“Mário Pereira é apenas um moço de recados do PCP”
Pedro Gaspar é o vereador socialista na Câmara Municipal de Alpiarça. Nesta entrevista desabafa o que sente em relação à gestão comunista, reconhece a estrondosa derrota nas últimas eleições e conta o que sente depois da maioria que governa a câmara ter desvalorizado um dos seus funcionários que por acaso foi o segundo da lista do PS.
Pedro Gaspar foi o candidato do PS à presidência da Câmara de Alpiarça, em 2013. Admite que teve uma derrota estrondosa mas garante estar “sempre” disponível para a sua terra. Critica a gestão comunista, liderada por Mário Pereira, a quem acusa de não ter cumprido a sua primeira promessa: unir a população. Diz que as pessoas estão de costas voltadas e que os alpiarcenses voltaram a ter receio de dizer aquilo que pensam. Considera que quem manda no município é o PCP e que Mário Pereira é apenas um “moço de recados” do seu partido. O vereador mais tranquilo do executivo municipal fala, em entrevista a O MIRANTE, dos assuntos do concelho que estão na ordem do dia.O que falhou para não ter conseguido conquistar a Câmara de Alpiarça? Fizemos uma excelente campanha autárquica, onde demos a conhecer o programa eleitoral porta a porta, numa vertente mais pró-activa e menos de ataque político a quem estava no poder. Essa foi uma das principais falhas. Hoje consigo perceber com clareza que o nosso eleitorado queria que tivéssemos feito um combate mais cerrado à CDU. A candidatura do TPA veio dividir o eleitorado e foi buscar muitos votos ao PS. Além disso, Alpiarça é um concelho sociologicamente comunista.Como é que se inverte essa situação? O caminho é só um: a oposição remar no mesmo sentido. Enquanto houver duas forças políticas à direita do PCP é muito difícil combatê-lo porque o partido tem uma grande fidelização do seu eleitorado.A candidatura do movimento Todos Por Alpiarça prejudicou o PS? O caminho para derrotar o PCP em Alpiarça é ter uma alternativa forte e com o aparecimento do TPA essa alternativa foi dividida. A prova dessa divisão é que houve elementos com cargos no PS que transitaram para a lista do TPA. Isso levou à divisão do eleitorado, que resultou na vitória da CDU.O PS está disposto a coligar-se com o TPA? O PS não fecha portas a ninguém, nem sequer ao PCP. O PS é um partido democrático e se for para governar esta terra, trabalhará com todas as pessoas. Gostaria que o próximo presidente de câmara - que espero que não seja da CDU - venha a cumprir aquilo que o actual presidente do município, Mário Pereira, disse na primeira entrevista a O MIRANTE, em 2009, quando ganhou o primeiro mandato, que é para mim a sua grande promessa e que não vai cumprir, que é unir os alpiarcenses.Porquê? Mário Pereira tem feito exactamente o contrário do que prometeu, tem desunido a população. A terra está dividida, as pessoas estão de costas voltadas.A culpa dessa desunião é do presidente da câmara ou do PCP? É do PCP. O Mário Pereira existe como figura de proa do partido em Alpiarça. É perfeitamente audível nas reuniões de câmara que não é o presidente que decide, mas sim o Partido Comunista.Quem é que manda na Câmara de Alpiarça? É o PCP. É o próprio Mário Pereira quem diz que quem decide é o colectivo. Quando um presidente de câmara diz isto, é óbvio que ele é apenas um moço de recados que faz o que o seu partido decide. Tem havido um clima divisionário que as pessoas sentem no dia-a-dia e sentem também os funcionários da câmara municipal.Como é que os funcionários sentem essa divisão? Foi feita há pouco tempo a avaliação dos funcionários que deu resultados muito tristes. Dou um exemplo. Escolhi como número dois para a minha lista Manuel Colhe que, apesar de ser funcionário do município de Alpiarça, antes destas eleições estava em comissão de serviço na Câmara do Cartaxo como assessor de um dos vereadores da maioria. Depois das últimas eleições regressou às suas funções em Alpiarça. Tendo sido um político activo na minha campanha é colocado no serviço de recolha do lixo. Esta decisão da maioria comunista pareceu-me uma provocação porque as suas capacidades estão muito acima desse cargo e pareceu-me um castigo por ter sido apoiante da candidatura do PS. Além disso, na avaliação o Manuel Colhe teve uma nota de 3.3, que é a pior classificação que ele tem em 30 anos de serviço público.Considera que