ajudarem, principalmente os mais novos, a perceber o que foi esse momento da nossa história recente. O senhor, enquanto militar, aposentou-se aos 44 anos de idade. Sente-se confortável quando olha para quem tem que esperar pelos 66 anos para se reformar? Eu digo a toda a gente que beneficiei de uma injustiça, mas não fui eu que fiz a lei. Como autarca, optou pela pensão ou pelo vencimento de presidente de câmara?Optei pelo ordenado mas é ela por ela. O meu vencimento líquido deste mês foi dois mil e cinquenta euros. Face à maioria da população é muito, mas face ao trabalho que um autarca tem não é assim tanto. Se o senhor pensasse que fazia todo o sentido a união dos concelhos da Barquinha e do Entroncamento, o que lhe acontecia se o defendesse publicamente?Provavelmente era crucificado. Em termos dos concelhos, e fazendo um estudo comparado em termos da União Europeia, não temos concelhos a mais. Mas esta é uma matéria sensível. Tem a ver com valores das próprias pessoas e com a nossa identidade como povo. O poder político ou trata isto com bom senso ou vamos ter problemas muito complicados. Investir em cultura num país em criseO parque das esculturas foi polémico. Tratou-se de um investimento de quase um milhão de euros em cultura num país onde a cultura é a última prioridade. É um projecto ambicioso mas sustentável. O orçamento do município só suportou 15 por cento do total investido. Com esse dinheiro conseguimos recuperar todo este edifício onde está a funcionar a Galeria de Arte, recuperar o centro cultural e o posto de turismo, recuperar o centro de estudos e arte contemporânea que neste momento está a funcionar com cerca de 70 alunos, em parceria com o Instituto Politécnico de Tomar, e valorizamos o próprio parque. Que retorno teve esse investimento? Temos um investimento privado de um milhão e duzentos mil euros para a construção de duas casas de turismo, junto do centro cultural, com oferta de 27 camas. Vai entrar em obras um projecto ao lado da câmara, também de turismo rural, que permite dotar o município de alojamento que não tinha, para além de termos na vila casas antigas em restauro. Isto em termos económicos. Há outro tipo de retorno. Neste momento estão a decorrer duas exposições de âmbito nacional. Uma aqui na Galeria de Arte, do artista Rui Sanches, e outra lá em baixo na Ordem dos Arquitectos, ambas são patrocinadas pela Fundação EDP. Se não tivéssemos apostado no parque de esculturas, provavelmente não teríamos esta qualidade nem a visibilidade que temos.
“Sem o Parque de Esculturas Vila Nova da Barquinha não teria a visibilidade que tem hoje”

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