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“Neste país começou a dar-se importância à agricultura tarde demais”

“Neste país começou a dar-se importância à agricultura tarde demais”

Mário António Rodrigues, 37 anos, administrador da Frutalmente, Vila Franca de Xira

Casado, pai de duas meninas, Mário Rodrigues é um homem que cresceu no mundo agrícola. Quando era criança ajudava o pai nas colheitas e desde cedo se começou a imaginar como empresário agrícola. Licenciou-se em Santarém e tem três empresas, entre elas a Frutalmente, que se dedica principalmente à produção e comercialização de uvas de mesa. Dorme com as empresas e nunca tira férias.

Digo, a brincar, que nasci debaixo de uma cepa. Desde pequeno que trabalho no campo e aos sete ou oito anos já o meu pai me metia em cima de um tractor para fazer searas de meloa. Aos 14 já comandava um grupo de vinte homens. Na agricultura passei por tudo. Até fui camionista e carreguei fruta. Mas fez-me bem. Aprendi. É mais fácil ser empresário quando se faz um percurso como o meu. Conseguimos perceber o que está do outro lado e o que custa. Isso é importante para liderar. Nasci em Vila Franca de Xira e assim que comecei a estudar escolhi a área da agricultura. Quando acabei o curso de Engenharia Agrícola em Santarém abri a minha primeira empresa, a Rodrifrutas, que ainda hoje existe. Actualmente sou responsável pela Rodrifrutas; a Frutalmente e a Tomar os Comandos que é uma empresa que presta serviços de mão-de-obra especializada para colheitas e actividades agrícolas. Durmo com as empresas e nunca tiro férias. De há dois ou três anos para cá só tiro um fim-de-semana, ou dois ou três dias durante a semana, esporadicamente, para descansar. Este ano decidi estar uma semana de férias no Algarve e tive de vir duas vezes à empresa. Tenho sempre o telemóvel ligado. Gosto muito de praticar tiro desportivo com armas de caça. É nessas alturas que me abstraio de tudo. Enquanto estou lá, junto dos amigos, nem dou pelo tempo passar. Também gosto do Benfica e sempre que o clube joga em casa tento ir ver os jogos. Grito, ralho, aplaudo. Liberto as energias (risos).A minha mulher fica ciumenta por eu passar tanto tempo na empresa. Quando começa a campanha diz por brincadeira que chegou a minha "namorada". Mas ela também vive os problemas das empresas e até trabalha numa delas. Está sempre presente, é um grande apoio e compreende que é preciso dar o litro. Sou um apaixonado e um romântico. Sou apaixonado por aquilo que faço e meto muito romantismo naquilo que desenvolvo. Não me imagino fechado num escritório a tratar de papelada. É aliciante vender o nosso produto e é gratificante vê-lo nas lojas. A Frutalmente é uma organização de produtores de uva de mesa de elevada qualidade. Também trabalhamos com figo fresco, alperce, pêssego e paraguaio. Somos a primeira organização do país de produtores de uva de mesa. Vendemos três milhões de quilos por ano/campanha. Vendemos para todas as grandes superfícies do país e estamos actualmente a ter muitas solicitações para exportação.Não me lembro da última vez que fui ao cinema. Quando posso alugo um filme e vejo em casa. Gosto muito de cinema e era capaz de ver dois ou três filmes por dia. Gosto de filmes de acção, com enredo e virados para a realidade. Não gosto de filmes de ficção científica. Para ver um filme gosto de estar sozinho, descansado e sossegado. Posso vê-lo com a minha mulher, mas não pode haver interrupções nem distracções. Gosto de estar inteirado no filme. Gosto de estar com as minhas duas filhas. Aos fins-de-semana, todos os bocadinhos que tenho tento passá-los perto delas. Claro que gostaria de estar mais tempo, mas nesta época de campanha é complicado. Elas são o meu orgulho e logo que cheguem as outras campanhas já volto a ter mais tempo para estar com elas ou ir buscá-las à escola.O nosso país começou a dar importância à agricultura tarde demais. A agricultura nunca foi uma prioridade e os empresários agrícolas sempre foram vistos de lado. Com a crise da construção e as dificuldades do país é que começaram a dar-nos valor. Os políticos só agora se aperceberam que este ramo - que quase deixaram morrer - é o sustento dos países. Mas ainda é mais difícil ser um bom empresário agrícola em Portugal do que noutro país da União Europeia. Temos elevados custos de produção, transporte, electricidade, mão de obra e consumíveis. É como estarmos a participar numa corrida com 10 quilos de lastro logo na grelha de partida. Mas mesmo assim conseguimos competir, o que significa que os nossos empresários são bons naquilo que fazem. Se tivessem mais ajuda e estivéssemos num patamar de maior igualdade seria ainda melhor.Não me vejo reformado e espero estar nisto durante muito tempo. Sou um empresário ambicioso e destemido, que gosta de arriscar. Os outros gerentes, muitas vezes, têm de me refrear os ânimos. Mas eu também não faço nada sem a opinião de todos e quando tenho uma ideia tento expô-la da melhor forma. Da escola agrícola de Santarém guardo as melhores recordações. Foram os melhores anos que tive até hoje. Estive lá dez anos, fiz o curso ao meu ritmo e tirei muitas lições de vida. Estudava e muitas vezes não ia aos exames porque estava no campo a ajudar o meu pai. Naquele tempo eu já era uma pessoa muito activa e dinâmica que gostava de estar envolvido também em várias actividades da escola, como a associação de estudantes.Filipe Matias
“Neste país começou a dar-se importância à agricultura tarde demais”

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