essa avaliação se deve ao facto de Manuel Colhe ter pertencido à sua lista? Sem dúvida. Em Alpiarça quem está ligado ao aparelho do PCP sobe na estrutura da câmara em termos de responsabilidade e quem não é do PCP é castigado. Este clima de perseguição causa a divisão das pessoas e elas voltam a ter receio de dizer aquilo que pensam.Muitos criticam o facto de ser um vereador que não vive em Alpiarça. Considera que isso prejudica o seu trabalho de autarca? Faço o meu trabalho e estou em perfeita sintonia com os meus camaradas que estão em Alpiarça. A única coisa que prejudica é a minha própria vida. Tenho uma carreira profissional, felizmente com sucesso, e o serviço público foi uma decisão muito ponderada. Se trabalhasse cá tinha o mesmo ritmo de trabalho intenso como tenho actualmente. Que balanço faz deste ano e meio de mandato? Tem sido um mandato onde o executivo tem estado mais preocupado em defender o PCP do que propriamente desenvolver Alpiarça. O PCP neste último ano e meio continuou o tipo de gestão que tinha já no último mandato que é esta auto gestão e a não preocupação com assuntos fundamentais da terra.Que assuntos fundamentais são esses? O problema da albufeira dos Patudos que não tem resposta, por exemplo. É muito fácil dizer que estamos à espera dos fundos comunitários para resolver o problema e é muito fácil dizer que estão a trabalhar. O executivo preocupa-se mais com o projecto do campo de jogos do Casalinho que vai avançar, se houver financiamento comunitário. É um projecto que não serve a população e, se vier a ser implementado, tem verbas de manutenção altíssimas. Esta percepção das necessidades da terra, em que um campo de jogos é mais importante do que resolver o problema da albufeira dos Patudos é dramática.Um engenheiro com ambições políticasPedro Gaspar nasceu a 23 de Julho de 1974 em Alpiarça onde viveu até ingressar no ensino superior. É licenciado em Engenharia Electromecânica pelo Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, tendo feito uma pós-graduação em Economia. Entrou na política autárquica em 1997 quando foi mandatário da Juventude da campanha de Joaquim Rosa do Céu, que venceu a Câmara de Alpiarça nesse ano. No entanto, já pertencia à Juventude Socialista e foi dirigente académico, curiosamente, numa associação académica marcadamente comunista. “Gostei muito de trabalhar com eles mas aquela não era a minha ideologia”, recorda.O facto de ser militante do PS valeu-lhe algumas discórdias políticas com o seu avô paterno, um homem do PCP, que esteve preso por três vezes durante a ditadura. “O meu avô sempre esteve envolvido na política, o meu pai nunca quis ter nada a ver com a política, talvez por ter visto o que o meu avô passou. E a política regressa à minha família pela minha mão”, conta. Antes de morrer o avô confessou-lhe que votou apenas duas vezes no PS. A primeira quando o PCP deu a indicação para se votar em Mário Soares e a outra quando o neto se candidatou nas listas do PS pela segunda vez. “Mas só conseguiu votar em mim na segunda vez que me candidatei, na primeira não o conseguiu fazer. O meu avô, antes de morrer, perdoou-me o facto de ser militante do PS”, confessa com um sorriso. Há 14 anos que é quadro superior na Tecnel, empresa fundada pelo seu pai, Alberto Gaspar, há 35 anos. Actualmente, vive em Paço de Arcos, onde trabalha na filial da empresa. Tem duas ambições políticas: uma é ser presidente da câmara da sua terra e “um dia mais tarde” gostaria de ser deputado da nação, durante uma legislatura. No Parlamento temos excesso de advogados e economistas e poucos autarcas, considera.“Tive uma estrondosa derrota nas eleições”Como é que se sente, literalmente, no meio das discussões entre o presidente Mário Pereira e o vereador Francisco Cunha? Antes de cada reunião faço um exercício mental para tentar perceber o que os meus eleitores gostariam que fosse o meu comportamento e o meu discurso. Penso que os meus eleitores se revêem na postura que tenho. A postura calma é o caminho próprio que estou a trilhar e que acho que representa o meu eleitorado.Aquelas guerras eram evitáveis? Com maior diálogo e maior abertura por parte do PCP muita coisa era evitável.Aquelas guerras permanentes tiram-lhe a vontade de ter protagonismo? Não estou na política por protagonismo e acho que cada homem tem o seu estilo. Como não