O maior divulgador de hóquei do Ribatejo nem sequer sabe andar de patins
Francisco Gavancho alimenta o seu “Cartão Azul” há sete anos e tem ideias sobre a modalidade
No futebol qualquer adepto sabe dar um pontapé na bola mesmo que chute para onde estiver voltado ou marque golos na própria baliza. No hóquei em patins já não é tão fácil ser adepto e praticante. É que manter o equilíbrio em cima de uns patins ao mesmo tempo que se tenta dar sticadas numa bola minúscula não é para todos. Mas não é por causa disso que a modalidade deixa de ter grandes apaixonados.
Quem quer saber tudo, ou quase tudo, o que se passa a nível do hóquei em patins da região, tem que, forçosamente, consultar o Blog “Cartão Azul” ou a página do Facebook com o mesmo nome. Os jornais desportivos nacionais praticamente não dão notícias da modalidade. Alguns jornais e rádios locais, principalmente os que estão sedeados em terras onde há equipas de hóquei, tentam dar o máximo de informação mas têm outros assuntos para tratar e não podem concentrar-se numa única modalidade. O Cartão Azul é o único espaço informativo online especializado em hóquei. Ali não entra mais nada. A fundação do blog aconteceu a 1 de Março de 2007. O criador é um Sargento Chefe da Armada, especialista em comunicações que, apesar de nem sequer saber andar de patins, tem uma paixão imensa pelo hóquei. Cresceu no Entroncamento, na rua Abílio César Afonso, junto ao União do Entroncamento, uma colectividade com uma longa ligação à modalidade. Enquanto criança viu jogar os melhores a nível distrital e nacional. “Lembro-me de ver jogar o Livramento”, recorda. Apesar dessa paixão, foi o futebol que o atraiu como praticante, tendo jogado vários anos em equipas do Entroncamento, Atalaia e Moita. Quando o filho Nuno, actualmente com 24 anos, começou a jogar hóquei no União, o gosto pela modalidade ganhou novo fôlego. “Ele jogou dos 6 aos 18 anos, sempre no União, mas depois foi forçado a parar devido a uma lesão num joelho. Mas a minha paixão pelo hóquei em patins não nasceu por causa dele. Em criança já eu ia ver jogos”, explica, acrescentando que hoje em dia interessa-se mais por aquela modalidade do que pelo futebol.O “Cartão Azul” dá notícias regulares sobre resultados, calendários de jogos, transferências de jogadores e de treinadores e alterações directivas nos clubes. Publica ainda entrevistas, crónicas de jogos, comentários críticos em rubricas como “Paparuco” e “Treinador de Bancada”. O lema da página online é: “Falar de Hóquei em Patins com Sotaque Ribatejano”. O jogador Miguel Dantas, entrevistado para o blog há algum tempo, disse que o hóquei é cada vez mais um desporto “da internet”. O “Cartão Azul” e outros espaços do género, alimentados por apaixonados pela modalidade, dão-lhe razão. “Se pegarmos num jornal desportivo aparece uma ou outra breve sobre hóquei nas últimas páginas, quando aparece. Transmissões televisivas são raras e a maior parte em canais de clubes no Cabo, com a agravante de uns serem difundidos por uma operadora de telecomunicações e outros por outra. Alguns jornais e rádios locais vão dando alguma informação mas não podem alargar-se porque o espaço é pouco e têm mais assuntos para tratar”, lamenta Francisco Gavancho. E acrescenta que “a maior parte da informação sobre hóquei passa pela internet mas mesmo assim há dirigentes de clubes, felizmente poucos, que boicotam blogs porque só querem notícias favoráveis”, critica.Foi quando a internet começou a ser mais acessível que a informação especializada começou a ganhar terreno. “Em 2006 estive numa operação durante seis meses na Fragata Vasco da Gama. A minha fome de informação relativamente ao hóquei era parcialmente saciada quando, nas horas vagas, acedia a alguns blogs de hóquei que já existiam. O Miguel Serra, que agora é director do União, tinha um. E havia outros de outras zonas do país, como acontece agora. Foi depois disso que arranquei com o “Cartão Azul”. Inicialmente tive a ajuda de quem já estava na internet. Do Pedro Jorge Cabral, de Ponta Delgada, por exemplo, que é, para mim, o maior divulgador da modalidade a nível nacional, ou do Nelson Alves, de Avanca (Aveiro) que também tinha um blog”. Uma paixão ocupa muto tempo ao apaixonado. Os adeptos do hóquei ficaram a ganhar com o surgimento do “Cartão Azul”. A família de Francisco Gavancho ficou a perder. “A minha esposa (Lídia), com quem estou casado há 26 anos, ficava zangada comigo e com razão. Ela é da Lagoa do Furadouro, ao pé de Ourém. Íamos lá aos domingos e assim que lá chegávamos eu já estava com pressa de vir para casa para actualizar o blog. Nunca me canso de lhe agradecer a paciência e a compreensão que teve e continua a ter. E faço-o também publicamente. Inclusivamente em alguns textos que coloco no blog. Para além de eu ser marinheiro com as consequências que isso tem para a vida familiar, por passarmos muito tempo longe, eu ainda roubava à família quando não estava de serviço”, penitencia-se. A situação melhorou um pouco quando o filho foi praticante. Nessa altura, Francisco, a esposa e a filha Carolina, que tem hoje 17 anos, iam ver jogos juntos.