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“Fui eleito para cuidar de Santarém e não da minha carreira política”

“Fui eleito para cuidar de Santarém e não da minha carreira política”

Em vésperas de mais umas Festas de São José, o presidente da Câmara de Santarém faz um balanço do actual mandato, responde a algumas questões sobre a actualidade do concelho e fala também do passado recente. Ricardo Gonçalves lamenta não ter feito mais, devido às restrições financeiras, e diz que o político com imagem de bom rapaz também sabe dar murros na mesa.

João CalhazO seu lema na última campanha eleitoral foi “Cuidar de Santarém”. A oposição e a voz popular acham que a cidade e o concelho não têm sido muito bem tratados, nomeadamente no que toca à limpeza e recolha de lixo. Acha essas observações justas? Usei esse mote porque achei que estava adequado às necessidades do município e do país, pois não há dinheiro para grandes obras. Vivemos um processo colectivo de dificuldades a que acresce uma legislação que é um espartilho, como a Lei dos Compromissos, que não nos permite fazer muita coisa. E recordo que quando fiquei como presidente da Câmara de Santarém, há dois anos atrás, a dívida do município era de 100 milhões de euros. Hoje está nos 75,8 milhões.Isso provavelmente também à custa da deterioração de alguns serviços, como os de higiene e limpeza. É aí que quero chegar. Temos dificuldades financeiras e nunca as escondemos. Quanto à limpeza, esta semana fizemos uma série de alterações nesse pelouro, com contratação de mais pessoal. O espartilho legal com que nos confrontamos impediu os municípios de contratarem pessoas. É um problema que vai ser ultrapassado com a entrada dessas pessoas. O cuidar de Santarém está no nosso íntimo e é isso que queremos fazer.Outra crítica que fazem ao seu executivo é a de deixar arrastar demasiado os problemas. A questão da instabilidade das barreiras, por exemplo, não merecia uma posição mais assertiva da sua parte junto do Governo? Tenho reunido com ministros e temos sido uma voz activa. Tenho reclamado e no próximo congresso da Associação Nacional de Municípios vou fazer uma intervenção sobre o processo das barreiras, entre outras coisas. Quero que os meus colegas autarcas que se deparam com problemas semelhantes vejam a demora que muitas vezes há do poder central relativamente a questões que são importantes. Mas é bom recordar que em 2012, quando ninguém falava deste assunto, convidei todos os deputados do distrito, ministros e secretários de Estado com influência nesta matéria a estar presentes numa reunião.E o que resultou disso? Isso levou a que em 2013 houvesse uma nova resolução na Assembleia da República chamando a atenção para o problema e reclamando soluções. Depois houve o deslizamento das barreiras em Agosto de 2014 que levou à interrupção da EN 114. Mas a estrada, temos que o dizer, não é do município, é da Estradas de Portugal.Mas as consequências dela estar fechada ao trânsito afectam a população de Santarém e de outros concelhos e tem também efeitos nefastos sobre o movimento para o próprio comércio da cidade. É verdade e tenho chamado a atenção do Governo para essa realidade. Inclusivamente pedi uma audiência ao senhor primeiro-ministro para que a situação seja resolvida o mais rapidamente possível. Estamos a acertar agendas para nos podermos encontrar. As pessoas de Santarém não podem estar à espera que a questão se arraste muito mais e o anúncio de uma solução venha a ser confundido com uma atitude politico-partidária em vésperas de campanha eleitoral. É uma questão urgente. Aliás, o próprio ministro do Ambiente já disse que conhecia muito bem o problema de Santarém. Se o conhece, então espero que o resolva o mais rapidamente possível.Tem falado em retirar consequências políticas desse processo caso não haja soluções. Que medidas pensa tomar caso se prolongue este impasse? Espero que este impasse não se prolongue. Pode entregar o cartão de militante do PSD, como já foi falado? Essa é uma questão que, a qualquer momento, um militante pode ponderar. Sá Carneiro está muitas vezes presente nos discursos dos políticos do PSD, mas se há coisa que Sá Carneiro sempre disse é que primeiro estava o país e depois estava o PSD. Eu também digo: primeiro está Santarém e só depois está o PSD. Neste momento, para mim o cartão de militante, sendo presidente do município, é uma coisa menor. A coisa maior são os grandes problemas de Santarém. E o das barreiras é um deles.Insisto: que consequências políticas pensa retirar deste processo caso as coisas continuem como estão?Não vou dizer agora quais são, porque estaria a retirar o impacto caso tenha de tomar essa atitude.E há algum prazo estipulado da sua parte? Espero que dentro de um ou dois meses essa questão esteja resolvida