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“A dança é o desporto ideal porque está cheio de mulheres bonitas”

“A dança é o desporto ideal porque está cheio de mulheres bonitas”

Armando Baptista é comandante dos Bombeiros de Azambuja e professor e seleccionador de dança

O que é que os bombeiros e a dança de competição têm em comum? À primeira vista nada, mas Armando Baptista é o elo que os une. É comandante dos Bombeiros Voluntários de Azambuja e, em simultâneo, seleccionador nacional de dança desportiva. O MIRANTE foi conhecê-lo e perceber como se convivem duas facetas aparentemente tão distintas de um homem que até nos bombeiros se inspira para criar coreografias. A dança, diz, é um desporto completo e o estigma de que era coisa de mulheres passou à história.

Como nasceu esta paixão pela dança? Foi há muitos anos. Sou de Lisboa, nasci em Campo de Ourique e o meu ATL era os Alunos de Apolo. Era um miúdo do futebol e até achava que a dança não era para os machos. Mas todos os meus amigos, nomeadamente o Alberto Rodrigues, que agora faz de júri em vários programas da TVI, dançavam e então, como qualquer outro com oito anos, achei que devia dançar. Troquei o Belenenses, onde jogava futebol emprestado pelo Sporting, pela dança, até porque não era o mais jeitoso no futebol. E continuei.Apostou na formação nessa área? Sim, tive a oportunidade de frequentar o United Kingdom Alliance, uma escola inglesa, e foi o pai do Alberto que me colocou lá, apostando em mim, porque eu sendo órfão não tinha possibilidades económicas de o fazer. Fico-lhe eternamente grato. Consegui a licenciatura, mas na área de desporto, que cá só é assim chamada há pouco tempo. É uma licenciatura em 10 danças, latinas e clássicas.Teve de ultrapassar o estigma de que a dança era coisa para homossexuais? Sim. Há uns anos não era nada fácil, a mentalidade era outra. Acabou por não me ser difícil. Quando comecei, a dança era considerada uma arte em termos académicos, mas desde 1992 começou a ser visualizada como um desporto, até porque a federação internacional quer homologar a modalidade para ir aos Jogos Olímpicos. Já temos jogos mundiais como o râguebi. É claro que comecei a perceber que a dança é o desporto ideal para um heterossexual como eu, porque está cheio de mulheres bonitas (risos). Mas confesso que, familiarmente, ao início não foi fácil, até porque estava no primeiro ano de engenharia no Técnico e fui para França tirar o bacharelato nesta área, que depois deu na licenciatura em Inglaterra.É comandante dos Bombeiros de Azambuja, professor e seleccionador de dança e tem uma família. Como consegue conciliar tudo? Com muito esforço e sacrifício, mas muito prazer. Os bombeiros consomem-me quase 12 horas por dia e a dança o resto. Dou aulas todos os dias em pós-laboral, com 40 pares de competição, que exigem muito de mim. É claro que é a família que sofre mais, porque os fins-de-semana ou são nos bombeiros ou são em deslocações de dança, quer nacionais, quer internacionais. Suavizo isto, porque a minha mulher também é professora aqui no Ateneu e o meu filho dança aqui e é campeão nacional juvenil, o que acaba por ajudar.“Atingi um patamar de excelência na dança”Espera que o seu filho lhe siga as pisadas? Não queria. Ele também joga futebol no Vilafranquense, está nos benjamins, mas sem querer parecer pretensioso, atingi um patamar de excelência na dança, em que fui campeão ibérico em 1995, vice-campeão nacional muitos anos, sou juiz internacional e tenho um nome que pesa. Por isso não queria que o meu filho fosse visto como “o filho do Armando”, apesar de eu reconhecer que ele tem valor para se destacar sem ser por isso.É difícil chamar jovens para a dança, sobretudo aqui no Ribatejo? Agora já é mais fácil. Há cerca de três anos que assim é. Esta escola tem 20 anos, passámos por muitas dificuldades, tivemos anos em que tínhamos três a quatro pares. Felizmente crescemos sustentadamente. Acho que as ofertas de exteriorização dos jovens são diminutas e, apesar de ser suspeito, acho que esta actividade é completa, porque o irmão pode praticá-la com a irmã e ter o pai e a mãe a acompanhar. No futebol não dá para o filho ser o guarda-redes e a irmã a ponta de lança. Aliás, os pais têm uma presença fundamental, porque além dos treinos, acompanham os filhos para os campeonatos. É preciso ter uma sensibilidade especial para dançar e orientar dança? Sim, é. Eu não preciso da dança para viver, mas já não vivo sem a dança. Mas, além da competição, consigo que estes miúdos estejam longe da droga e do álcool. Eles nem fumam. Um cigarro neles pode fazer a diferença entre ser campeão e estar sempre no 6º lugar, porque a dança é como jogar futebol, sempre em alta rotação. Para dançar é preciso ter jeito natural, embora haja excepções, mas com muito trabalho. A triagem acaba por ser fácil.Tem algum triunfo ou competição que lhe tenha dado mais prazer? Em toda a minha