Empresários ainda têm o estigma de contratar pessoas com deficiência
Manuela Ralha é presidente da direcção da Mithós de Vila Franca de Xira
Foi professora de música mas desde que um acidente a atirou para uma cadeira de rodas que se dedica à vida associativa. Diz que o emprego para as pessoas com deficiência está de rastos e lamenta que os patrões ainda ignorem o potencial laboral destas pessoas.
A crise veio agravar ainda mais as perspectivas de emprego para as pessoas com deficiência da região, sobretudo porque os empresários ainda sentem um grande estigma em contratar quem se encontra nessa situação. A opinião é de Maria Manuela Ralha, 47 anos, dirigente da Mithós, associação de apoio à multideficiência de Vila Franca de Xira. “As pessoas com deficiência são hoje as últimas a arranjar emprego. Os nossos empresários ainda têm o estigma de contratar pessoas com deficiência. Vivem só para as mais-valias e não as empregam com medo destas causarem prejuízo. Há muita desinformação”, lamenta.Muitos empregadores desconhecem que ao contratar pessoas com deficiência têm direito a benefícios fiscais e apoios para adaptação dos postos de trabalho. “A produtividade de uma pessoa com deficiência é tão boa ou melhor que as restantes porque se empenham muito mais. Para estas pessoas é tão raro conseguir um emprego que quando o conseguem o fazem com muito prazer”, explica. Os estudos sociológicos mais recentes mostram que as pessoas com deficiência têm um risco acrescido de pobreza 25 por cento superior face às restantes. “O maior empregador do concelho continua a ser a câmara municipal”, constata.Manuela Ralha é de Alhandra e enquanto desenvolveu uma actividade profissional foi professora. Esteve durante a maior parte da sua vida ligada à música e ao ensino. Começou aos seis anos a aprender música na Euterpe onde tocou saxofone soprano na banda. A música viria a ser a sua formação futura, tendo tocado na orquestra ligeira da Euterpe, cantou no grupo coral, esteve no grupo de cantares tradicionais, estudou na Academia de Música de Lisboa, no Conservatório Nacional e no Instituto Piaget em Almada. Alargou os seus conhecimentos ao piano, canto, direcção vocal e técnica vocal. Foi professora de música durante toda a sua vida até ter sofrido um acidente de viação em 2004 que a atirou para uma cadeira de rodas. A música partiu da sua vida na mesma altura em que as pernas deixaram de lhe obedecer. “Naquela altura foi como se uma nova pessoa tivesse nascido e nunca mais toquei”, recorda. Chegou a estar duas décadas envolvida na vida política e integrou dois executivos da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira, um liderado por Carlos Félix, outro por Ricardo Viegas. Continua a assumir-se como uma mulher de esquerda. Recorda algumas memórias felizes da política, sobretudo o companheirismo, mas diz que a política não lhe deixa saudades. “Não gostei dos jogos de intrigas e bastidores, na política não há almoços grátis. Não gosto de ficar a dever algo a alguém. Na política falta muita solidariedade e entreajuda”, critica. Hoje em dia, além de ser presidente da Mithós, é também coordenadora dos movimentos nacionais dos “(d)Eficientes Indignados”, que promoveram recentemente uma vigília de 48 horas em frente ao Parlamento e também responsável pelo “Sim, nós fodemos”, um movimento destinado a desmistificar a sexualidade das pessoas com deficiência e que luta pelo direito à intimidade e sexualidade. O seu trabalho na associação é voluntário mas defende que o trabalho desenvolvido pelos dirigentes associativos deve ser remunerado caso se trate de uma ocupação permanente e exigente. “Há associações que envolvem muito trabalho. Um dirigente que tenha de estar a tempo inteiro numa associação deveria auferir um vencimento. Até porque as despesas de um presidente à frente de uma associação são imensas”, refere.Manuela Ralha diz que o mais importante é viver o dia-a-dia e também ela está desempregada, esperando por uma oportunidade. “Infelizmente ainda não se vê a pessoa pela capacidade, vê-se pelo género, raça ou religião. O novo paradigma social é a diversidade, não é a normalidade. Mas neste mundo diverso se puser um homem e uma mulher a disputar o mesmo emprego, o mais provável é que fique o homem. Mas também não conseguimos ter acesso ao emprego se não conseguirmos sair de casa e há ainda um grande trabalho a fazer no que toca às acessibilidades”, conclui.
Mais Notícias
A carregar...