no que toca à apresentação de um modelo de financiamento para as necessárias obras.Mais tribunais na cidade judiciáriaOutro processo que se tem arrastado é o das antigas casas dos oficiais da Escola Prática de Cavalaria, cuja degradação se vai acentuando. Como foi possível a administração municipal deixar esse património chegar àquele estado? Eu pergunto como é que o Estado português deixou aquele património chegar àquele estado. Quando o município de Santarém adquiriu aqueles imóveis, eles já estavam completamente degradados…Isso foi por volta de 2011 e a verdade é que a degradação se acentuou claramente desde aí. Claro que acabaram por se degradar mais com o passar do tempo. Neste momento estamos a preparar o processo para levar uma parte daqueles edifícios a hasta pública, temos outro dos blocos com um programa que já anunciamos e temos ainda um projecto com o Instituto Politécnico de Santarém para ocupação de outra parte. E que projectos há para o antigo quartel da EPC? Dentro da chamada cidade judiciária vamos ter mais tribunais, mais competências. O município de Santarém sabe que há intenção de criar um tribunal arbitral desportivo e o que fizemos foi demonstrar ao Ministério da Justiça, ao Comité Olímpico Português e ao secretário de Estado do Desporto que podemos disponibilizar imóveis para esse fim.Continua a luta também pela criação de um Tribunal Administrativo e Fiscal em Santarém? Essa também é uma matéria que está em cima da mesa.Tem-se falado nos últimos tempos na possibilidade de construção de um crematório na cidade. Como está o processo? O processo está concluído e em breve irá a reunião do executivo.Existe a possibilidade de construção de um equipamento semelhante no Médio Tejo e ter dois crematórios na região seria demasiado. Santarém não corre o risco de ser ultrapassada nesta questão? Pelo contrário. Houve algumas empresas que nos contactaram para saber se iríamos avançar com o processo porque preferiam Santarém a outras soluções propostas no distrito, pela sua localização e acessos. Adesão à Águas do Ribatejo na agendaA empresa municipal Águas de Santarém é para continuar ou a adesão à Águas do Ribatejo está na agenda? A Águas de Santarém tem tido um comportamento muito bom. Mas não podemos esquecer que tudo o que é supramunicipal envolve uma economia de escala que pode trazer benefícios. Se vier a verificar-se, de acordo com o estudo que está a ser preparado pela Comunidade Intermunicipal da Lezíria do Tejo, que o município de Santarém conseguirá baixar a factura a cerca de 70% dos seus munícipes e ter a mesma eficiência no serviço, um decisor político terá que ponderar essa entrada. Se essas condições se verificarem, defendo a adesão à Águas do Ribatejo. Isto está falado com a actual administração da Águas do Ribatejo.Que implicações poderia essa medida ter ao nível dos funcionários da Águas de Santarém? Seria um processo fácil. Os funcionários passariam para a Águas do Ribatejo, mantendo-se nos mesmos lugares e a fazer as mesmas coisas. Só mudaria a entidade empregadora. Não implicaria despedimentos e até, possivelmente, traria acréscimos remuneratórios.Está preparado para ouvir as críticas da oposição, nomeadamente do PS que sempre defendeu essa opção? Ninguém tem verdades absolutas. Se estivermos mal devemos voltar atrás. Mas não sei o que o estudo contratado pela Comunidade Intermunicipal vai apontar. Até pode dizer que é melhor estarmos sozinhos no sector da água e saneamento básico. Mas se for bom para os munícipes de Santarém devemos decidir nesse sentido. O presidente da câmara fará sempre escolhas criteriosas.Então explique-nos lá uma escolha sua que se prende com a contratação de uma directora financeira para a Águas de Santarém. Por que razão tomou essa decisão agora? Do ponto de vista financeiro não tínhamos pessoas que na, minha opinião, pudessem fazer o trabalho que é necessário ser feito. E porquê agora? Foi no início de 2015 e também contratámos pessoas para o Teatro Sá da Bandeira. Esperámos pelo início do ano para entrar uma série de pessoas e vão entrar mais. Se repararem, os vereadores Luís Farinha e Inês Barroso não têm secretários políticos e se calhar essas pessoas também vão entrar agora, porque, passado um ano e meio de mandato, verificámos que fazem falta. O município tem actualmente cerca de 900 funcionários, contando com as empresas municipais, quando há uns anos só a câmara tinha cerca de mil. Nós necessitamos de mais pessoas. Mas pelos vistos até agora a Águas de Santarém não necessitava de uma directora financeira. O que se alterou? Se os lugares existem nos organogramas é porque são necessários e, como tal, devem ser preenchidos. Tenho dito desde a primeira hora que o município de Santarém tem falta de pessoal e a DGAL (Direcção Geral da Administração