“Não consigo dizer bem de um jogo que correu mal”O trabalho de actualização do “Cartão Azul” é apenas de Francisco Gavancho, embora tenha amigos que lhe cedem fotos e outros que lhe enviam informação. Diz que gostava de ter um patrocinador mas que nunca conseguiu arranjar nenhum. Refere que, nestes sete anos de existência, teve um milhão e cem mil visitas, publicou cinco mil notícias e doze mil comentários de seguidores. Quatro mil foram recusados devido à linguagem utilizada. Vai ver jogos de hóquei sempre que pode, escolhendo normalmente os mais importantes ou os que se disputam mais perto do local onde se encontra. Mostra ao jornalista um cartão da Federação Portuguesa de Patinagem que lhe permite a entrada gratuita. Para além do blog e Facebook colabora por carolice nalguns programas de rádios locais e escreve para jornais regionais. Admite que é “persona non grata” para alguns dirigentes mais sensíveis às críticas mas diz que não está no seu feitio dizer bem de algo que correu mal. Reconhece que o hóquei em patins perde “espectacularidade” na televisão mas acha que isso pode ser compensado com melhores comentadores. “A Federação devia insistir com os poucos canais que transmitem hóquei para escolherem comentadores que ajudem os espectadores a perceber melhor a modalidade. Parafraseando o seleccionador nacional, Carlos Séneca, a maior parte dos comentários, se fossem cotados por uma agência de rating eram lixo. No futebol também há maus comentadores mas não é tão grave porque a maioria das pessoas sabe o que se está a passar em campo e a modalidade é mais espectacular”, defende.Lamenta que a Federação não consiga que os canais de televisão fora do cabo transmitam mais jogos e que não haja jogos importantes em mais zonas do país. “O hóquei não se joga em todo o país. A Federação tem optado por fazer uma série de eventos na Mealhada e as selecções nacionais fazem estágio no Luso. Este ano falou-se que o inter regiões seria feito em Tomar. A Associação de Patinagem do Ribatejo estava preparada, a secção juvenil do Sporting de Tomar ia apoiar. Infelizmente, à última hora, o Presidente da Federação disse que ia ser na Mealhada, onde foi o ano passado. Foi pena”. Elogia o trabalho dos clubes da região e chama a atenção para o facto de alguns terem hóquei em todos os escalões. “Optaram, em boa hora, por fazer um campeonato regional com equipas de Lisboa, Leiria e Ribatejo. Isso proporciona mais contactos entre jogadores e equipas. Ajuda a melhorar. As equipas do Ribatejo estão a fazer uma excelente trabalho que só não é melhor porque muitos jovens vão estudar para Lisboa, Coimbra, Porto e acabam a jogar em equipas dessas zonas do país.Lamenta que em matéria de transferências tenha acabado a compensação que era dada aos clubes que tinham formado os atletas. “Não se compreende que esse investimento em formação não tenha retorno como acontecia antes e continua a acontecer noutras modalidades. O iluminado que avançou com essa ideia errou. Agora até os clubes grandes já se queixam porque também formaram miúdos que vão para outros clubes. Espero que venha a haver mudança a esse nível”, refere. O alentejano que só passou 27 dias no AlentejoChama-se Francisco Gavancho, enche o peito de ar para dizer que é “Alentejano de Alpalhão, concelho de Niza e Distrito de Portalegre”, mas vai-se a ver e afinal de alentejano tem o local de nascimento e 27 dias de permanência na terra. Filho de um ferroviário, o bebé Francisco passou os 19 meses seguintes em Abrantes, antes de rumar definitivamente ao Entroncamento onde estudou, casou, criou os filhos e ainda vive.Para além do gosto pelo hóquei em patins, sempre gostou de comunicações. Teve um programa semanal na Rádio Voz do Entroncamento até ir para a Marinha, em 1985. “Chamava-se ‘Para acabar de Vez com a Loucura’. Era aos Sábados de manhã”, lembra. “Comecei a minha carreira como Grumete e hoje sou Sargento Chefe da Armada. Tenho muito orgulho em servir o meu país, servindo a Marinha”, afirma. Para descontrair das horas que passa sentado no exercício da sua actividade profissional, faz desporto, nomeadamente caminhadas.
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