tenho essa sede de protagonismo acho que devo representar o melhor possível aquilo que presumo ser a vontade dos meus eleitores. Quando acho necessário entrar nas guerras entro.Arrepende-se de se ter candidatado à presidência da Câmara de Alpiarça? Numericamente tive uma estrondosa derrota nas eleições mas tenho tido, eu e o meu grupo de trabalho, excepcionais vitórias. E essas vitórias são motivo de alento a cada contacto com a população e a cada reunião de câmara. Acho que foi uma excelente decisão que tomei.Pondera recandidatar-se em 2017? Para a minha terra estou sempre disponível. O ter-me candidatado em 2013 foi exemplo disso. Agora só o tempo é que dirá se me recandidato ou não, até porque é uma decisão que não depende só de mim.A sua candidatura em 2013 provocou divisões na concelhia do PS. Acha que isso vai prejudicar as próximas eleições autárquicas? A escolha dos candidatos do PS através de eleições internas é um sinal de vanguarda. Como todas as coisas novas nem sempre está tudo burilado ao ponto de ser perfeito. Havia dois candidatos onde um deles [Pedro Gaspar] venceu por dois votos. Claro que houve pessoas mais felizes que outras mas esse processo de aprendizagem é muito importante.Como é que o PS vai recuperar o poder em Alpiarça? É fundamental continuar a fazer uma boa oposição em Alpiarça, dando à população uma boa alternativa a esta CDU que está no poder. Temos que nos constituir como uma alternativa credível para as pessoas, em 2017, votarem noutra força política.Se fosse presidente de câmara quais seriam as suas prioridades? O presidente de câmara tem que ser um homem de terreno e estar em contacto com a população todos os dias. Tem que ser um pólo de comunicação entre a população e os agentes económicos, percebendo as dificuldades e anseios da sua própria terra e de quem lá vive. Não pode ter pudor em falar com investidores e agentes privados para captar investimentos para o concelho. Tem que haver apoio efectivo à agricultura, com gabinetes a servir de apoio ao presidente e este a servir como o grande intermediador diplomático destas matérias. Tudo o resto vem a seguir.“Câmara está em autogestão e à deriva”Pedro Gaspar critica a actuação do actual executivo comunista que lidera a Câmara de Alpiarça e considera que a autarquia está em autogestão e a fazer “apenas” os serviços mínimos. “Ter hoje na câmara municipal um presidente ou um gestor de insolvência é quase a mesma coisa. Há quase seis anos que Mário Pereira diz que não consegue fazer nada por causa da dívida que herdou do PS. Até o próprio Sá Carneiro dizia que temos seis meses para culpar o anterior Governo e a seguir temos que trabalhar. Com falta de trabalho e criatividade nunca vão conseguir sair do barco à deriva em que se encontram”, afirma, acrescentando que o executivo comunista “está ao serviço da dívida” porque é “muito” confortável e não tem de trabalhar muito.O vereador socialista considera inadmissível que o actual executivo disponibilize o relatório das contas do município, um documento com cerca de 500 páginas, com apenas 48 horas de antecedência. “Por uma questão de lisura e bom senso deveriam enviar os documentos mais cedo para podermos lê-los com tempo. Até por uma questão de transparência poderiam ir enviando uma vez que ele vai sendo feito ao longo dos meses. Enviar em cima da hora, de propósito, para não dar espaço de discussão política e técnica é querer esconder”, acusa.Na sua opinião as actas das reuniões de câmara com atrasos de mais de seis meses são o exemplo da “inoperância” do executivo. “Perante os problemas encolhe os ombros com a desculpa na falta de pessoal. Até num assunto em que é obrigatório por lei aprovar na reunião seguinte. Neste momento já nem temos os serviços mínimos de limpeza urbana a funcionar a 100 por cento, o que demonstra bem como a câmara municipal está a definhar”, reforça.Em relação ao processo dos legados deixados em testamento por beneméritos ao município de Alpiarça, Pedro Gaspar opta por não tecer grandes considerações uma vez que não dispõe da mesma informação que o vereador Francisco Cunha, que tem sido um dos principais críticos deste processo. Gaspar critica o facto de o executivo não disponibilizar os documentos para que possa estar por dentro do que está “realmente” a passar-se.
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