Local) deve ter a mesma opinião, pois permitiu-nos contratar.Capital no CNEMA é para vender quase na totalidadeA actual participação da CMS no capital social do Centro Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas (CNEMA), cerca de 19%, é para manter? O município de Santarém quer vender as suas participações no CNEMA e na Escola Profissional do Vale do Tejo, ficando só com uma participação residual de 3%. Qual é a intenção: encaixar capital ou alijar responsabilidades quanto à administração dessas entidades? Se o município não manda nessas entidades, como é o caso, então acho que deve ter participações mínimas.Ter uma participação simbólica ou não ter não é a mesma coisa? Poderemos ter assento nos órgãos sociais e assim saber o que se passa. Sendo o município um parceiro privilegiado destas entidades, acho que é importante fazer parte delas, embora com participação residual. E com a necessidade que temos de dinheiro, acho que a medida a seguir é esta. Está contemplada no orçamento do município para 2015.Tem ideia de qual é o encaixe de capital previsto com a alienação dessas participações? No caso do CNEMA rondará os 2 milhões de euros e em relação à Escola Profissional andará pelos 300 mil euros. Mas não tenho presente de memória. Acha que vai haver interessados? Não sei! Primeiro será dada preferência aos actuais accionistas e depois, caso não haja interessados, essa venda poderá ser aberta ao exterior. Como estão as relações com o CNEMA actualmente? O município tem assento no conselho de administração e há uma relação institucional com o CNEMA. Mas não fará sentido, na minha opinião, o município ter uma participação grande no capital quando a sua capacidade de decisão é reduzida.“Dou murros na mesa sempre que for necessário”A questão do estacionamento tarifado em Santarém envolve processos judiciais de parte a parte, com pedidos de indemnização milionários, entre a câmara e a empresa concessionária do parque subterrâneo do Jardim da Liberdade. Foi um mau negócio para Santarém? Temos problemas que estão em tribunal e que correram mal na parte final do processo. O município não irá abdicar de nada em relação a isso e irá fazer as participações que tiver que fazer. As rendas continuam a não ser pagas pela empresa concessionária e, no limite, iremos tentar resgatar a concessão à empresa e ficarmos nós a gerir o estacionamento tarifado. Esta é a parte de que se pode falar. O resto está a ser tramitado pelos nossos advogados. O município de Santarém tem razão na maioria das questões e não irá abdicar dos seus direitos.Está satisfeito com a actuação do seu executivo neste ano e meio de mandato? Estou satisfeito mas lamento, devido às dificuldades financeiras, não ter feito mais. E foi vedado aos municípios fazer muita coisa. Os municípios portugueses conseguiram fazer um ajustamento que o Estado não fez. Santarém ainda recebe do Orçamento de Estado menos 110 mil euros por mês do que recebia em 2011. E isso faz muita diferença. Tem colado a si o rótulo de “bom rapaz” e há quem ache que lhe falta um pouco mais de pulso, de assertividade. Como lida com esse tipo de observações? Dou murros na mesa sempre que for necessário. Mas acho que na política temos de ser humanistas, honestos e humildes. Sou uma pessoa que não faz qualquer esforço em ser como é. A humildade é importante, mas também sou uma pessoa assertiva. Já lá vai o tempo em que era aos gritos ou a fazer espalhafato que as coisas se resolviam. Se eu tivesse um registo desse tipo as pessoas diriam de mim precisamente o contrário.O senhor é a antítese do seu antecessor, Moita Flores, no debate político. Talvez, mas isso também não nos levou a lado nenhum. A política é uma coisa nobre e devemos saber ouvir e saber falar. Eu fui eleito para cuidar de Santarém, não fui eleito para cuidar da minha carreira política. As pessoas que me acusam disso estão mais preocupadas com a sua carreira política do que propriamente com Santarém.A vereadora socialista Idália Serrão foi até ao momento a única pessoa que o conseguiu tirar do seu registo calmo. Há nela qualquer coisa que o irrita em termos políticos? Isso aconteceu duas vezes e a última foi na apresentação do último orçamento, quando a senhora vereadora confundiu uma série de conceitos e disse uma série de disparates económicos, financeiros e orçamentais. Eu não percebo de música, pelo que não me atreveria a fazer grandes considerações sobre essa área. Sou licenciado em Economia, lido com essas questões há muitos anos e ouvir considerações, falando de cátedra, que não têm um racional lógico é claro que me exalta. E ainda para mais persistiu no erro. Acho que não devemos falar só por falar.
“Fui eleito para cuidar de Santarém e não da minha carreira política”

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