vida fui competitivo e sempre gostei de me desafiar, daí estar a meter-me num mestrado de ciências policiais. Quando parei de competir, e competi durante 20 anos, tive uma espécie de depressão. Mas encontrei nos meus dançarinos uma inspiração enorme, porque vivo aquilo como se fosse eu a dançar. Pareço o Jorge Jesus a gesticular, mas sem a pastilha (risos). É isso que me dá até hoje mais prazer e preenche um abismo que sentia. Sou um treinador viciadíssimo.Consegue ordenar num pódio os seus dois amores, bombeiros e dança? Sinceramente não. Até o mestrado é uma paixão e eu sou um homem de paixões e de causas. Tenho um projecto nos bombeiros, que é uma comissão de serviço de cinco anos e que acaba aí, e se tivesse de sair agora, abruptamente, iria colocá-lo em risco e ele está na fase de ser ou não ser um sucesso. É uma paixão e por isso não o largo mesmo. Não consigo distinguir aquele de que gosto mais.O panorama cultural tanto em Azambuja como em Vila Franca de Xira é agradável ou precisa de melhorar? Acho que é necessário mais investimento em Azambuja. É preciso puxar mais teatros e iniciativas locais, recorrendo à rede associativa sem ser necessário grande investimento, até porque temos grupos amadores interessantes. Já Vila Franca de Xira está muito activa na área cultural. O Ateneu tem tido um papel fundamental. Em seis meses teve mais espectáculos do que em seis anos, seja de teatro, dança, música ou banda, mas sempre com o apoio fundamental da câmara municipal.Divide o seu tempo entre Azambuja e Vila Franca de Xira, mas mora na última. Gosta de viver nessa cidade? Sim, gosto. É uma cidade que tem evoluído muito. Tem vida própria, já não é um dormitório de Lisboa. Teve e está a ter uma grande mudança pela positiva com a entrada de Alberto Mesquita e é um local muito agradável para viver, com um passeio ribeirinho muito agradável e aproveitado.Um mestre exigente e disciplinadorApesar de não estar instituída a figura, actualmente é o seleccionador nacional de dança. Há muito por onde recrutar? Sim, em Dezembro passei os fins-de-semana todos fora, estive no Campeonato do Mundo na Áustria, na Alemanha e na Letónia, e fui também a Itália como juiz. No fundo, a figura de seleccionador não existe, mas como os meus pares são os campeões nacionais, o “coach”, que é a figura que existe, acompanha os pares portugueses, o que faz de mim seleccionador por osmose. Para este ano já temos deslocações à China, França, Alemanha e Áustria. É curioso porque me permite conjugar algumas coisas. Tenho feito estágios na Azambuja, porque os bombeiros têm agora um salão de festas simpático e faz com que a selecção se junte ali. É engraçado, sem ter graça, porque no primeiro andar sou o comandante e no segundo o seleccionador. Já aconteceu estar a treinar com eles e haver uma ocorrência e eu ter de os deixar a treinar lá (risos). Treino pares dos 12 aos 35 anos. Qual é a missão do “coach” em concreto? O coaching faz um acompanhamento integral dos pares. Sou basicamente um tutor, professor e orientador. Opino sobre tudo, desde os sapatos à roupa, passando por aspectos sociais, como dificuldades económicas, situação escolar e até namoradas (risos). Isto consome muito tempo, mas cria um laço muito forte. O meu cognome na dança é o mestre. Há outros, mas como trabalho com professores e sou da primeira geração de dança puseram-me esta alcunha. Sou muito disciplinado e num estágio, se eles se portarem mal, mando-os fazer flexões se for preciso. Sou muito exigente.Quantos pares tem sob a sua orientação? São cerca de 40, fundamentalmente de grande Lisboa e grande Porto, Famalicão, Braga. Sou responsável por todas as coreografias, cerca de 200 coreografias, o que soma cerca de 10 mil passos. Inspiro-me no quotidiano, na novela, no telejornal, porque sou viciado em notícias. Tento esbater o negro e enaltecer o cor-de-rosa, mas de vez em quando carrego o negro. Até nos bombeiros me inspiro.Praticante de tiro e adepto ferrenho do BenficaArmando Proença Baptista tem 44 anos e é natural de Lisboa, Campo de Ourique. Casado, com um filho, mora em Vila Franca de Xira há mais de uma década. Licenciou-se em dança desportiva, fez três pós-graduações em gestão e protecção de socorro, em psicologia rodoviária e em ciências policiais e é nesta última área que está a tirar um mestrado. Esteve nove anos no comando do destacamento da Cruz Vermelha de Amadora e Sintra, onde comandava 130 pessoas e foi responsável por coordenar 85 mil serviços. Foi coordenador das forças nacionais de segurança durante o campeonato do mundo de vela em 2007 e no America’s Cup de 2010. Apesar do pouco tempo de que dispõe, faz tiro, mas deixou de fazer para-quedismo o ano passado. Queixa-se de nem ter tempo para viver a paixão pelo seu Benfica, de que diz ser “muito ferrenho”.
“A dança é o desporto ideal porque está cheio de mulheres bonitas”

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