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Uma banda filarmónica centenária onde impera a juventude

Uma banda filarmónica centenária onde impera a juventude

Associação Filarmónica 1.º de Dezembro Cultural e Artística Reis Prazeres, de Vilar dos Prazeres, Ourém, comemora cem anos de existência a 14 de Abril. Uma agremiação que tem muitas histórias para contar, como a do maestro assassinado à paulada.

Chamavam-lhe “El Risco” mas ninguém sabe dizer se era nome ou alcunha popular. No final dos anos 20, era o maestro da “Banda da Charneca”, fundada em Vilar dos Prazeres, Ourém, a 14 de Abril de 1914. Numa noite escura, abandonou por momentos a sala de ensaio, junto à capela, para satisfazer as necessidades fisiológicas quando foi atacado à paulada por dois rivais da banda, que se encontravam à espreita por detrás de um plátano. Morreu. Esta é apenas uma das muitas histórias que envolvem aquela que, na década de 50, se viria a chamar Associação Filarmónica 1.º de Dezembro Cultural e Artística Reis Prazeres por ter sido apoiada por uma família abastada da terra com esse apelido. A história macabra ainda não consta do espólio escrito da colectividade mas a actual direcção, que tomou posse em 10 de Janeiro, apesar de não saber muitos pormenores, atesta a sua veracidade. O MIRANTE ouviu-a da boca de Tiago Faria, 86 anos, que integrou esta banda durante mais de cinquenta anos tocando. Teria poucos anos de idade quando a mesma se passou mas ouviu-a muitas vezes do pai, Abel Rodrigues Faria. “Sei que foi o meu pai que deu com ele, já morto, no chão. Levaram-no para minha casa e a minha mãe andou semanas a raspar com uma plaina o sangue que ficou impregnado no soalho de madeira”, conta de memória lúcida. Devido ao crime a filarmónica esteve sem tocar durante seis ou sete anos. “Puseram dois indivíduos inocentes na cadeia e só depois de serem soltos é que descobriram o verdadeiro assassino”, acrescenta o antigo músico. E como? “Ele batia na mulher e, certa vez, ela gritou se ele lhe queria fazer o mesmo que ao maestro da Charneca. Foi assim que o denunciou”, conta.Apesar de centenária a Associação Filarmónica 1.º de Dezembro Cultural e Artística Reis Prazeres conta actualmente com cerca de 45 músicos e todos apresentam um nível de idades muito baixo. A própria maestrina, apesar de conduzir a banda há oito anos, é bastante jovem. Virgínia Duarte Vieira tem 31 anos e antes de segurar a batuta tocou na banda. Fez o Conservatório até ao 8.º grau, tirou um curso de Letras pelo meio e, neste momento, está a tirar a licenciatura de Direcção de Orquestra de Sopros, em Lisboa. “O meu instrumento agora é a orquestra”, atesta. A direcção, que vai liderar os destinos da colectividade durante dois anos, é presidida por Armando Eugénio e composta por João Antunes, Madalena Faria, Francisco Vitorino, Inês Reis, Vítor Gaspar, Catarina Antunes e Ana Cecília Rebelo. Todos são oriundos de Vilar dos Prazeres e trabalham na colectividade “por amor à camisola”, tendo a maioria filhos na filarmónica.Nascida da rivalidade entre músicosA Filarmónica 1.º de Dezembro nasceu de uma rivalidade entre músicos, que se passou no tempo em que Vilar dos Prazeres ainda se chamava Charneca de Ourém. Seis músicos tocavam numa banda do Castelo de Ourém (Banda Filarmónica Oureense) e decidiram sair, o que não foi muito bem visto. Para levar a sua avante, os músicos fundadores contaram com o apoio de uma família muito abastada, os Prazeres, que os ajudou a pagar com a indumentária e instrumentos. Dos seis rapidamente passaram a vinte e sete elementos necessários e decidiram colocar o nome 1.º de Dezembro porque a primeira actuação pública coincidiu com essa data no calendário. Em 1972, foram aprovados os estatutos da banda que sobrevive através das receitas provenientes das actuações em festas e romarias e dos donativos de instituições e população. As deslocações são feitas nos próprios carros dos músicos e a colectividade só recorre ao aluguer de um autocarro quando a saída é mais distante. Actualmente, a Filarmónica 1.º de Dezembro conta com o apoio de cerca de 280 associados e a sua principal dificuldade passa por manter os jovens músicos na banda ao longo do tempo, uma vez que muitos acabam por sair por volta dos vinte ou trinta anos, devido às próprias circunstâncias da vida. Abílio Reis, 62 anos, toca trompete na Filarmónica há mais de cinquenta anos. De aventuras e desventuras que já viveu, o que lhe toca mais no coração foi o facto de aos 19 anos, por ser músico, não ter ido à Guerra Colonial por se ter oferecido para integrar a Banda Militar do Regimento de Infantaria 15 em Tomar. “O mais importante para nós é levar o nome da nossa aldeia longe e engrandecer a nossa cultura. Toda esta linguagem musical é incrível e tem um valor extraordinário para uma aldeia pequena como a nossa”, atesta.Dois dias de festa assinalam o centenárioPara assinalar o centenário, a Associação Filarmónica 1.º de Dezembro Cultural e Artística Reis Prazeres preparou um programa de dois dias, a concretizar no fim-de-semana de 12 e 13 de Abril. As festividades estão marcadas para sábado, 12, pelas 15h00 com uma caça ao tesouro. Pelas 20h00 realiza-se uma sessão de danças e cantares lagoenses, seguindo-se uma hora mais tarde a animação musical a cargo do duo Abílio e Augusto Silva (Ex-Ninfa). No domingo, 13 de Abril, as comemorações iniciam-se com uma missa, pelas 09h45, seguindo-se uma romagem ao cemitério seguida do descerramento de uma placa comemorativa. Pelas 12h30, realiza-se um almoço convívio no pavilhão do Vilar, após o que tem lugar a projecção de fotografias que mostram alguns momentos dos cem anos de história da colectividade. Pelas 16h00 actua a Banda Filarmónica Gualdim Pais, seguindo-se uma hora mais tarde o concerto da Filarmónica 1.º de Dezembro. Pelas 19h00, tem lugar um lanche convívio aberto à comunidade onde não falta o porco no espeto. As celebrações terminam com um concerto, pelas 21h00, pela orquestra Ourearte, com a animação a prolongar-se pela noite com o duo musical Rui Sérgio e José António Santos.
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